O “canto do cisne” de uma nuvem que se aproxima do buraco negro supermassivo da Via Láctea

A. Ciurlo et al./GCOI da UCLA/Observatório W. M. Keck

Imagem obtida pelo Observatório Keck, no verão de 2021, que mostra as estruturas de gás e poeira no Centro Galáctico, incluindo objetos G e X7.

Duas décadas de monitorização pelo Observatório W. M. Keck em Maunakea, Hawaii, revelam uma nuvem peculiar a ser rasgada à medida que acelera em direção ao buraco negro supermassivo no centro da nossa Galáxia, a Via Láctea.

Chamada X7, os astrónomos da GCOI (Galactic Center Orbits Initiative) da UCLA (Universidade da Califórnia, Los Angeles) e do Observatório Keck têm vindo a acompanhar desde 2002 a evolução deste filamento de gás empoeirado; imagens de alta resolução angular, no infravermelho próximo, capturadas com o poderoso sistema de óticas adaptativas do Observatório Keck, mostram que X7 se tornou tão alongada que agora tem um comprimento equivalente a 3000 vezes a distância que separa a Terra do Sol (ou 3000 UA – unidades astronómicas).

O estudo foi publicado na revista The Astrophysical Journal.

“Esta é uma oportunidade única de observar, em alta resolução, os efeitos das forças de maré do buraco negro, dando-nos uma visão da física do ambiente extremo no Centro Galáctico”, disse Anna Ciurlo, investigadora da UCLA e autora principal do estudo.

As forças de maré esticam um objeto que se aproxima de um buraco negro; o lado do objeto mais perto do buraco negro é puxado com muito mais força do que o lado mais distante.

“É emocionante ver mudanças significativas na forma e dinâmica de X7 em tão grande detalhe numa escala de tempo relativamente curta à medida que as forças gravitacionais do buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea influenciam este objeto”, disse o coautor Randy Campbell, líder das operações científicas no Observatório Keck.

X7 tem uma massa de cerca de 50 Terras e está num percurso orbital em torno do buraco negro da nossa Galáxia, de nome Sagitário A* (ou Sgr A*), que demora 170 anos a completar.

“Prevemos que as fortes forças de maré exercidas pelo buraco negro Galáctico vão acabar por rasgar X7 antes mesmo de completar uma órbita”, disse o coautor Mark Morris, professor de física e astronomia na UCLA.

Com base na sua trajetória, a equipa estima que X7 fará a sua maior aproximação a Sgr A* por volta do ano 2036, então dissipando-se completamente pouco tempo depois. O gás e a poeira que constituem X7 eventualmente serão arrastados para Sgr A* e poderão mais tarde causar alguns “fogos-de-artifício” à medida que aquecem e espiralam para o buraco negro.

Estes achados são a primeira estimativa do percurso orbital ligeiramente excêntrico e a análise mais robusta até à data das notáveis mudanças na sua aparência, forma e comportamento.

Para observar X7, a equipa utilizou o espectrógrafo OSIRIS (OH-Suppressing Infrared Imaging Spectrograph) do Observatório Keck e a câmara NIRC2 (Near-Infrared Camera, de segunda geração), em combinação com os sistemas de ótica adaptativa dos telescópios Keck I e Keck II.

X7 mostra algumas das mesmas propriedades observacionais que os outros estranhos objetos empoeirados em órbita de Sgr A* chamados objetos G, que se parecem com gás, mas que se comportam como estrelas. No entanto, a forma e a estrutura da velocidade de X7 transformaram-se de forma mais dramática em comparação com os objetos G.

O gás esticado e o filamento de poeira movimentam-se rapidamente, chegando a atingir velocidades que rondam os 780 km/s. Devido à massa extremamente elevada do buraco negro, tudo na sua vizinhança se move muito mais depressa do que o que normalmente vemos em qualquer outro lugar da nossa Galáxia.

Embora a origem de X7 ainda seja um mistério à espera de ser desvendado e confirmado, a equipa de investigação tem algumas pistas sobre a sua possível formação.

“Uma possibilidade é que o gás e a poeira de X7 foram ejetados no momento em que duas estrelas se fundiram”, disse Ciurlo. “Neste processo, a estrela fundida é escondida dentro de uma concha de gás e poeira, o que pode encaixar na descrição dos objetos G. E o gás ejetado talvez tenha produzido objetos semelhantes a X7″.

A equipa de investigação vai continuar a monitorizar as mudanças dramáticas de X7 com o Observatório Keck à medida que a poderosa gravidade do buraco negro a destrói.

“É um privilégio poder estudar o ambiente extremo no centro da nossa Galáxia”, disse Campbell. “Este estudo só pode ser feito utilizando as soberbas capacidades do Keck e realizado no venerado Maunakea, com honra e respeito por este local especial”.

// CCVAlg

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