Macron venceu a batalha principal, mas a guerra ainda agora começou

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Yoan Valat / EPA

As sondagens ainda são favoráveis a Macron, mas tanto Le Pen como Mélenchon já estão a postos para as legislativas — e o Presidente arrisca-se a perder a maioria absoluta na Assembleia Nacional nas eleições em Junho.

Macron garantiu a reeleição e pode contar com mais cinco anos no Eliseu, mas este momentâneo suspiro de alívio para o chefe de Estado não o faz esquecer o desafio eleitoral que ainda tem de enfrentar este ano. O retrato de uma França dividida e a subida de Marine Le Pen relativamente a 2017 fazem soar os alarmes na antecipação das eleições legislativas, marcadas para 12 e 19 de Junho.

Actualmente, o partido de Macron tem a maioria absoluta na Assembleia, algo que é típico em França. Em 2017, os liberais do La République En Marche! conquistaram 350 dos 577 lugares parlamentares, o que deu uma margem de manobra confortável a Édouard Philippe, primeiro-ministro indigitado por Macron, para governar segundo a sua agenda política.

No entanto, este cenário pode não se repetir este ano e a oposição já se está a preparar para o sufrágio que muitos encaram como uma “terceira volta”. É possível que Macron acabe por ter de nomear um primeiro-ministro de outro partido, já que se a sua escolha pode ser rejeitada pela Assembleia através de uma moção de censura, o que põe em causa o cumprimento do seu programa eleitoral.

O trompete que assinalou o início desta batalha foi soprado logo no discurso de Marine Le Pen, na reacção aos resultados deste domingo, onde alcançou 41,5% dos votos — uma grande subida em relação aos 33,9% de 2017 e o melhor resultado de sempre para a extrema-direita em França.

“Lançamos esta noite a grande batalha das legislativas. Nós estaremos lá. Nós seremos o partido que vai defender os vossos interesses. Vemo-nos na próxima batalha”, anunciou a candidata da União Nacional.

Do lado da esquerda, Jean-Luc Mélenchon, que ficou em terceiro lugar na primeira volta e a morder os calcanhares de Le Pen, com apenas 500 mil votos a separá-los, também já está a polir as armas para a próxima batalha. “A terceira volta começa esta noite”, afirmou o líder do partido França Insubmissa.

As contas de Macron

Mesmo com a vitória que alcançou, a verdade é que os resultados da primeira volta traçam o retrato de uma França tripartida e com muitos eleitores a apenas votarem em Macron para travarem Le Pen — algo que o próprio chefe de Estado admite — agora não é hora de baixar a guarda.

Para além disto, já há 20 anos que a França não reelegia um Presidente, desde a vitória de Jacques Chirac em 2002, o que mostra a tendência de desgaste da imagem dos chefes de Estado em França após o primeiro mandato.

Por enquanto, tudo indica que os franceses vão dar um novo voto de confiança a Macron, apesar da pré-campanha só ter arrancado agora. Uma sondagem do instituto Harris Interactive antecipa que o La République en Marche! e os Republicanos, que estão a estudar uma possível coligação, consigam eleger juntos entre 326 e 366 deputados — uma maioria superior à actual.

A União Nacional deve conseguir entre 117 e 147 deputados e o França Insubmissa pode conquistar entre 73 e 93 lugares. E são estes dois partidos que podem complicar as contas de Macron, até devido à natureza do acto eleitoral.

O sistema eleitoral francês baseia-se em 577 círculos uninominais, o que muitas vezes implica que as eleições para a Assembleia também tenham duas voltas. Caso nenhum candidato consiga uma maioria absoluta que represente pelo menos 25% dos eleitores inscritos na primeira volta no dia 12 de Junho, os franceses são chamados novamente às urnas no dia 19.

No entanto, ao contrário das Presidenciais, que limitam a disputa final a apenas dois candidatos, neste caso, todos os partidos que tenham mais de 12,5% dos votos dos eleitores inscritos passam para o segunda volta.

Este detalhe pode complicar a vida a Macron, já que se antecipa que os partidos dos três candidatos presidenciais mais votados passem para a segunda volta — o que anula o tradicional apelo a que seja criado um “cordão sanitário” para que se trave a extrema-direita.

Neste cenário, o eleitores que não querem Le Pen não são obrigados a votar em Macron — algo que foi notório com os mais de um em cada 12 votos nulos —  e podem optar por Mélenchon.

Os mapas eleitorais da Sky News mostram ainda que a maioria do apoio a Macron se concentrou em Paris e no oeste, enquanto que Le Pen conquistou mais votos no nordeste e no sul.

As regiões dominadas por Le Pen, especialmente o nordeste, são mais rurais e industriais do que os centros urbanos conquistados por Macron. Há cinco anos, muitas destas zonas de colarinho azul foram vencidas pelo En Marche!, mas o crescimento de Le Pen pode ser um sinal de que uma vitória para Macron nestas regiões pode ser mais difícil desta vez.

O trunfo que o chefe de Estado ainda tem é a nomeação do novo líder do Governo, com Élisabeth Borne, Ministra do Trabalho, a ser apontada como a favorita para se tornar primeira-ministra. Antes de apoiar Macron, Borne era próxima dos socialistas, pelo que a sua escolha pode ter uma piscadela de olho aos eleitores da esquerda.

Coligações em cima da mesa

A antecipar tudo isto, os partidos já estão a cozinhar alianças de olho na Assembleia. Mélenchon já está a negociar alianças com os verdes, os comunistas e os socialistas para tentar concentrar o voto da esquerda.

Logo após os resultados da primeira volta mostrarem que estava de fora da corrida ao Eliseu, o esquerdista lembrou que ainda pode vir a ser primeiro-ministro. “A 12 e 19 de junho, apelando a que me elejam como primeiro-ministro, convido-vos a dar vida a um novo futuro comum para o nosso povo”, pediu.

Manuel Bompard, director da sua campanha, também acredita que Mélenchon pode ocupar o cargo e promete que este vai “congelar os preços, aumentar o salário mínimo e avançar com a Sexta República”. Mélenchon também já recebeu o apoio de Ségolène Royal, a candidata socialista à presidência em 2007 e uma voz importante na esquerda francesa

Do outro lado da barricada, Éric Zemmour, candidato da extrema-direita que ficou em quarto com 7% dos votos e apoiou Le Pen na segunda volta, já deixou um apelo para que o “bloco nacional se una” nas legislativas.

“Não pode haver uma vitória eleitoral sem uma aliança entre toda a direita. A nossa coligação não é uma opção — é uma necessidade, é um dever”, afirmou.

Adriana Peixoto, ZAP //

4 Comments

  1. O Macron estava atrás de Marine Le Pen por 217.571 votos. Trinta minutos depois, ele era declarado vencedor. Quais são as hipóteses dos resultados serem predeterminados para dar a vitória, apesar de um índice de aprovação de apenas 36%?

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