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Einstein chamou “macacos fofinhos” aos brasileiros, revelam diários de viagem do cientista

(pd) Arthur Sasse

Albert Einstein, Prémio Nobel da Física em 1921 (adaptação da foto de Arthur Sasse)

Albert Einstein expressou alguns dos seus pensamentos mais íntimos em diários de viagem. Nestas páginas, o homem que revolucionou a Física não tinha filtros.

Einstein não tinha intenção de que as anotações fossem publicadas — mas foram, o que nos permite conhecer as suas impressões sobre os países que visitou.

“Algo que é realmente interessante é que os seus diários revelam uma clara discrepância entre as suas declarações públicas, progressistas e humanitárias, e algumas passagens das suas anotações privadas, nas quais expressava preconceitos e estereótipos em relação às pessoas que conheceu”, disse em 2018 à BBC o historiador Ze’ev Rosenkranz, editor do livro Os Diários de Viagem de Albert Einstein: Extremo Oriente, Palestina e Espanha, 1922 – 1923.

Disse o historiador que a visão do cientista sobre os japoneses era positiva, ao contrário daquilo que pensava sobre os chineses, descritos por Einstein como “um povo trabalhador, repulsivo e obtuso“.

No seu livro Os diários de viagem de Albert Einstein: América do Sul, 1925, Rosenkranz conta que, embora o físico tenha ficado encantado com “a genuína cordialidade” dos uruguaios, escreveu comentários muito “duros” sobre os argentinos — que apelidou de de “índios” e “espanhóis” — e manifestou “um afeto ambivalente pelos brasileiros“.

Numa outra ocasião, referiu-se aos “índios” como “os guardiões dos ‘segredos da vida natural'”.

Um território inexplorado

Em Março de 1925, Einstein embarcou para uma região que nunca tinha visitado: a América do Sul., acredita-se que por uma de duas razões: pessoais (como a necessidade de se ausentar de Berlim) ou científicas (como a possibilidade de ampliar o conhecimento sobre a teoria da relatividade).

O especialista lembra que muito do que se encontra nos diários foram as impressões imediatas que o cientista teve dos locais e das pessoas que conheceu, e que grande parte do seu conteúdo foi escrito de forma extremamente concisa.

O que o físico pretendia era ter um registo para si próprio e para partilhar com Elsa (a sua segunda esposa) e a filha mais nova dela, Margot, que não o puderam acompanhar e o aguardavam em Berlim.

Einstein formou opiniões diferentes sobre os três países, mas o que parece ser uma constante é o impacto positivo que a geografia e a natureza da região tiveram sobre si.

Brasileiros “são macacos para mim”

Einstein passou pouco mais de uma semana no Brasil e ficou maravilhado com “a majestade” da paisagem e da vegetação. “Também ficou encantado com o que apelida de ‘mistura racial’, a diversidade étnica”, explica Rosenkranz.

Numa parte do diário, o físico terá escrito: “Aqui sou uma espécie de elefante branco para os outros, eles são macacos para mim“.

Rosenkranz afirma no livro que essa perceção “aproxima-se muito de uma desumanização dos brasileiros”. Esta tendência reflete-se não só na sua visão dos moradores locais como “macacos”, mas também na forma como se refere a estes como “fofinhos“.

“Einstein acreditava no que se chama determinismo geográfico. Achava que um clima mais quente ou mais húmido prejudicava as faculdades cognitivas da população local.”

O cientista já havia expressado essa ideia num diário anterior, quando fez uma escala no atual Sri Lanka, e indicou que os trópicos suavizam a população. “Ele não consegue imaginar que as pessoas tenham as mesmas capacidades cognitivas se tiverem de lidar com o calor e a humidade, o que, obviamente, demonstra a sua atitude de superioridade.”

Ao usar o termo “fofinhos”, o historiador sugere que, embora possa ser uma manifestação de afeto, também pode denotar alguma superioridade.

“E ‘macacos’ é um termo algo difícil em alemão, pois também pode significar apenas tolos. Mas é claro que, no contexto linguístico, estritamente falando, é uma desumanização, porque estamos a comparar pessoas a macacos e, claro, há um histórico de chamar pessoas de macacos que não é positivo.”

Sem censura

Einstein chegou à América do Sul com a sua própria perspetiva “centro-europeia, caracterizada pelo paternalismo, superioridade e até uma boa dose de arrogância”, escreveu o historiador. “Ele achava que estes textos não seriam publicados”.

No entanto, “deixou o seu património para uma instituição académica, a Universidade Hebraica.”

“Não censurámos nenhum material. Tudo o que está lá, comprometemo-nos a publicar de alguma forma”, e aconteceu que “estes pensamentos muito particulares foram publicados”.

“Apesar das manifestações de preconceito, Einstein tornou-se, anos depois, um importante ativista contra a discriminação dos negros nos Estados Unidos e um activista contra o racismo”, sublinha o investigador.

“Quando vemos como Einstein se comporta ao longo do tempo, percebemos que ele diz coisas diferentes em momentos distintos. Ele até se contradiz, como qualquer outro ser humano, muda de opinião.”

// BBC

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