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Tribunal recusa proibir filme de sexo com o polémico escritor Michel Houellebecq

O escritor francês Michel Houellebecq.

Um colectivo de arte da Holanda recebeu autorização de um tribunal para divulgar um filme pornográfico experimental que mostra o consagrado escritor francês Michel Houellebecq a fazer sexo com mulheres jovens.

Um tribunal de Amesterdão, na Holanda, rejeitou o pedido de Michel Houellebecq e da sua esposa, Qianyun Lysis, para que o filme “KIRAC 27” do colectivo de arte “Keeping It Real Art Critics” não fosse divulgado.

Este colectivo já divulgou um trailer do filme pornográfico, onde se pode ver o escritor de 67 anos numa cama, de pijama, ao lado de uma mulher jovem, enquanto fuma e ri.

O escritor francês queria interditar o filme alegando que só aceitou ser filmado porque o realizador lhe garantiu o anonimato, algo que alega não ter respeitado.

Como é que Houellebecq aparece num filme pornográfico?

Michel Houellebecq é considerado o “enfant terrible” da literatura francesa e também o maior escritor francês entre os vivos. Trata-se de uma figura controversa, mas reconhecida, com vários prémios no currículo, incluindo o prestigiado Goncourt que venceu em 2010, com o romance “O mapa e o território”.

Em 2019, foi-lhe atribuída a Legião de Honra da República Francesa, estando publicado em mais de 40 países, incluindo Portugal, com títulos como “As partículas elementares” (1998), “Submissão” (2015) e “Serotonina” (2019).

Mas, afinal, como é que um autor tão consagrado aparece num filme pornográfico? A história é caricata.

O veredicto do tribunal de Amesterdão argumenta que foi a esposa de Houellebecq quem deu ao realizador holandês Stefan Ruitenbeek a ideia de o escritor aparecer num filme pornográfico experimental para “combater a sua melancolia”, como cita o The Guardian.

No trailer do filme que foi divulgado, ouvimos a voz de Ruitenbeek a explicar que foi contactado por Houellebecq depois da anulação de uma viagem de turismo sexual até Marrocos, país para onde a mulher já teria viajado para lhe “arranjar prostitutas”.

A viagem foi cancelada por receio de que pudesse sofrer algum ataque de extremistas muçulmanos. Note-se que o escritor foi processado pelo líder da Grande Mesquita de Paris que o acusou de “incitação ao ódio contra os muçulmanos” depois de declarações suas publicadas na revista “Front populaire”.

“Disse-lhe que conhecia muitas raparigas em Amesterdão que dormiriam com um escritor famoso por curiosidade“, refere Ruitenbeek no mesmo trailer. A única condição do realizador para proporcionar a Houellebecq uma orgia revitalizadora seria “filmar tudo”.

Ruitenbeek e o próprio Houellebecq terão, depois, trocado vários emails onde planearam fazer “uma obra de arte” em que “ficção e realidade” se confundissem, assinala ainda o tribunal.

As filmagens iniciaram-se em 2022, depois de o escritor ter assinado um documento onde consentia aparecer num filme que “podia, ou não, incluir conteúdo explícito”.

A única restrição imposta por Houellebecq foi que as imagens não o mostrassem a si e aos seus órgãos genitais na mesma cena. Essa circunstância “deixaria o espectador em dúvida sobre se Houellebecq realmente teria participado das cenas de sexo”, ou se se travava de um duplo, assinala ainda o tribunal.

Escritor alega que estava deprimido e com um copo a mais

Contudo, a 23 de Dezembro de 2022, quando faltavam três dias para o término das filmagens, Houellebecq desistiu do projecto, anunciando uma divergência em termos artísticos com o realizador e acusando-o de fazer “jornalismo de sarjeta”.

Na queixa que apresentou ao tribunal, o escritor também alegou que estava a combater uma depressão grave quando aceitou participar no filme, e que tinha bebido mais vinho do que devia na altura de assinar o acordo com o realizador.

Contudo, o tribunal não deu por provados estes factos, até dada a falta de um atestado médico.

No início de Março, já um tribunal de Paris tinha rejeitado outra queixa do escritor, alegando que o filme prejudicava a sua vida privada e a sua honra, além da reputação da mulher que estava “devastada com as mentiras” espalhadas.

Entretanto, o filme deveria ter estreado no passado dia 11 de Março, mas o evento foi adiado. Agora, deve estrear em Maio e Ruitenbeek promete fazer “um trabalho de arte com integridade” que deixe Houellebecq “feliz com o resultado”.

Houellebecq só é feliz a “dormir com muitas mulheres”

Em declarações ao Le Figaro, o realizador holandês rejeita a ideia de que seja um filme pornográfico e prefere falar em “filme sexual”, salientando que “há muito espaço para a intimidade física e o erotismo“.

Já numa entrevista à Vice francesa, Ruitenbeek alega que a ideia partiu do próprio escritor e da mulher depois de ambos terem visto o seu filme “Honey pot” com a actriz Jini van Rooijen, uma estudande holandesa de Filosofia que também é modelo na plataforma de conteúdos adultos OnlyFans.

Ruitenbeek conta que Qianyun Lysis lhe disse que o marido estava “demasiado deprimido” e que “a única coisa que o deixava feliz era dormir com muitas mulheres“. Mas que era “cada vez mais difícil conseguir mulheres que concordassem dormir com ele” e que “ele não gostava de pagar a prostitutas”.

A mulher do escritor terá dito, então, ao realizador que a melhor forma de o “ajudar” era transformá-lo “numa estrela do porno”, relata ainda Ruitenbeek. “Não poderia dizer não, isso seria rude”, constata.

A primeira vez que filmaram foi na própria casa do escritor, em Paris, com Jini Van Rooijen a protagonizar as cenas de sexo ao lado do escritor, nota ainda Ruitenbeek, elogiando a performance de Houellebecq e frisando que foi “muito viril”.

O realizador diz que a mulher do escritor esteve sempre presente nas filmagens, actuando como uma espécie de “assistente sexual” que dava “conselhos” e “água” às quatro jovens que protagonizaram as cenas de sexo com Houellebecq durante as gravações do filme.

Sublinhando que é um admirador do escritor, Ruitenbeek reforça que o filme fala de “intimidade, de amor e do que quer dizer ser um homem velho de 66 anos [o escritor fez, entretanto, 67 anos] depressivo“. Não é “uma questão de sexo”, mas trata-se antes do que é ser “um escritor em fim de vida que se torna numa estrela porno”, acrescenta.

“Ele pode escrever quantos livros maravilhosos quiser, mas ainda se sentirá um merdas“, sublinha também, notando que descobriu um Houellebecq “manipulador”, que “obtém sempre o que quer”.

A mulher é um bom exemplo disso, pois “é totalmente dedicada ao marido” para o “ajudar a sair da depressão”, mas “está completamente desamparada” e “é impossível fazê-lo feliz porque ele funciona como um buraco negro“. “Suga toda a alegria ao seu redor e fá-la desaparecer”, conclui Ruitenbeek.

Susana Valente, ZAP //

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