O que nos pode dizer o paradeiro dos parasitas da malária no fígado? Cientistas do Instituto de Medicina Molecular reconstituíram no espaço e no tempo a infeção por parasitas Plasmodium na fase assintomática da malária.
A malária é uma doença devastadora causada pelo parasita Plasmodium. Após a picada de um mosquito infetado, os parasitas viajam para o fígado e infetam as células hepáticas.
Esta fase da infeção não tem qualquer sintoma.
Agora, um novo estudo descobriu pela primeira vez que o resultado da infeção pelo parasita da malária está ligado à localização espacial das células infetadas no fígado.
O estudo, conduzido por Maria Manuel Mota, investigadora principal e diretora executiva do Instituto de Medicina Molecular, e Shalev Itzkovitz, investigador principal no Weizmann Institute of Science (Israel), foi publicado esta quarta-feira na revista Nature. Da equipa fizeram também parte Sofia Marques e Ângelo Ferreira Chora, investigadores do iMM.
Este atlas da fase hepática da infeção da malária é crucial para encontrar formas terapêuticas de resolver a infeção nesta fase assintomática impedindo o desenvolvimento da doença.
Os cientistas, em Portugal e Israel, rastrearam a infeção por Plasmodium no fígado, observando a localização dos parasitas ao longo do tempo e foram capazes de criar um atlas da infeção do fígado através da aplicação de uma abordagem inovadora.
“O fígado é formado por milhares de lóbulos. Os lóbulos são grupos de células que se organizam em forma de hexágonos”, explica Shalev Itzkovitz, co-autor do estudo, sobre as principais conclusões deste trabalho.
“Descobrimos que o resultado da infeção é diferente dependendo da zona dos lóbulos infetados pelos parasitas da malária. Os parasitas desenvolvem-se mais rapidamente e sobrevivem melhor nas regiões mais próximas do centro destes lóbulos em forma de hexágono”, acrescenta Itzkovitz.
A equipa de investigação analisou os genes ativos das células do fígado e dos parasitas em diferentes momentos após a infeção, utilizando ratinhos como modelo.
Uma vez que os genes ativos nas células do fígado dependem da sua localização, os investigadores conseguiram acoplar cada parasita à sua localização no fígado e reconstruir o seu percurso ao longo do tempo da infeção.
“Encontrámos um grupo de parasitas localizados na extremidade dos lóbulos que não são capazes de desenvolver uma infeção“, continua Shalev Itzkovitz.
“Chamamos a estas células do fígado onde os parasitas não são capazes de desenvolver uma infecção ‘células hepáticas abortivas'”, acrescenta Maria Manuel Mota, investigadora principal no iMM e co-autora do estudo.
“É quase como se estas células fossem hostis aos parasitas e os parasitas tivessem de “abortar a missão“. Descobrimos que a resposta imunitária que estas células são capazes de promover em resposta aos parasitas é diferente das restantes”, explica Maria Manuel Mota.
A fase hepática da infeção por malária é difícil de estudar devido à heterogeneidade do fígado. “Há 20 anos que estudo a fase hepática da malária e este estudo é um ponto de viragem. Agora temos informação de como as células do fígado e os parasitas Plasmodium se comportam durante a infeção, no tempo e no espaço”, diz Maria Manuel Mota.
“Esta informação vai abrir o caminho para a nossa investigação futura. Podemos utilizar as vulnerabilidades do Plasmodium que encontramos neste estudo para tentar desenvolver formas de eliminar a infeção na fase hepática, que é assintomática”, acrescenta a investigadora.
Os investigadores criaram um atlas detalhado da infeção pelos parasitas que causam a malária no fígado. Compreender a dinâmica da infeção nesta fase assintomática é importante para investigar como parar a infeção no fígado e tentar eliminar a doença antes do aparecimento dos sintomas.
ZAP // iMM