O Banco Central Europeu (BCE) está a proceder a uma avaliação à idoneidade de António Ramalho, investigando também a relação entre o presidente executivo do Novo Banco e o ex-líder do Benfica, Luís Filipe Vieira. O BCE tomou este caso depois de o Banco de Portugal lhe passar a responsabilidade.
O Banco Central Europeu (BCE) está a acompanhar as revelações feitas na imprensa quanto à relação entre António Ramalho e Luís Filipe Vieira, confirmou o supervisor ao Público, adiantando que está “neste momento a investigar a matéria”.
O caso veio a público após conversas telefónicas de António Ramalho com o ex-administrador do Novo Banco Vítor Ramalho terem sido divulgadas na imprensa. Nas conversas, ouve-se Ramalho dizer estar a agendar uma reunião com o então presidente do Benfica para o “preparar” para a Comissão de Inquérito.
A entrada do BCE neste caso prende-se com a decisão do Banco de Portugal (BdP) remeter a responsabilidade de uma eventual avaliação da idoneidade de Ramalho para o supervisor europeu.
O BdP considerou que o BCE é o órgão com as competências para avaliar se o presidente executivo do Novo Banco tem condições para continuar a liderar a instituição bancária.
“Atendendo a que o Novo Banco é uma instituição significativa, a autoridade de supervisão prudencial competente é o Banco Central Europeu, o qual é assim responsável, designadamente, pela abertura e decisão de eventuais processos de reavaliação de idoneidade”, esclareceu o Banco de Portugal ao jornal.
O BdP disse ainda tomar “a iniciativa de partilhar com o BCE toda a informação relevante sobre instituições significativas logo que a mesma chegue ao seu conhecimento”, apesar de não adiantar se o fez no caso referente ao ex-presidente do Benfica.
Luís Filipe Vieira tem elevadas dívidas ao Novo Banco e vários créditos foram reestruturados e vendidos em condições que, na comissão parlamentar de inquérito, levantaram dúvidas aos deputados.
Como escreve o Público, a investigação do BCE também está a ser motivada pela revelação de dados que apontam que a gestão do Novo Banco vendeu ativos a desconto aos próprios devedores incumpridores, apesar de o negar, e de organizar um esquema para confundir os deputados da Comissão de Inquérito.
Segundo o inspetor tributário Paulo Silva, no processo da operação Cartão Vermelho citado pela revista Sábado, esses encontros preparativos “vêm ainda mais evidenciar a preocupação, de parte a parte, que o devedor e o credor têm com a Comissão Parlamentar, em tentativas de concentração de posições entre pessoas que […] tiveram intervenções que indiciam lesivas monetariamente para o Novo Banco que, em face do mecanismo de capital contingente, foram transferidas para o Fundo de Resolução”.
Segundo o despacho de indiciação da operação Cartão Vermelho, há dois ex-diretores do Novo Banco referidos, Álvaro Neves (suspeito de “relacionamento privilegiado” com os empresários referidos no processo) e Pedro Pereira (referido em escutas como contacto de um consultor de uma entidade ligada à compra de créditos do Novo Banco a Luís Filipe Vieira).
O Novo Banco disse à Sábado que Álvaro Neves foi despedido e Pedro Pereira está suspenso de funções com processo disciplinar em curso.
Na sexta-feira, em entrevista à CNN, Ramalho disse que a sua idoneidade é “revista permanentemente”, que “não houve da parte do Novo Banco nenhuma concertação ou preparação do senhor Luís Filipe Vieira para efeitos da comissão de inquérito” e que sempre defendeu “os interesses do banco e da comissão de inquérito”.
“Pensar que um banco era capaz de manipular uma comissão de inquérito, que era capaz de manipular pessoas que respondiam perante uma comissão de inquérito, parece-me de uma mundo totalmente virtual”, disse na entrevista.
António Ramalho admitiu que se reuniu com Luís Filipe Vieira no dia 3 de maio de 2021, sete dias antes da ida do presidente da Promovalor ao Parlamento, e “depois de se ter assistido, na comissão de inquérito, a um momento particularmente triste, que foi a intervenção de Bernando Moniz da Maia”.
O presidente do Novo Banco caracterizou o encontro com Vieira como sendo “uma reunião particularmente rápida” em que não estava sozinho, mas sim acompanhado por Castro Simões, “diretor [do banco] que é responsável pela gestão da Promovalor”.
Ramalho garantiu que na “conversa rápida apenas se falou de duas coisas”: a disponibilidade do banco para “dar toda a informação que fosse necessária” para responder aos deputados “e simultaneamente para fazer uma sugestão”, a de não fazer perante os deputados “as cenas de não saber, não conhecer e de não perceber o que é que se passa”.
António Ramalho lembrou ainda que Luís Filipe Vieira “é um devedor do banco” e que ele próprio é “responsável” do mesmo.
Questionado sobre se se considera idóneo para continuar à frente do Novo Banco, António Ramalho disse que a idoneidade “é revista permanentemente”.
“Eu espero que a minha também seja revista em permanência. Ainda agora, recentemente, foi-me revista”, acrescentou.
António Ramalho disse ainda que na sexta-feira, antes de falar à CNN, deu nota ao Banco de Portugal da entrevista e escreveu uma carta com a sua versão dos factos ao departamento de conformidade (‘compliance’) do Novo Banco.
ZAP // Lusa