Tribunal brasileiro proíbe armas perto das mesas de votos. Lula quer retomar política de desarmamento

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) brasileiro decidiu na terça-feira proibir a circulação de pessoas armadas perto das mesas de voto nas eleições presidenciais de outubro.

Numa decisão aprovada por unanimidade pelos sete membros da mais alta autoridade eleitoral, o tribunal decidiu que tanto civis como militares, embora possam transportar armas, não podem entrar nas assembleias de voto armados ou circular dentro de um perímetro de pelo menos 100 metros dos locais de votação.

A decisão é válida tanto para a primeira volta a 02 de outubro como para uma possível segunda volta a 30 do mesmo mês, e isenta apenas os membros das forças de segurança mobilizados para as eleições ou que são convocados por uma autoridade eleitoral, noticiou a agência Lusa.

De acordo com a decisão, a regra vai aplicar-se durante 48 horas antes da abertura das mesas de voto, durante todas as eleições e no dia seguinte ao sufrágio. Segundo o presidente do tribunal, Alexandre de Moraes, quem violar a decisão pode ser detida e julgada tanto por porte ilegal de armas como por crimes eleitorais.

A proibição foi determinada após uma análise do clima atual para as eleições presidenciais, legislativas e regionais de outubro, bipolarizada entre apoiantes do atual Presidente, Jair Bolsonaro, e o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O líder de esquerda, que governou o Brasil entre 2003 e 2010, é o favorito para ganhar as eleições, com cerca de 45% dos votos, à frente dos 32% que as sondagens atribuem a Bolsonaro, que procura a reeleição.

A tensão eleitoral forçou as autoridades a reforçar a segurança dos candidatos e os governos regionais a solicitar o apoio das forças armadas para garantir a ordem pública em diferentes locais considerados conflituosos.

O ambiente eleitoral também foi afetado pelos ataques insistentes do chefe de Estado ao sistema de votação eletrónica do Brasil, que considera suscetível de fraude, e pelas acusações da oposição de que Bolsonaro está a preparar o terreno para um possível golpe de Estado se for derrotado.

O magistrado Ricardo Lewasdoski, instrutor no caso, citou a bipolarização política como justificação da decisão e referiu-se ao aumento na concessão de licenças para possuir e portar uma arma devido à política de flexibilização da legislação sobre a questão.

Bolsonaro flexibilizou as regras de acesso a armas e munições e enfraqueceu os mecanismos de controlo e monitorização do porte e posse de armas.

“As armas e os votos são elementos que não se misturam. A proibição de pessoas armadas nas mesas de voto é necessária para proteger o exercício do sufrágio contra qualquer ameaça, concreta ou potencial, independentemente da sua origem”, frisou.

Lula quer retomar política de desarmamento

Lula afirmou na terça-feira que quer retomar o desarmamento da população caso vença as eleições presidenciais, num país que tem assistido a um aumento exponencial de compras de armas nos últimos quatro anos.

Durante o seu encontro com os governadores, realizado em São Paulo, propôs a recriação do Ministério da Segurança Pública, a criação de uma Universidade especializada nesta área, a unificação do sistema de Segurança Pública e a promoção da cooperação entre países vizinhos para combater o tráfico de droga e o contrabando de armas.

O antigo sindicalista também acenou às forças de segurança pública, uma das principais bases eleitorais de Bolsonaro em 2018, e propôs o reforço da Polícia Federal, durante uma entrevista horas antes com uma estação de rádio local em Manaus, capital do estado do Amazonas.

Lula discutiu com um grupo de governadores algumas das principais linhas da sua política de segurança pública e salientou que, se regressar à presidência, “retomará” o Estatuto do Desarmamento.

O estatuto, aprovado em 2003, durante o primeiro ano do seu mandato (2003-2010), foi aprovado num plebiscito popular em 2005, que rejeitou a proibição da venda de armas no país, mas restringiu o seu porte, encorajando ao mesmo tempo o desarmamento da população civil.

Contudo, o estatuto tem sido flexibilizado nos últimos anos pelo Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, que teve, em 2018, durante a sua primeira campanha presidencial, a liberalização do uso de armas como uma das suas principais políticas.

Sob o lema de que a “população armada não será escravizada”, Bolsonaro encorajou o acesso civil às armas e prometeu que, se for reeleito, tornará ainda mais fácil para os civis transportá-las, num modelo próximo ao dos Estados Unidos.

Bolsonaro, capitão da reserva militar, associou a redução de 6,5% nos assassinatos no Brasil em 2021 – o seu nível mais baixo em dez anos – ao aumento do porte de armas, uma tese que tem sido refutada categoricamente por especialistas na área da segurança pública.

Os dados disponibilizados pelo Exército e pela Polícia Federal brasileiros, compilados pelo Instituto Sou da Paz e partilhados à Lusa no final de junho, são demonstrativos de um aumento exponencial da compra de armas desde que Bolsonaro tomou posse a 01 de janeiro de 2019.

Em 2018, a quantidade de armas no poder de caçadores, atiradores e colecionadores (CAC) era de 350.683. Em 2019 esse valor saltou 24% para 433.246, em 2020 para 569.748 e até novembro de 2021 aumentou mais de 100.000 para 794.958. Cada CAC pode ter até 60 armas.

As autorizações emitidas para novos registos de CAC também dispararam: em 2018 houve 87.989 novos registos, em 2019 houve 147 mil novas entradas e em 2020 totalizaram 218 mil. E só no primeiro semestre de 2021 registou quase 165 mil.

O Instituto Sou Pela Paz registou, desde o início do mandato de Bolsonaro, em 2019, pelo menos 40 normas, entre decretos, portarias, instruções normativas para facilitar o acesso às armas.

Família Bolsonaro comprou 50 imóveis com ‘cash’

Uma investigação do jornal UOL concluiu que a família de Bolsonaro comprou, com dinheiro vivo, 51 imóveis nos últimos 30 anos.

Desde 1990 até hoje, o Presidente, os seus três filhos mais velhos, a sua mãe, cinco irmãos seus e duas ex-mulheres compraram 107 imóveis, no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília, sendo que pelo menos 51 foram adquiridos total ou parcialmente com uso de dinheiro vivo, noticiou o UOL.

Segundo esta publicação, os pagamentos “em moeda corrente nacional”, ao valor de hoje, correspondem a mais de 25 milhões de reais (cerca de cinco milhões de euros).

Bolsonaro reagiu à investigação: “Qual é o problema de comprar com dinheiro vivo algum imóvel, eu não sei o que está escrito na matéria. Qual é o problema?”.

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