Ativistas do clima no Reino Unido foram condenados a pesadas penas de prisão pelo seu envolvimento em protestos pacíficos contra as perfurações de petróleo no Mar do Norte, numa altura em que a Inglaterra enfrentava violentas manifestações extremistas. A assistir, na galeria, a indústria do petróleo.
Quando, em agosto, grupos de extremistas deixaram a Inglaterra a ferro e fogo com uma série de violentos protestos, a pretexto do ataque numa escola que vitimou uma criança portuguesa, a ativista do clima Cressie Gethin, de 22 anos, estava sentada numa cela de prisão.
O seu crime?
Organizar um protesto contra as novas licenças concedidas pelo governo britânico para a extração de petróleo no Mar do Norte, salienta a CNN.
Estes protestos, organizados pela Just Stop Oil, tinham como objetivo chamar a atenção para os danos ambientais causados pelos combustíveis fósseis.
No final de julho, um tribunal londrino considerou Gethin e quatro outros membros do grupo ativista culpados de “conspirar intencionalmente para causar incómodo público”, depois de terem recrutado manifestantes para escalar estruturas ao longo da M25, importante estrada circular à volta de Londres, paralisando o trânsito em partes durante quatro dias em novembro de 2022.
Os promotores alegaram que os protestos, organizados através de uma chamada Zoom, causaram na altura perturbações a mais de 700 mil condutores, provocaram danos económicos de mais de 900 mil euros e custos de 1,2 milhões de euros em policiamento.
Agora, Gethin, Louise Lancaster, Daniel Shaw e Lucia Whittaker-De-Abreu estão a cumprir penas de prisão de quatro anos, enquanto o co-fundador da Just Stop Oil, Roger Hallam, foi condenado a cinco anos. Todos apresentaram recurso das penas.
As sentenças são consideradas as mais longas da história do Reino Unido para protestos não violentos e foram proferidas ao abrigo de duas novas leis controversas que reforçaram os poderes da polícia para reprimir os protestos “perturbadores”, mesmo quando são pacíficos.
Estas leis colocam o ato de planear um evento de “incómodo público”, que acarreta uma pena máxima de 10 anos de prisão, num patamar semelhante ao de crimes violentos como o roubo, cujas penas variam entre o serviço comunitário e 12 anos de prisão, ou a violação, que vai de quatro a 19 anos.
O juiz, que em tribunal se referiu aos ativistas como “extremistas”, justificou as longas penas de prisão porque os cinco ativistas já tinham sido condenados por um ou mais crimes relacionados com a ação direta de protesto.
Cada um deles estava sob fiança no âmbito de um outro processo quando ocorreu a chamada do Zoom. O juiz salientou ainda na sua sentença que houve pessoas que faltaram a consultas médicas importantes e a funerais por causa do protesto.
Mas os ativistas justificam as suas táticas de perturbação, sustentando que as suas manifestações são proporcionais ao problema em causa — um mundo em rápido aquecimento que ameaça transformar a vida tal como a conhecemos, através de fenómenos meteorológicos extremos mortais e levando os ecossistemas ao limite.
Agora, os ativistas estão a lutar contra os poderes reforçados da polícia e dos tribunais para fazerem valer o seu ponto de vista.
“Uma sentença muito severa como esta não faz sentido do ponto de vista moral ou legal — mas faz sentido do ponto de vista político“, explicou Cressie Gethin à CNN numa carta escrita à mão a partir de HMP Bronzefield, uma prisão feminina a sul do aeroporto de Heathrow, em Londres.
Estas leis foram duramente criticadas pelo relator especial da ONU para os defensores do ambiente, Michael Forst, que considera que os diplomas não só criminalizam os protestos pacíficos, como estão mesmo a ser aplicados de forma “punitiva e repressiva“.
Política vs. Petróleo
Nos últimos anos, grupos de reflexão e de pressão financiados por empresas petrolíferas têm estado envolvidos na elaboração de legislação que afeta diretamente as atividades de protesto, salienta a CNN.
Mas as ligações financeiras e ideológicas entre a indústria petrolífera e os decisores políticos do Reino Unido suscitam preocupações quanto à influência dos interesses empresariais nas políticas públicas.
Estas ligações são exemplificadas pelo envolvimento da ExxonMobil e de outros gigantes do sector dos combustíveis fósseis no financiamento de grupos de reflexão como o Policy Exchange, que influenciou significativamente a legislação britânica destinada a restringir os protestos ambientais.
Apesar da recente mudança de governo no Reino Unido, com uma administração trabalhista de centro-esquerda a comprometer-se a suspender novas licenças de perfuração de poços de petróleo, as controversas leis de policiamento de protestos pacíficos permanecem intactas.
O quadro jurídico atualmente em vigor continua a visar grupos ambientalistas como o Just Stop Oil e o Extinction Rebellion, refletindo uma tendência mais ampla de aumento das restrições aos protestos a nível mundial.
Leis semelhantes foram promulgadas nos Estados Unidos e noutros países democráticos, muitas vezes por influência de interesses corporativos que procuram proteger as suas operações do escrutínio público e da oposição.
Um relatório publicado na terça-feira pela Climate Rights International criticou a duplicidade de critérios de uma série de nações ricas que promovem a democracia a nível mundial e que utilizam leis policiais duras, detenções e penas de prisão contra os manifestantes contra o clima nos seus países, incluindo o Reino Unido, os EUA, a Alemanha, a França e a Austrália.
A disparidade na forma como a lei é aplicada aos diferentes tipos de protestos, sejam eles ambientais ou outros, realça a natureza subjetiva da aplicação da lei no Reino Unido.
A condenação severa de ativistas do clima no Reino Unido, a influência estratégica da indústria petrolífera nas políticas públicas e a tendência global para leis de protesto mais severas colocam desafios significativos às liberdades democráticas e à defesa do ambiente.
À medida que o planeta enfrenta crises ecológicas e climáticas crescentes, as medidas tomadas pelos governos para equilibrar a ordem pública e o direito de protesto serão fundamentais para moldar o futuro — tanto da dissidência pública como da política ambiental.
Parasitas climáticos.. nojentos