Empresas portuguesas acusadas de tráfico humano após aliciaram moldavos e romenos para trabalhar no país

Duas empresas de Beja e uma de Santarém estão a ser investigadas no âmbito de um processo de exploração laboral e tráfico de cidadãos romenos e moldavos. Os indivíduos foram aliciados, ainda nos seus países, para virem para Portugal trabalhar na apanha da azeitona em Ferreira do Alentejo.

Segundo o Público, dezenas de sociedades agrícolas fizeram contratos de trabalho com os dez arguidos e as suas empresas criadas como “embuste de legalidade”. Os acusados começam esta terça-feira a ser julgados no Tribunal de Beja. As 58 vítimas vieram para Portugal trabalhar na apanha da azeitona.

A já designada maior operação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras no combate ao tráfico de pessoas em 2018, culminou com a acusação de 10 cidadãos e das suas empresas. Os arguidos são acusados de crime de tráfico de pessoas e de um crime de associação criminosa. O julgamento começa esta terça-feira no Tribunal de Beja.

Para as sociedades agrícolas portuguesas proprietárias das terras, onde as vítimas  trabalharam, foi aberta uma outra investigação pelo crime de utilização de atividade de cidadão estrangeiro em situação ilegal.

Por decisão do Ministério Público, os processos foram separados. Segundo o Público, os arguidos estavam com medidas de prisão que importava “não prolongar para além do necessário”, e a investigação das suspeitas sobre as empresas nacionais, por sua vez, estava atrasada.

“Apurou-se que alguns destes trabalhadores prestavam a sua atividade em tarefas agrícolas na região, de forma continuada ou reincidente, inseridos em explorações pertencentes a terceiros e a algumas sociedades agrícolas”, refere o procurador no despacho de acusação do processo principal, consultado pelo Público.

Na acusação pode ainda ler-se que “os responsáveis por tais explorações agrícolas estariam cientes que utilizavam a mão-de-obra de trabalhadores estrangeiros e em situação irregular, nomeadamente sem que tivessem visto de trabalho legalmente exigido para o efeito.”

Estas empresas caraterizam-se por serem de pequena ou média dimensão, uma das quais tem sede no distrito de Santarém, de onde coordena a ida dos trabalhadores sazonais para os terrenos que possui no Alentejo. O Público tentou falar com as três empresas, mas sem sucesso.

Em concordância com o que é dito pelo Público, o despacho de acusação – que data julho do ano passado –  identifica ainda 47 empresas portuguesas com contactos mantidos com esta rede de cidadãos da Roménia e da Moldávia, e que assinaram contratos verbais ou escritos para a compra de serviços de mão-de-obra de trabalhadores desses países.

A exploração, aliada à apropriação de dinheiro resultante de centenas de horas de trabalho e ao alojamento em contentores ou em casas húmidas, degradadas, sobrelotadas e sem quaisquer condições, resultaram num conjunto de fatores que fizeram com que os arguidos obtivessem vantagens financeiras de mais de 6 milhões de euros.

O processo começou quando seis cidadãos romenos fizeram queixa da situação em dezembro de 2016, na GNR. Com esta denúncia, foi desencadeado um inquérito pelo crime de tráfico de pessoas.

Em poucos anos, a rede trouxe destes dois países mais de 255 pessoas em condições ilegais. Durante o transporte eram colocadas em contentores. “Em regra eram transportados de madrugada, entre as 5h e as 6h, pelos arguidos ou por terceiros a seu mando, para explorações agrícolas, algumas vezes distando centenas de quilómetros dos locais onde estavam instalados, regressando no final do dia”, descreve a acusação.

Refere ainda que quando chegados ao local eram instalados em casas sobrelotadas, húmidas, sem aquecimento e mal conservadas onde quatro ou cinco pessoas partilhavam quartos ou divisões em contentores pré-fabricados de 12 metros quadrados. Ainda pagavam pelo alojamento cerca de um euro por dia ou 50 euros por mês, quantias que lhes eram descontadas das horas de trabalho.

Nos campos eram obrigados a trabalhar pelo período que os arguidos definissem, em regra entre nove e dez horas por dia, seis a sete dias por semana. O almoço não lhes era pago e desde logo era fixado que iriam receber apenas no final da sua permanência em território nacional, 3,5 euros por cada hora de trabalho, diz o Público.

Nos dias em que chovesse, se estivessem doentes ou por qualquer outro motivo a que que não lhes permitisse trabalhar, não receberiam qualquer valor e ainda teriam de pagar dez euros por dia, supostamente para arrecadar custos da água, luz e gás.

A acusação relata ainda que, antes de chegarem a Portugal, já eram – sem terem conhecimento – devedores de 130 euros por despesas da viagem à empresa de transportes controlada por um dos arguidos, remata o Público.

ZAP //

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