O erro de uma juíza vai obrigar à repetição do julgamento da ‘Operação Aquiles’, anulando a sentença do ex-chefe da PJ acusado de cooperar com redes de tráfico de droga.
No ano passado, o ex-inspetor da PJ Carlos Dias Santos foi condenado a seis anos de prisão por adesão a associação criminosa, no âmbito da chamada “Operação Aquiles”.
Segundo o Tribunal Central Criminal de Lisboa, Carlos Dias Santos, ex-coordenador da Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Droga (UNCTE/PJ), “agiu com dolo direto, tem culpa de grau muito elevado, fez toda a sua carreira na PJ e esteve maioritariamente na investigação e no combate ao tráfico de droga, chefiou e coordenou e apesar de estar aposentado mantém direitos e deveres”, não mostrando “resquícios de arrependimento”.
Os juízes entenderam que Dias Santos violou o dever de fidelidade enquanto inspetor da PJ ao colaborar e fornecer informações a arguidos envolvidos no tráfico de cocaína desde a Colômbia, mas absolveram o antigo polícia de corrupção com vista ao tráfico e corrupção passiva para prática de ato ilícito, no final de um julgamento que começou em outubro de 2018.
Agora, o Tribunal da Relação de Lisboa anulou a decisão do julgamento. Segundo o Correio da Manhã, em causa está o facto de o tribunal de primeira instância não ter feito a comunicação da alteração da qualificação jurídica a todos os arguidos.
A juíza Marisa Arnêdo apenas comunicou a informação aos que entendeu serem afetados por ela.
Após a leitura do acórdão, a defesa de Dias Santos recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa e agora foi-lhe dada razão, anulando a sentença e forçando o processo a voltar ao Campus de Justiça.
“O tribunal foi muito claro ao dizer que há dois meses tinha um entendimento diferente e que se o mantivesse o senhor coordenador tinha sido absolvido. Agora tem um entendimento diferente, quiçá diferente de toda a jurisprudência e doutrina. Estão a ver as dúvidas quanto às circunstâncias de poder ser condenado”, disse o advogado, Carlos Melo Alves, na altura, ressalvando que o entendimento do tribunal “é muito discutível” e que não é defendido pelos professores de direito.
A magistrada Marisa Arnêdo condenou arguidos por crimes diferentes dos que vinham pronunciados, não fundamentou devidamente a decisão nem deu possibilidade de contraditório aos réus.
O coletivo de três desembargadoras que reverteu a sentença justifica que isto “impossibilitou a defesa dos arguidos com a opacidade verificada na comunicação, já para não falar nas imprecisões legais”.
Aliás, citadas pelo Correio da Manhã, as desembargadoras dizem até que ficaram “sem saber quais são precisamente os alegados e indiciários factos constantes da pronúncia a que o despacho se referia, incluindo os que parcialmente possam resultar provados”.
Ainda no mesmo processo, o denunciante António Benvinda, que denunciou os dois elementos da PJ e que chegou a trabalhar como informador, encontrando-se num programa de proteção de testemunhas, mereceu da parte do tribunal uma atenuação especial da pena, tendo sido condenado, em cúmulo jurídico, a cinco anos e seis meses de prisão por tráfico de droga de forma tentada agravada e adesão à associação criminosa.
Entenderam os juízes que, apesar de ter praticado crimes, António Benvinda cooperou com a PJ desde 2013 e que foi decisivo para a recolha de prova para investigações de tráfico de droga.
No total, o tribunal condenou 16 arguidos por diversos crimes entre os quais tráfico de droga, dos quais seis com pena suspensa. Os restantes 11 arguidos foram absolvidos. Entre os 16 arguidos condenados por tráfico de droga está Francisco Lobo, filho de Frankelim Lobo, que foi julgado num processo à parte e condenado a 11 anos de cadeia.
As penas decididas pelo tribunal variaram entre os dois anos e seis meses, por detenção de arma proibida, e os 14 anos de cadeia, esta última aplicada a dois arguidos.
A juíza presidente Marisa Arnêdo demorou cinco horas a ler a decisão, optando por comentar praticamente todos os 710 pontos da acusação e posteriormente anunciar as penas, tendo sido muito crítica em relação à atuação da PJ sobre a utilização de informadores, dizendo que, à data dos factos, havia uma “situação casuística e discricionária sobre os informadores/colaboradores, sem normas nem regras”.
Daniel Costa, ZAP // Lusa