Tentativa de golpe de Estado na Bolívia. Presidente acusado de dar a ordem

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Luis Gandarillas/EPA

Militares após um tanque ter entrado à força na sede do Executivo na cidade de La Paz, Bolívia.

Soldados invadiram o palácio presidencial antes de o presidente Luis Arce substituir a liderança das Forças Armadas. Líder militar foi detido, mas há quem acuse o presidente de “auto golpe de Estado”.

Tanques e soldados armados invadiram esta quarta-feira a sede da Presidência da Bolívia numa tentativa de golpe de Estado no país sul-americano.

Pela tarde, unidades do Exército ocuparam praças de La Paz e marcharam pelas ruas da cidade. Um veículo blindado do Exército tentou derrubar a entrada do Palácio Presidencial enquanto soldados entravam no edifício.

O povo também mostrou força.

O líder da tentativa de golpe, general Juan José Zúñiga, afirmou que reconheceria “por agora” o presidente boliviano, Luis Arce, como o chefe das Forças Armadas e chegou a anunciar mudanças no país, incluindo alterações na liderança dos ministérios.

“Os três chefes das Forças Armadas expressaram o nosso desacordo. Haverá um novo gabinete ministerial, certamente as coisas vão mudar (…) o nosso país não pode continuar assim”, afirmou o general.

Zuniga — afastado do comando do Exército após fazer várias ameaças ao ex-presidente Evo Morales, a quem acusava de interferir nas decisões de Arce — disse ainda que iria libertar “prisioneiros políticos”, incluindo a ex-presidente Jeanine Añez, condenada a dez anos de prisão em junho de 2022 por ter organizado um golpe de estado contra o ex-presidente Evo Morales em 2019.

Chefes das Forças Armadas demitidos. Zúñiga detido

Luis Arce denunciou a tentativa de golpe e recebeu imediatamente o apoio de líderes de vários países da região, que condenaram a insurreição militar. Numa publicação no X logo após o início da revolta, Arce apelou ao respeito pela democracia no país e exigiu a desmobilização das tropas.

“Hoje, mais uma vez, o país enfrenta interesses que pretendem destruir a democracia na Bolívia. Convoco o povo boliviano a organizar-se e mobilizar-se contra o golpe de Estado e em defesa da democracia”, escreveu.

Horas após o levante, o presidente voltou a ordenar que Zúñiga desmobilizasse as suas tropas. Demitiu os três chefes das Forças Armadas e nomeou os seus substitutos. Imediatamente, o novo comandante do Exército repetiu a ordem para que as tropas se retirassem.

Pouco depois, os militares golpistas decidiram retirar-se da sede da Presidência e dos principais pontos da capital.

Zúñiga foi detido e responderá em tribunal por tentativa de golpe de Estado. Foi capturado após sair da sede do Estado-Maior do Exército. O Ministério Público boliviano informou que abrirá uma investigação criminal contra o general e outros participantes da tentativa de golpe.

O ex-presidente Evo Morales defendeu a prisão de Zúñiga. “Além da mudança no Alto Comando Militar, deve proceder-se imediatamente a um processo penal e à demissão do General Zúñiga e dos seus cúmplices, em conformidade com a Constituição Política do Estado e a Lei Orgânica das Forças Armadas”, afirmou.

Golpe “encomendado” pelo próprio Presidente?

O comandante demitido Juan José Zuñiga acusou o Presidente boliviano, Luis Arce, de ordenar a operação militar para “aumentar a sua popularidade”.

“No domingo, na escola La Salle, encontrei-me com o Presidente [Luis Arce] que me disse que a situação está muito complicada, que esta semana seria crítica e que ‘algo é necessário para aumentar a minha popularidade’“, disse Zuñiga ao ser detido.

Zúñiga disse que perguntou ao Presidente da Bolívia se deveria “tirar os veículos blindados” dos quartéis e que Arce respondeu: “Tire-os”.

O ministro da Justiça, Iván Lima, negou na rede social X (antigo Twitter) as alegações de Zúñiga, dizendo que o militar estava a mentir para tentar justificar o golpe. Lima acrescentou que o Ministério Público irá pedir a pena máxima de 15 a 20 anos de prisão para Zúñiga, “por ter atacado a democracia e a Constituição”.

“Auto golpe de Estado”?

Apoiantes do antigo Presidente Evo Morales acusaram o líder da Bolívia de realizar um “auto golpe de Estado” para aumentar a sua popularidade, numa altura em que o país atravessa uma crise económica.

“[De] magistrados auto prorrogados a um auto golpe, o povo boliviano está a afundar-se na incerteza”, disse o presidente da câmara alta do parlamento da Bolívia, Adrónico Rodríguez, citado pelo jornal ‘El Deber’.

Rodríguez referia-se aos juízes do Tribunal Constitucional, Supremo Tribunal, Tribunal Agroambiental e Conselho da Justiça, que decidiram prolongar os seus mandatos em dezembro face ao impasse político.

Também César Dockweiler, um outro dirigente do Movimento para o Socialismo, partido liderado por Evo Morales e que domina o parlamento da Bolívia, falou de um “auto golpe” para fortalecer Arce durante uma crise económica.

A deputado Luisa Nayar descreveu a operação militar como um “espetáculo político incrível, montado pelos irresponsáveis, incapazes e corruptos, inquilinos” da Presidência da Bolívia, que acusou de usarem “um general maluco”.

Reações

Luis Almagro, presidente da Organização dos Estados Americanos (OEA), condenou as ações dos militares bolivianos e afirmou que a organização e a comunidade internacional “não tolerarão qualquer forma de rutura da ordem constitucional na Bolívia ou em qualquer parte”.

“Expressamos a nossa solidariedade com o presidente Luis Arce Catacora”, disse.

O primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, afirmou que o seu país “condena categoricamente os movimentos militares na Bolívia. Enviamos ao governo boliviano e ao seu povo o nosso apoio e solidariedade, e apelamos em nome do respeito pela democracia e pelo Estado de direito”.

Um porta-voz da Casa Branca declarou que o governo dos Estados Unidos “acompanha atentamente” a situação na Bolívia e pediu “calma e moderação”.

ZAP // Lusa / DW

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