Uma millennial deu um golpe de milhões num banco conhecido. Mas o banco estava a pedi-las

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ZAP // Charlie Javice / LinkedIn; Guilhem Vellut / Flickr

Charlie Javice é acusada de ter enganado o JP Morgan num negócio de 175 milhões de dólares

“Aquilo era tudo falso. Tudo falso”. E tudo neste caso é um pouco surreal.

Charlie Javice, fundadora da startup Frank, e Olivier Amar, ex-diretor da empresa, compareceram esta quinta feira a uma audiência num tribunal federal em Manhattan, nos Estados Unidos, onde respondem por acusações de fraude federal.

Javice e Amar são acusados de enganar o JP Morgan Chase em 175 milhões de dólares, depois de terem “exagerado de forma acentuada” o número de utilizadores do serviço financeiro oferecido pela empresa, antes da sua venda ao banco.

Em 2016, então com 24 anos, Charlie Javice fundou a Frank, uma startup destinada a ajudar estudantes universitários a obter os empréstimos federais que o estado norte-americano lhes concede para prosseguir os estudos no Ensino Superior.

Em 2021, Javice encetou negociações para vender a Frank ao JP Morgan, num negócio de 175 milhões de dólares (cerca de 157 milhões de euros).

Em cima da mesa, uma empresa inovadora, em grande crescimento, que oferecia um serviço financeiro a quatro milhões de utilizadores. Um negócio apetecível para um banco como o JP Morgan.

Havia apenas um pequeno problema, conta o Insider: a app da Frank estava longe de ter quatro milhões de utilizadores. Na realidade, alegam os procuradores, seriam apenas 300 mil, cerca de 7,5% do número apresentado ao banco no pitch da empresa.

O negócio foi fechado, e o JP Morgan incorporou a startup nos seus ativos.

Faltava então “entregar” ao banco os tais 4 milhões de utilizadores, que não existiam — algo que não atrapalhou Javice e Amar. Segundo a acusação, os dois executivos terão comprado uma lista com milhões de nomes de estudantes universitários, por cerca de 100.000 dólares.

Seguidamente, contrataram um professor para gerar endereços de email correspondentes aos nomes, e apresentaram os “4 milhões de utilizadores da Frank” ao JP Morgan Chase, numa folha de cálculo com aspeto imaculado.

Aquilo era tudo falso“, acusa o procurador federal do caso, Micah F. Fergenson. “Tudo falso!”.

O JP Morgan descobriu o logro em janeiro de 2022. Um ano mais tarde, o banco fechou a Frank. Fica por explicar como é que a surreal due diligence, a investigação prévia que qualquer empresa compradora faz ao ativo que está a adquirir, falhou redondamente a identificar a fraude.

A folha de cálculo “tinha muito bom aspeto, parecia tudo legítimo, batia tudo certo”. Mas bastaria enviar um simples email para uma pequena amostra dos quatro milhões de endereços — digamos, uns mil contactos — a pedir que o utilizador confirmasse ter subscrito o serviço.

Numa base de dados em que apenas 7.5% dos contactos eram reais, parte significativa dos (falsos) emails teriam sido devolvidos, e outra parte teriam como resposta algo como “não, nunca ouvi falar”.

Talvez fosse interessante fazer uma investigação “póstuma” à due diligence feita pelo Banco à falecida startup.

Javice e Amar negaram todas as acusações. “Not guilty of all charges”. Alex Spiro, advogado da jovem empreendedora, alega que o governo está apenas a fazer eco da ação cível interposta pelo JP Morgan, e acusa o banco de retaliação contra Javice por esta ter revelado alegadas violações de privacidade do banco.

Os dois réus são acusados de fraude em valores mobiliários, fraude financeira e conspiração. A 15 de agosto, apresentam-se novamente ao juiz, que deverá então marcar data para o julgamento.

De forma algo surreal, entretanto, há quem não compreenda por que motivo está Charlie Javice sequer a responder em tribunal.

É que, confidenciou à Fortune uma colega de curso da empreendedora, se Javice cometeu uma fraude tão lucrativa, “por que é que não se meteu num avião para fora do país assim que o dinheiro lhe caiu no banco?”.

“Isto é o que eu penso e a minha grande dúvida”, esclarece.

Armando Batista, ZAP //

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