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Adoçantes artificiais podem ser melhores do que açúcar

Nos últimos anos, assistimos uma batalha contínua sobre o que é pior para si: adoçantes artificiais ou açúcar. A menos que queira abrir mão de todas as bebidas doces, vai acabar por deparar-se com este dilema. Ao invés de confiar no instinto ou nalgum mito, podemos levar em conta os estudos científicos que tentam resolver essa discussão.

Os indícios apontam para o fato de que haver uma correlação entre o consumo de açúcar e problemas de saúde e, segundo o professor de pediatria da Faculdade de Medicina da Indiana University Aaron E. Carroll, estes não podem ser detetados com adoçantes artificiais.

Num artigo publicado no jornal The New York Times, o professor explica as diferenças entre as duas opções, começando pelos adoçantes artificiais, atacados por décadas, acusados de serem substâncias químicas nocivas. “Tudo é química e nem todas são más para nós”, explica.

Um dos mais antigos adoçantes artificiais é a sacarina. Na década de 1980, o Congresso norte-americano determinou que qualquer produto que a contenha deveria conter um aviso de que aquele produto poderia ser perigoso para a saúde e que tinha causado cancro em animais de laboratório.

Relação com cancro de bexiga

Um artigo publicado na Annals of Oncology, em 2004, observou que mais de 50 estudos tinham sido publicados analisando os efeitos da sacarina em ratos. Vinte destes eram estudos de “uma geração”, o que significa que não analisavam a prole dos ratos. Em apenas um destes estudos a sacarina – em enormes quantidades – produziu cancro, e foi num tipo de rato que é frequentemente infetado com um parasita da bexiga que deixá-lo-ia suscetível a cancro de bexiga induzido por sacarina.

Por outro lado, “estudos de duas gerações”, em que os ratos foram alimentados com muita sacarina e os seus descendentes também, descobriram que o cancro de bexiga era significativamente mais comum em ratos de segunda geração. E foi isso que levou muitos países a agir.

No entanto, segundo Carroll, havia um problema: esta ligação não foi confirmada em seres humanos. Além disso, verifica-se que alguns ratos são simplesmente mais propensos a ter cancro de bexiga, inclusive quando recebem grandes quantidades de vitamina C.

Estudos em humanos na Grã-Bretanha, Dinamarca, Canadá e nos Estados Unidos não conseguiram encontrar nenhuma associação entre o consumo de sacarina e o cancro de bexiga quando o tabagismo, que pode causá-lo, foi tirado da equação.

E o aspartame?

Com base nesses estudos mais recentes, a sacarina foi removida da lista de cancerígenos em 2000. Mas, por essa altura, as opiniões já estavam definidas e isso não ajudou as pessoas a sentirem-se mais seguras.

Outros adoçantes artificiais não se têm saído melhor. O aspartame foi introduzido nos Estados Unidos mais ou menos na mesma época em que a sacarina começou a ser atacada. Os estudos iniciais mostraram que o aspartame não causa cancro em animais, e por isso foi considerado mais seguro do que a sacarina.

Porém, um estudo publicado no The Journal of Neuropathology and Experimental Neurology em 1996 questionou a ligação entre o aspartame e o aumento no número de tumores no cérebro entre 1975 e 1992, quando mais pessoas tinham começado a consumi-lo.

Para Carroll, há vários problemas com essa relação simplista. “A maior parte do aumento de cancro era em pessoas com 70 anos ou mais, que não eram os principais consumidores de aspartame. E como aspartame foi aprovado em 1981, culpá-lo por um aumento nos tumores na década de 1970 parece impossível”, diz.

Por fim, estudos muito mais abrangentes não conseguiram encontrar ligações, nomeadamente um estudo de caso com crianças publicado no The Journal of the National Cancer Institute e um estudo de grupo com mais de 450 mil adultos do Cancer Epidemiology Biomarkers and Prevention.

Alguns estudos posteriores sobre o aspartame feitos com ratos são usados como justificativa para o receio em consumir a substância, mas são contestados por organizações como o Instituto Nacional do Cancro dos EUA. Além disso, como acontece com a sacarina, também existem grandes diferenças entre ratos e seres humanos.

