Um programa que permite reabilitar vítimas de tráfico humano está a espalhar-se pelas cidades norte-americanas. O modelo tem raízes em Columbus, no Ohio, onde um juiz decidiu direcionar essas mulheres para a reabilitação, ao invés de enviá-las para a prisão.
Há dez anos, o juiz Paul Herbert estava sentado num tribunal quando percebeu uma tendência. Constatou que muitas mulheres que foram abusadas e forçadas a fazer sexo estavam a ser tratadas como criminosas, noticiou a NPR.
“Vi o xerife a trazer o réu seguinte, acorrentado. Era uma mulher e está toda espancada, parecia uma vítima de violência doméstica, exceto o facto de estar algemada e ter um processo. Quando olhei para o seu ficheiro, dizia: “prostituta””, contou Paul Herbert.
Paul Herbert percebeu que a lei não reconhecia essas mulheres como vítimas de tráfico de pessoas. Então, criou um tribunal dedicado à recuperação, não à punição. Designado Changing Actions To Change Habits Court (CATCH Court), busca alterar ações para mudar hábitos. No início, era um dos poucos programas do género no país.
Atualmente, há sete desses tribunais especializados, apenas em Ohio. Existem programas semelhantes no Texas, no Illinois, no Tennessee e em Louisiana, e Paul Herbert ajudou as cidades a colocar os tribunais em funcionamento.
O programa providencia casa e alimentação para essas mulheres, coisas que normalmente precisariam do seu traficante. Recebem ainda tratamento para trauma e dependência, e são elegíveis para extinguir os seus registos. Em troca, estão sujeitas a testes de drogas e devem comparecer no tribunal todas as semanas, durante dois anos.
Embora custe 200 mil dólares (cerca de 182 mil euros) por ano administrar o CATCH Court, Paul Herbert afirmou que isso “é uma pechincha”. “Caso não se faça nada, continuaremos a gastar 5,4 milhões de dólares [cerca de 4,9 milhões de euros] por ano para prender essas mulheres, e não haverá nenhuma melhoria nas circunstâncias”, acrescentou.
O programa, contudo, é intensivo. Menos de uma em cada quatro mulheres matriculadas acaba a formação.
“Tivemos connosco uma pessoa que saiu da casa e que desistiu do programa. Posso dizer que já tivemos aqui cerca de 15, só este ano”, contou Esther Flores. Esta administra uma casa segura para mulheres na área do trabalho sexual. Segundo a própria, o CATCH Court é ótimo para quem se forma, mas não faz o suficiente para as mulheres que não o fazem.
Algumas mulheres abandonam o programa porque conseguem emprego e não precisam de assistência, mas Esther Flores contou que muitas outras acabam nas ruas.
Mas o caso de Vanessa Perkins é diferente. “Tornei-me viciada em drogas e depois o traficante me encontrou”, contou a mulher, uma das primeiras graduadas de sucesso do CATCH Court. Abusada sexualmente quando jovem, começou a beber e usar drogas com apenas 12 anos.
“Ele [traficante] atacou as minhas vulnerabilidades, sabia o que estava a fazer”, indicou. “Do vício em drogas, ao amor, à família e à lealdade. Ele atacou todas as coisas que eu estava a perder”, acrescentou.
Anos depois de concluir o programa, Paul Herbert pediu a Vanessa Perkins que fosse oficial de justiça no seu tribunal – o mesmo tribunal que a ajudou a se recuperar. Agora, é ela que ajuda outras mulheres que estão a passar pelo mesmo que ela passou anos atrás.
“Se eu pude, elas podem. Especialmente se eu estiver lá com elas”, indicou Vanessa Perkins. “Há pessoas que entram que conheço de quando estávamos nas ruas”.
O CATCH Court foi bem-sucedido em manter as mulheres fora do sistema, independentemente de concluírem a formação. A taxa de reincidência das mulheres em prostituição em todo o país é de 80%, mas esse número cai para a metade quando se quantificam as que frequentam o programa de reabilitação durante um período de tempo. Caso se tenha em consideração as que concluíram a formação, o número desce 20%.