Eis a visão mais clara de sempre do núcleo de Marte

NASA/JPL-Caltech/Universidade de Maryland

Esta ilustração mostra um corte de Marte, juntamente com as trajetórias das ondas sísmicas de dois tremores de terra distintos em 2021. Detetadas pela missão InSight da NASA, estas ondas sísmicas foram as primeiras identificadas a entrar no núcleo de outro planeta.

Embora a NASA tenha aposentado o seu módulo de aterragem InSight em dezembro, o tesouro de dados do seu sismómetro será analisado durante décadas.

Ao analisar as ondas sísmicas que o instrumento detetou de um par de tremores de terra em 2021, os cientistas conseguiram deduzir que o núcleo líquido de ferro de Marte é mais pequeno e mais denso do que se pensava.

As descobertas, que marcam as primeiras observações diretas alguma vez feitas do núcleo de outro planeta, foram detalhadas num artigo científico publicado a 24 de abril na revista PNAS (Proceedings of the National Academies of Sciences).

Ocorridos a 25 de agosto e a 18 de setembro de 2021, os dois tremores de terra foram os primeiros identificados pela equipa do InSight como tendo tido origem no lado oposto do planeta em relação ao “lander”.

A distância revelou-se crucial: quanto mais longe um sismo ocorre do InSight, mais fundo no planeta as suas ondas sísmicas podem viajar antes de serem detetadas.

“Precisámos de sorte e de habilidade para encontrar e usar estes sismos”, disse a autora principal Jessica Irving, cientista da Terra na Universidade de Bristol, Reino Unido.

“Os sismos que ocorrem no lado oposto [de Marte, em relação ao InSight,] são intrinsecamente mais difíceis de detetar porque uma grande quantidade de energia é perdida ou desviada à medida que as ondas sísmicas viajam através do planeta”.

Irving observou que os dois tremores ocorreram depois de a missão ter estado a operar no Planeta Vermelho durante mais de um ano marciano (cerca de dois anos terrestres), o que significa que o Serviço de Sismos Marcianos – os cientistas que inicialmente examinam os sismógrafos – já tinha aperfeiçoado as suas capacidades.

Também ajudou o facto de um impacto de um meteoroide ter provocado um dos dois tremores de terra; os impactos fornecem uma localização precisa e dados mais exatos para um sismólogo trabalhar (como Marte não tem placas tectónicas, a maioria dos sismos de Marte são provocados por falhas, ou fraturas na rocha, que se formam na crosta do planeta devido ao calor e ao stress).

O tamanho dos sismos foi também um factor importante para as deteções.

“Estes dois tremores de terra foram dos maiores ‘ouvidos’ pelo InSight”, disse Bruce Banerdt, investigador principal do InSight no JPL da NASA, no sul da Califórnia. “Se não fossem tão grandes, não os teríamos detetado”.

NASA/JPL-Caltech

Esta é a última imagem enviada pelo “lander” InSight da NASA. Foi obtida no dia 11 de dezembro de 2022, ou durante o sol 1436 da missão; mostra o sismómetro do InSight à superfície do Planeta Vermelho.

Um dos desafios na deteção destes sismos em particular foi o facto de se encontrarem numa “zona de sombra” – uma parte do planeta a partir da qual as ondas sísmicas tendem a ser refratadas para longe do InSight, tornando difícil que o eco de um terramoto chegue ao módulo de aterragem, a menos que seja muito grande.

A deteção de ondas sísmicas que atravessam uma zona de sombra é excecionalmente difícil; é ainda mais impressionante que a equipa do InSight o tenha feito usando apenas o único sismómetro que tinha em Marte (em contraste, existem muitos sismómetros espalhados pela Terra).

“Foram necessários muitos conhecimentos sismológicos de toda a equipa do InSight para extrair os sinais dos complexos sismogramas registados pelo ‘lander'”, disse Irving.

Um artigo anterior, que forneceu um primeiro vislumbre do núcleo do planeta, baseou-se em ondas sísmicas refletidas do seu limite exterior, fornecendo dados menos precisos.

A deteção de ondas sísmicas que realmente viajaram através do núcleo permite aos cientistas aperfeiçoar os seus modelos do aspeto do núcleo. Com base nas descobertas documentadas no novo artigo, cerca de um-quinto do núcleo é composto por elementos como enxofre, oxigénio, carbono e hidrogénio.

“A determinação da quantidade destes elementos num núcleo planetário é importante para compreender as condições no nosso Sistema Solar quando os planetas se estavam a formar e como estas condições afetaram os planetas que se formaram”, disse um dos coautores do artigo, Doyeon Kim, da ETH Zurique.

Foi sempre esse o objetivo central da missão do InSight: estudar o interior profundo de Marte e ajudar os cientistas a compreender como todos os mundos rochosos se formam, incluindo a Terra e a Lua.

// CCVAlg

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