Tedros Adhanom Ghebreyesus afirmou que não tem “há muito tempo” qualquer contacto com os seus familiares em Tigray. “Nem sei quais estão mortos e quais estão vivos”, disse o diretor-geral da OMS.
O diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, natural de Tigray, Etiópia, afirmou esta quinta-feira que não tem “há muito tempo” qualquer contacto com os seus familiares na região e não pôde ajudá-los enquanto “passavam fome”.
A declaração chega um dia depois de novos combates no estado no norte da Etiópia entre o exército federal e as forças leais à administração tigray terem quebrado uma trégua de cinco meses.
“Tenho lá muitos familiares (…) Nem sei quais estão mortos e quais estão vivos”, disse o responsável máximo da OMS numa conferência de imprensa em Genebra.
Esta não é a primeira vez que Tedros Ghebreyesus fala aos jornalistas sobre a situação no seu país e a situação humanitária em Tigray.
“Não posso enviar-lhes dinheiro. Estão a passar fome, sei que (…) não posso partilhar com eles o que tenho porque estão completamente isolados. Não posso falar com eles. Há muito tempo que não falo com eles”, afirmou.
Em 17 de agosto, o diretor-geral da OMS fez soar o alarme sobre a situação humanitária em Tigray, que considerou “a pior catástrofe do mundo”, culpando os líderes dos países desenvolvidos por negligenciarem a crise.
Há, disse esta quinta-feira Tedros, seis milhões de pessoas que “estão a ser castigadas coletivamente”.
A região de Tigray voltou a estar isolada pelas forças militares federais depois do reacendimento dos confrontos na madrugada de quarta-feira, limitando a entrega de ajuda humanitária numa área onde mais de dois milhões de pessoas necessitam de assistência urgente. Foram ainda impostos cortes de eletricidade e telecomunicações.
“Todos os que estão envolvidos no trabalho humanitário estão desapontados com os esforços da comunidade internacional em relação à situação em Tigray. Não progredimos durante mais de 21 meses e o impasse criou condições desumanas“, afirmou Soce Ibrahima Fall, diretor-geral adjunto da OMS para a Resposta a Emergências, na conferência de imprensa.
“Esta é uma situação extrema que requer esforços excecionais da comunidade internacional para salvar vidas”, acrescentou Fall.
A França apelou quinta-feira às autoridades federais etíopes e tigray para pararem imediatamente com os combates e retomarem as negociações, manifestando-se “muito preocupada com o reinício das hostilidades no norte da Etiópia“, de acordo com uma declaração do ministério francês dos Negócios Estrangeiros.
“A França apela ao governo federal e à Frente Popular de Libertação do Tigray [TPLF] para que retomem as negociações de paz sem condições prévias, sob os auspícios da União Africana. A prioridade deve ser assegurar o acesso da ajuda humanitária às populações afetadas pelo conflito, e a restauração dos serviços básicos no norte do país”, acrescenta a declaração.
A guerra em Tigray eclodiu a 4 de novembro de 2020, quando o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, enviou o exército federal para o estado no norte do país, com a missão de retirar pela força os dirigentes locais da TPLF que vinham a desafiar a autoridade de Adis Abeba há muitos meses.
O pretexto específico da invasão foi um alegado ataque das forças estaduais a uma base militar federal no Tigray, e a operação foi inicialmente caracterizada por Adis Abeba como uma missão de polícia, que tinha como objetivo restabelecer a ordem constitucional e conduzir perante a justiça os responsáveis pela sua perturbação continuada.
O conflito na Etiópia provocou a morte de vários milhares de pessoas e fez mais de dois milhões de deslocados, deixando ainda centenas de milhares de etíopes em condições de quase fome, de acordo com a ONU.
O reacendimento dos combates na quarta-feira marca o fim de uma trégua acordada no final de março e até agora respeitada.
As acusações entre o Governo federal e a administração tigray vinham a subir de tom nos últimos dias, com cada uma das partes a apontar à outra a intenção de retomar as hostilidades, apesar de nos últimos meses ambas reiterarem o respetivo compromisso relativamente às negociações, que ainda não começaram.
// Lusa