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NASA celebra legado do Telescópio Espacial Spitzer

NASA/JPL-Caltech

O telescópio espacial Spitzer

A NASA está a celebrar o legado de um dos seus grandes observatórios, o Telescópio Espacial Spitzer, que estuda há mais de 16 anos o Universo no infravermelho. A missão terminou no passado dia 30 de janeiro.

Lançado em 2003, o Spitzer revelou características anteriormente ocultas de objetos cósmicos conhecidos e levou a descobertas e informações que vão desde o nosso próprio Sistema Solar até quase aos confins do Universo.

“O Spitzer ensinou-nos o quão importante a radiação infravermelha é para entender o nosso Universo, tanto na nossa própria vizinhança cósmica quanto nas galáxias mais distantes,” disse Paul Hertz, diretor de astrofísica na sede da NASA.  “Os avanços que fizermos nas muitas áreas da astrofísica, no futuro, serão por causa do extraordinário legado do Spitzer.”

O Spitzer foi construído para estudar “o frio, o velho e o empoeirado,” três coisas que os astrónomos observam particularmente bem no infravermelho. A radiação infravermelha refere-se a uma gama de comprimentos de onda no espectro infravermelho, desde os 700 nanómetros (demasiado pequeno para ser visto a olho nu) até cerca de 1 milímetro (aproximadamente o tamanho da cabeça de um alfinete).

Diferentes comprimentos de onda infravermelhos podem revelar características diferentes do Universo. Por exemplo, o Spitzer pode ver coisas demasiado frias para emitirem muita luz visível, incluindo exoplanetas (planetas para lá do nosso Sistema Solar), anãs castanhas e matéria fria encontrada no espaço entre as estrelas.

Quanto ao “antigo”, o Spitzer estudou algumas das galáxias mais distantes já detetadas. A luz de algumas delas viajou durante milhares de milhões de anos para chegar até nós, permitindo que os cientistas vissem esses objetos como eram há muito, muito tempo.

De facto, trabalhando juntos, o Spitzer e o Telescópio Espacial Hubble (que observa principalmente no visível e em comprimentos de onda infravermelhos mais pequenos do que os detetados pelo Spitzer) identificaram e estudaram a galáxia mais distante observada até hoje. A luz que vemos daquela galáxia foi emitida há 13,4 mil milhões de anos, quando o Universo tinha menos de 5% da sua idade atual.

Entre outras coisas, os dois observatórios descobriram que estas galáxias iniciais são mais pesadas do que os cientistas esperavam. E, ao estudar galáxias mais próximas de nós, o Spitzer aprofundou a nossa compreensão de como a formação galáctica evoluiu ao longo da vida do Universo.

O Spitzer também está atento à poeira interestelar, prevalente na maioria das galáxias. Misturada com gás em nuvens massivas, pode condensar-se para formar estrelas, e os restos podem dar à luz planetas. Com uma técnica chamada espectroscopia, o Spitzer pode analisar a composição química da poeira para aprender mais sobre os ingredientes que formam planetas e estrelas.

Em 2005, após a missão Deep Impact da NASA ter intencionalmente atingido o Cometa Tempel 1, o telescópio analisou a poeira levantada, fornecendo uma lista de materiais que estariam presentes no início do Sistema Solar. Além disso, o Spitzer encontrou um anel anteriormente não detetado em torno de Saturno, composto por partículas esparsas de poeira que os observatórios não conseguem ver no visível.

Além disso, alguns comprimentos de onda infravermelhos podem penetrar a poeira quando a luz visível não consegue, permitindo que o Spitzer revele regiões que, de outra forma, permaneceriam obscurecidas.

“É incrível quando ‘colocamos na mesa’ tudo o que o Spitzer já fez ao longo da sua vida, desde a deteção de asteroides no nosso Sistema Solar, não maiores do que uma limusine, até aprender mais sobre algumas das galáxias mais distantes que conhecemos,” disse Michael Werner, cientista do projeto Spitzer.

Para aprofundar as suas ideias científicas, os cientistas do Spitzer combinaram frequentemente os seus achados com os de muitos outros observatórios, incluindo dois dos outros Grandes Observatórios da NASA, o Hubble e o Observatório de raios-X Chandra.

Outros mundos

Algumas das maiores descobertas científicas do Spitzer, incluindo aquelas relativas a exoplanetas, não faziam parte dos objetivos científicos originais da missão.

