/

Cientistas podem ter detetado pela primeira vez o nascimento de um magnetar devido a uma colisão colossal

Ohlmann / Schneider / Röpke

Simulação da origem de um magnetar

Há muito tempo, no Universo distante, uma enorme explosão de raios-gama libertou mais energia em meio segundo do que o Sol irá produzir durante a sua vida inteira de 10 mil milhões de anos.

Depois de examinar o surto incrivelmente brilhante no visível, em raios-X, no infravermelho próximo e no rádio, uma equipa astrofísica da Universidade Northwestern pensa ter, potencialmente, detetado o nascimento de um magnetar.

Os investigadores pensam que o magnetar foi formado pela fusão de duas estrelas de neutrões, o que nunca tinha sido observado antes.

A fusão resultou numa quilonova brilhante – a mais brilhante já vista – cuja luz finalmente atingiu a Terra no dia 22 de maio de 2020. A radiação veio ao início como um surto de raios-gama, a que se dá o nome de explosão curta de raios-gama.

“Quando duas estrelas de neutrões se fundem, o resultado previsto mais comum é que formem uma estrela de neutrões que colapsa num buraco negro em milissegundos ou menos,” disse Wen-fai Fong, da Universidade Northwestern, que liderou o estudo.

“O nosso trabalho mostra que é possível que, para esta explosão curta de raios-gama em particular, o objeto massivo tenha sobrevivido. Em vez de colapsar para um buraco negro, tornou-se num magnetar: uma estrela de neutrões que gira rapidamente que tem grandes campos magnéticos, despejando energia para o seu ambiente circundante e criando o brilho muito forte que vemos.”

A investigação foi aceite para publicação na revista The Astrophysical Journal.

Fong é professora assistente de física e astronomia do Colégio de Artes e Ciências da Universidade Northwestern e membro do CIERA (Center for Interdisciplinary Exploration and Research in Astrophysics). A investigação envolveu dois alunos, três licenciados e três pós-doutorandos do laboratório de Fong.

A ocorrência de um novo fenómeno

Depois da radiação ter sido detetada pela primeira vez pelo Observatório Neil Gehrels Swift da NASA, os cientistas rapidamente recrutaram outros telescópios – incluindo o Telescópio Espacial Hubble da NASA, o VLA, o Observatório W. M. Keck e a rede do Observatório Las Cumbres – para estudar o rescaldo da explosão e a sua galáxia hospedeira.

A equipa de Fong percebeu rapidamente que algo não batia certo.

Em comparação com as observações de raios-X e no rádio, a emissão no infravermelho próximo detetada com o Hubble era demasiado brilhante.

Na verdade, era 10 vezes mais brilhante do que o previsto. “À medida que os dados chegavam, começámos a formar uma imagem do mecanismo que produzia a radiação que observávamos,” disse Tanmoy Laskar da Universidade de Bath, no Reino Unido.

“Assim que obtivemos as observações do Hubble, tivemos que mudar completamente o nosso processo de pensamento, porque a informação que o Hubble acrescentou fizeram-nos perceber que tínhamos que descartar o nosso pensamento convencional e que um novo fenómeno estava a acontecer. De modo que tivemos que descobrir o que isso significava para a física por trás destas explosões extremamente energéticas.”

Monstro magnético

Fong e a sua equipa discutiram várias possibilidades para explicar o brilho invulgar – conhecido como explosão curta de raios-gama – que o Hubble observou.

Os investigadores pensam que as explosões curtas são provocadas pela fusão de duas estrelas de neutrões, objetos extremamente densos com mais ou menos a massa do Sol comprimida no volume de uma grande cidade. Embora a maioria das explosões curtas de raios-gama provavelmente resultem num buraco negro, as duas estrelas de neutrões que se fundiram neste caso podem ter-se combinado para formar um magnetar, uma estrela de neutrões supermassiva com um campo magnético muito poderoso.

“Basicamente temos estas linhas de campo magnético ancoradas na estrela que estão a girar cerca de 1000 vezes por segundo, e isto produz um vento magnetizado,” explicou Laskar. “Estas linhas de campo giratórias extraem a energia rotacional da estrela de neutrões formada na fusão e depositam essa energia no material ejetado pela explosão, fazendo com que o material brilhe ainda mais.”

“Sabemos que os magnetares existem porque vemo-los na nossa Galáxia,” acrescentou Fong. “Achamos que a maioria é formada na morte explosiva de estrelas massivas, deixando para trás estas estrelas de neutrões altamente magnetizadas.

“No entanto, é possível que uma pequena fração se forme em fusões de estrelas de neutrões. Nunca vimos evidências disso antes, muito menos no infravermelho, o que torna esta descoberta especial.”

Quilonova estranhamente brilhante

Pensa-se que as quilonovas, que são normalmente 1000 vezes mais brilhantes do que uma nova clássica, acompanhem explosões curtas de raios-gama. Exclusivas à fusão de dois objetos compactos, as quilonovas brilham do decaimento radioativo dos elementos pesados ejetados durante a fusão, produzindo elementos altamente cobiçados como ouro e urânio.

Só temos até à data uma quilonova confirmada e bem estudada,” disse Jillian Rastinejad, coautora do artigo e estudante graduada do laboratório de Fong. “Portanto, é especialmente estimulante encontrar mais uma potencial quilonova que parece tão diferente. Esta descoberta deu-nos a oportunidade de explorar a diversidade de quilonovas e dos seus objetos remanescentes.”

Caso o brilho inesperado visto pelo Hubble tenha vindo de um magnetar que depositou a energia no material da quilonova, então, dentro de alguns anos, o material ejetado da explosão produzirá radiação que aparece em comprimentos de onda do rádio. As observações posteriores no rádio podem, em última análise, provar que se tratava de um magnetar, levando a uma explicação da origem de tais objetos.

Agora que temos uma candidata muito brilhante a quilonova,” disse Rastinejad, “estou ansiosa pelas novas surpresas que as explosões curtas de raios-gama e que as fusões de estrelas de neutrões nos reservam no futuro.”

// CCVAlg

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.