Uma equipa de investigadores do Instituto Ricardo Jorge conseguiu identificar os mecanismos genéticos que permitem à bactéria causadora da sífilis (Treponema pallidum) defender-se do sistema imunitário do Homem durante o período de doença.
Os resultados deste trabalho, publicado em outubro na Nature Microbiology, são um passo indispensável para o desenvolvimento de medidas preventivas no combate à sífilis, tal como uma vacina.
A novidade desta descoberta é o facto de Treponema pallidum ser uma das poucas bactérias patogénicas para o Homem que não é possível “crescer” e “manter” em laboratório.
Para ultrapassar esta dificuldade, os investigadores do Instituto Ricardo Jorge utilizaram tecnologia de ponta, nomeadamente uma técnica inovadora de captura de ADN da bactéria causadora da infeção diretamente de doentes com sífilis seguida da sequenciação total do seu genoma.
Assim se descodificou ao nível genético o “braço-de-ferro” estabelecido entre a bactéria e o ser humano durante a sífilis, tendo sido identificados, de forma precisa, quais os mecanismos que a bactéria usa para se adaptar e assim sobreviver ao ataque do sistema imunitário do Homem.
Segundo o coordenador deste estudo, João Paulo Gomes, a descoberta destes mecanismos genéticos é fundamental para o desenvolvimento de novas medidas profiláticas e de novas medidas terapêuticas.
“Em qualquer doença de origem infeciosa, se por um lado, o sistema imunitário do Homem tenta combater a infeção matando o agente patogénico, por outro, este mesmo agente modifica o seu ADN, através de mutações, para fugir ao sistema imunitário”, explicou o investigador do Departamento de Doenças Infeciosas, num comunicado do ISRJ.
“Tendo em conta que as vacinas para evitar doenças infeciosas assentam no conhecimento das regiões do agente patogénico, que são reconhecidas pelo sistema imunitário do Homem, os resultados deste estudo pioneiro a nível mundial constituem um passo obrigatório para a eficaz criação de uma vacina que previna tão importante doença em termos de Saúde Pública”, sublinhou.
A sífilis ainda é um problema de saúde pública em Portugal, que não tem conseguido diminuir o número global de casos, nomeadamente nos recém-nascidos, e regista até um aumento em grupos particulares, como os homossexuais. Os dados oficias mostram que entre 2009 e 2012 foram notificados cerca de 700 casos de sífilis recente “adquirida no último ano”, mas há sempre tendência para a subnotificação.
A doença, cuja identificação requer notificação obrigatória por parte do médico às entidades de saúde em Portugal, é particularmente importante dado o complexo quadro clínico a ela associada, uma vez que não só pode progredir para infeções do Sistema Nervoso Central (“neurosífilis”) de difícil resolução, como pode ocorrer transmissão de mãe para filho durante a gravidez (“sífilis congénita”), com graves consequências para o feto/recém-nascido.
O artigo “Genome-scale analysis of the non-cultivable Treponema pallidum reveals extensive within-patient genetic variation” é assinado por 11 autores, e é explicado por João Paulo Gomes num texto publicado pela Nature.
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