A equipa usou uma técnica chamada método de trânsito, que procura uma queda no brilho da estrela que resulta quando um planeta passa à sua frente, para confirmar a presença de dois planetas do tamanho da Terra no sistema TRAPPIST-1. Depois, o Spitzer descobriu outros cinco planetas do tamanho da Terra no mesmo sistema – e forneceu informações cruciais sobre as suas densidades – totalizando o maior lote de exoplanetas terrestres já descoberto em torno uma única estrela.

Um dos primeiros observatórios a distinguir a luz vinda diretamente de um exoplaneta, o Spitzer aproveitou a mesma capacidade para outro “primeiro”: a deteção de moléculas na atmosfera de um exoplaneta (estudos anteriores revelaram elementos químicos individuais em atmosferas exoplanetárias). E também forneceu as primeiras medições de variações de temperatura e de vento numa atmosfera exoplanetária.

“Quando o Spitzer estava a ser projetado, os cientistas ainda não tinham encontrado um único exoplaneta em trânsito e, quando o Spitzer foi lançado, só conhecíamos um punhado deles,” disse Sean Carey, gestor do Centro Científico Spitzer do IPAC no Caltech, Pasadena, no estado norte-americano da Califórnia. “O facto do Spitzer se ter tornado numa ferramenta exoplanetária tão poderosa, quando isso nem era algo para o qual os planeadores originais pudessem ter-se preparado, é realmente profundo. E obtivemos alguns resultados absolutamente impressionantes.”

Mantendo-se frio

Um dos principais pontos fortes do Spitzer é a sua sensibilidade – isto é, a capacidade de detetar fontes muito fracas de luz infravermelha. A Terra é uma das principais fontes de radiação infravermelha, e tentar ver fontes infravermelhas fracas a partir do solo é como tentar observar estrelas quando o Sol está acima do horizonte.

Essa é uma das principais razões pelas quais os construtores do Spitzer o tornaram o primeiro observatório astrofísico numa órbita que segue a órbita da Terra: longe do calor do nosso planeta, os detetores do Spitzer não teriam que lidar com a sua radiação infravermelha.

Diferentes comprimentos de onda infravermelhos podem revelar diferentes características do Universo. Alguns telescópios terrestres podem observar em certos comprimentos de onda infravermelhos e fornecer informações científicas valiosas, mas o Spitzer pode alcançar uma maior sensibilidade do que telescópios terrestres muito maiores e ver fontes muito mais fracas, como galáxias extremamente distantes. Além disso, foi projetado para detetar alguns comprimentos de onda infravermelhos que a atmosfera da Terra bloqueia completamente, observando nesses comprimentos de onda que estão fora do alcance dos observatórios terrestres.

As naves espaciais também podem gerar calor infravermelho, de modo que o Spitzer foi construído para permanecer frio, operando a temperaturas tão baixas quanto -267º Celsius. Em 2009, o Spitzer esgotou a sua reserva de hélio refrigerante, assinalando o fim da sua “missão fria”. Mas a grande distância do Spitzer, à Terra, ajudou-o a não aquecer demasiado – ainda opera a -244º Celsius – e os membros da equipa da missão descobriram que podiam continuar a observar em dois comprimentos de onda infravermelhos.

A “missão quente” do Spitzer já dura há mais de uma década, quase o dobro da sua “missão fria”. Os planeadores da missão original não esperavam que o Spitzer operasse por mais de 16 anos. Esta vida útil prolongada levou a alguns dos resultados científicos mais profundos do Spitzer, mas também colocou desafios à medida que o observatório se afasta cada vez mais da Terra.

“Não estava nos planos ter o Spitzer a operar tão longe da Terra, de modo que a equipa teve que adaptar-se, ano após ano, a manter a nave em operação,” disse Joseph Hunt, gestor do projeto do Spitzer. “Mas eu acho que superar esse desafio deu às pessoas uma grande sensação de orgulho. Esta missão afetou-nos positivamente.”

No passado dia 30 de janeiro, os engenheiros desativaram o Spitzer e cessaram as operações científicas. Durante o processo de revisão da NASA, em 2016, a agência espacial tomou a decisão de encerrar a missão do Spitzer. O encerramento estava inicialmente planeado para 2018, em antecipação do lançamento do Telescópio Espacial James Webb, que também realizará observações astronómicas no infravermelho.

Quando o lançamento do Webb foi adiado, a missão do Spitzer recebeu a sua quinta e última extensão. Estas extensões deram ao Spitzer mais tempo para continuar a produzir ciência transformadora, incluindo tarefas de “desbravamento de caminho” para o Webb.

// CCVAlg

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