Um estudo controlado de 1998 não detetou nenhum efeito neuropsicológico, neurofisiológico ou comportamental causado pelo aspartame. Mesmo uma dose 10 vezes superior ao consumo normal não teve efeito sobre crianças com transtorno de défice de atenção. Uma revisão de segurança de 2007, publicada na Critical Reviews in Toxicology, descobriu que o aspartame tinha sido estudado extensivamente e que as evidências mostravam que era seguro.

Pessoas com fenilcetonúria, um distúrbio genético raro, precisam limitar o seu consumo de aspartame porque a fenilalanina é um dos seus componentes. No entanto, para a maioria das pessoas, o aspartame não é uma preocupação.

Também é verdade que alguns dos adoçantes açúcares alcoólicos, como sorbitol ou manitol, podem ter um efeito laxante ou causar inchaço quando consumidos em grandes quantidades por algumas pessoas. Contudo, em condições normais, a maioria das pessoas pode aproveitar com segurança todos os adoçantes artificiais aprovados.

Mas e o açúcar?

Os açúcares ou hidratos de carbono que ocorrem naturalmente, como os encontrados em frutas, por exemplo, na sua maior parte, não são um problema. Os açúcares adicionados – que não são provenientes de alimentos – é que o são.

Os Centros para Controlo e Prevenção de Doenças dos EUA relatam que as crianças norte-americanas estão a consumir entre 282 calorias (raparigas) e 362 calorias (rapazes) de açúcares adicionados, em média, por dia, o que significa que mais de 15% da ingestão calórica é a partir de açúcares adicionados. Adultos saem-se um pouco melhor, mas não muito.

Este consumo, no entanto, não é distribuído igualmente. Por exemplo, cerca de metade das pessoas não consome bebidas açucaradas, enquanto 25% consomem cerca de 200 calorias por dia. Os 5% do topo, assim, consomem mais de 560 calorias por dia, ou mais de quatro latas de refrigerantes.

Estudos epidemiológicos descobriram que, mesmo após o controlo de outros fatores, a ingestão de açúcares adicionados de uma população está associada ao desenvolvimento de diabetes tipo 2, com um aumento de 1,1% em prevalência para cada lata de refrigerante adoçado com açúcar consumido em média por dia.

No ano passado foi publicado no JAMA Internal Medicine um estudo que acompanhou pessoas ao longo de 14 anos e descobriu que aqueles entre os 5% com o mais alto consumo de açúcar adicionado tinham mais do dobro do risco de morrer de doenças cardiovasculares do que aqueles entre os cinco com o consumo mais baixo.

O editorial que o acompanhava observou que o aumento do risco de morte começava quando uma pessoa consumia o equivalente a 590 ml de refrigerante numa dieta de duas mil calorias e chegava a um aumento de mais de quatro vezes para as pessoas que consumiam mais de um terço de sua dieta em açúcares adicionados.

Açúcar engorda

Não é surpresa, assim, que a ingestão de açúcares adicionados seja significativamente associada com o peso corporal. Uma revisão sistemática publicada no British Medical Journal em 2012 descobriu que o consumo de açúcar aumenta tanto a gordura quanto o peso total.

Outra meta-análise de estudos controlados, publicada no American Journal of Clinical Nutrition em 2013, descobriu que bebidas adoçadas com açúcar por si só causam aumento do peso corporal em adultos.

Por comparação, um estudo do mesmo tipo, publicado no ano passado na mesma revista, feito com adoçantes artificiais ou de baixas calorias descobriu que o seu consumo levou a um peso corporal mais baixo e menos gordura total.

“A minha mulher e eu limitamos o consumo de bebidas gaseificadas dos nossos filhos para cerca de quatro a cinco vezes por semana. Quando deixamos que bebam refrigerantes, são quase sempre livres de cafeína, porque queremos que eles durmam.

Também é quase sempre sem açúcar”, conta Carroll, explicando que aplica o seu conhecimento ao quotidiano. “Há um dano potencial, e provavelmente verdadeiro, de consumir açúcares adicionados; e provavelmente não há dano nenhum nos adoçantes artificiais”.

ZAP / Hypescience

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