Deepfake-as-a-Service: um humano digital à sua disposição em 24 horas, por 130 euros

The Neutronium Alchemist / Pixabay

É uma pessoa real? É um avatar? É Aisha Sinclair.

A tecnológica chinesa Tencent Cloud lançou uma plataforma de produção de “humanos digitais” que pode ser usada para responder a perguntas em transmissões ao vivo — e muito mais.

Disponíveis em formato de meio corpo ou corpo inteiro, os humanos digitais de alta definição da empresa chinesa podem ser produzidos em apenas 24 horas, com um custo de 1.000 yuans (cerca de 130 euros).

Basicamente, diz o The Register, a Tencent Cloud acaba de inventar o conceito de Deepfake-as-a-Service (DFaaS).

De acordo com o jornal chinês Jiemian, o serviço da Tencent Cloud precisa apenas de três minutos de vídeo ao vivo e 100 frases de uma dada pessoa para treinar um humano digital, em inglês e chinês.

A evolução exponencial da Inteligência Artificial generativa e a popularização do seu uso tem aumentado o receio de que, num futuro a curto prazo, o conteúdo falso se torne difícil — ou impossível — de distinguir do real.

A prova de que a IA está a criar falsos acontecimentos históricos, nomeadamente com a proliferação de imagens falsas geradas por computador, é o caso recente das fotografias falsas de Donald Trump a ser preso — que tinham sido geradas no Midjourney.

 

 

 

A tecnologia para gerar “humanos digitais” não é propriamente nova. Em fevereiro do ano passado, o ZAP criou mesmo um canal experimental de vídeos de ciência no YouTube, com o simpático nome de The Neutronium Alchemist, com notícias de ciência apresentadas em inglês.

Durante 10 meses, o canal publicou 54 vídeos de grande qualidade, com imagem cuidada e conteúdo científico rigoroso, validado e corrigido pelos investigadores envolvidos nos estudos reportados — que nos fizeram chegar feedback extraordinariamente positivo acerca do conceito e sua implementação.

Poucos dos cientistas que validaram os vídeos, subscritores do canal que os viram no YouTube ou leitores do ZAP que os apanharam nas notícias que publicámos se aperceberam de que os doze apresentadores das notícias (e as suas vozes) eram gerados por inteligência artificial.

Já em fevereiro deste ano, o canal de televisão da agência estatal chinesa Xinhua apresentou Xin Xiaomeng, a primeira “jornalista de inteligência artificial” do mundo, depois de o primeiro pivô de notícias masculino do mundo, Qiu Hao, ter dado a cara na Conferência Mundial da Internet realizada em novembro em Wuzhen.

Embora as fotografias geradas por Inteligência Artificial sejam difíceis de distinguir das reais, os vídeos IA estão ainda longe de ser totalmente convincentes — e não conseguem fugir ao chamado “uncanny valley“, a ligeira estranheza que sentimos perante a representação de um humano que “está quase lá” mas não é perfeita.

Mas, à velocidade a que a Inteligência Artificial está a evoluir, é uma questão de tempo até que os deepfake videos consigam saltar este uncanny valley.

A grande novidade que a plataforma da Tencent Cloud apresenta agora é que os seus humanos digitais, uma vez modelados e treinados, estão prontos a ser usados em interações ao vivo, em tempo real, nas mais variadas aplicações — de anúncios comerciais a palestras em universidades ou congressos médicos.

O objetivo da empresa chinesa, diz o seu CEO, Chen Lei, é que a sua “Fábrica Humana de Inteligência Digital AI+” seja uma plataforma única de “produção, vendas e serviço de auto-atendimento a compras”.

A legislação chinesa obriga as plataformas de Inteligência Artificial a garantir que os seus serviços não sejam usados para fins ilegais, mas este tipo de restrições tem habitualmente eficácia reduzida.

E quem quiser criar um humano digital — na plataforma da Tencent ou outra qualquer, existente ou por nascer, conhecida ou secreta — para o usar com intuitos maliciosos, vai fazê-lo.

Assim, num futuro próximo, teremos provavelmente a internet inundada de deepfakes convincentes, a apresentar-nos um mundo plausível indistinguível do real, manipulados por qualquer pessoa com 130 euros e algum engenho. Será um novo mundo de Reality-as-a-Service.

Armando Batista, ZAP //

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