O bloqueio da rede social Twitter na Turquia, em vigor desde as 00:00, parece ter tido apenas um efeito: fez disparar o uso deste serviço de micromensagens e cimentar a imagem autoritária do primeiro-ministro, o islamita Recep Tayyip Erdogan.
O bloqueio do Twitter pelas autoridades de Ancara desencadeou uma grande onda de mobilização na internet, permitindo aos internautas turcos contornarem a censura e expondo o autoritarismo crescente do Governo, segundo alguns especialistas.
Pouco após o anúncio de Recep Tayyip Erdogan, o próprio grupo Twitter foi um dos primeiros a contra-atacar, publicando uma mensagem recordando que os seus serviços estavam acessíveis na Turquia através de SMS.
Grupos de ativistas revelaram técnicas que permitiam aos cidadãos turcos alterar as definições internas de uma ligação de internet para poderem continuar a exprimir-se em 140 carateres, apesar da proibição governamental.
Muitos utilizadores publicaram conselhos para evitar o bloqueio, alterando os parâmetros DNS do computador, usando o serviço de mensagens do telemóvel, ou recorrendo a serviços de “proxys”, enquanto outros declararam que melhor do que mudar os DNS era “mudar o Governo”.
As empresas também ofereceram acesso gratuito às respetivas VPN, uma rede privada virtual que permite apagar as pistas, escondendo a real localização geográfica dos internautas.
“Os truques para contornar a censura propagaram-se como um rastilho de pólvora”, sublinha Philip Howard, que dirige um centro sobre o ativismo digital — o Digital Activism Research Project — na Universidade de Washington.
O êxito não se fez esperar: “As pessoas começaram a contornar a censura pouco a pouco e, em seguida, o tráfego transformou-se num verdadeiro dilúvio”, descreveu Zeynep Tufekci, uma socióloga turca da Universidade da Carolina do Norte, que acompanha o tráfego em tempo real no seu blog. Segundo a socióloga, os ‘tweets’ publicados na Turquia ou escritos em turco atingiram mesmo “níveis próximos do seu recorde” e a censura de Ancara uniu a ‘Twittosfera’.
Abundaram as caricaturas de Erdogan lutando com passarinhos azuis — o logótipo do Twitter -, ora vestido de caçador disparando sobre as avezitas, ora transportando-as enjauladas, ora coberto pelos excrementos destas.
A maioria das mensagens era de protesto, com a “hashtag” #TwitterblockedinTurkey, que desde a meia-noite se transformou em “trending topic” em vários pontos do mundo.
O bloqueio entrou em vigor horas depois de Erdogan ter prometido “arrancar o Twitter pela raiz”, durante um comício na cidade de Bursa, onde discursou aos seus apoiantes, no âmbito da campanha para as eleições municipais de 30 de março.
Paradoxalmente, frases desse mesmo discurso foram transmitidas em direto a partir da conta pessoal do primeiro-ministro naquela rede social, em que ele é o terceiro chefe de Governo mais popular do mundo, com 4,17 milhões de seguidores.
A incoerência não acabou ali: hoje, o vice-primeiro-ministro, Bülent Arinç enviou um ‘tweet’ anunciando a sua agenda, talvez sem saber do bloqueio, e o presidente da câmara de Ancara, Melih Gökçek, um fervoroso defensor da linha dura de Erdogan, cancelou uma reunião através de outra mensagem no Twitter.
Gökçek afirmou que consegue usar a rede social “por ter os DNS alterados”, um truque muito habitual na Turquia para evitar os numerosos bloqueios de páginas da Internet incómodas para o Governo, mas manifestou o seu apoio à medida “para dar uma lição aos que insultam e usam contas falsas”, noutro ‘tweet’.
Mais coerente foi o Presidente turco, o também islamita Abdullah Gul, que também usou o Twitter, mas conscientemente: pronunciou-se “contra o bloqueio das redes sociais” numa série de mensagens hoje enviadas.
“Além de tudo, bloquear redes sociais que são utilizadas em todo o mundo, como o Twitter, é tecnicamente impossível, como se viu”, argumentou o chefe de Estado.
/Lusa