As flores estão a evoluir para a autopolinização: quando afastar insetos é um grande problema

“Feedback eco-evolutivo” faz parte de uma resposta à diminuição drástica do número de insetos: com menos insetos disponíveis para a polinização cruzada, as plantas têm menos incentivo para investir em características que os atraem.

A diminuição das populações de insetos está a conduzir a uma nova séria preocupação ecológica: a adaptação das flores à autopolinização — um processo que ocorre quando o pólen de uma flor fertiliza o óvulo na mesma flor ou noutra flor da mesma planta, ao contrário da mais comum polinização cruzada.

Uma pesquisa recente do Centro Nacional Francês de Pesquisa Científica (CNRS) e da Universidade de Montpellier revela que as flores, mais especificamente as nativas europeias violetas-dos-campos (Viola arvensis), estão a evoluir para a autopolinização devido a um declínio drástico nas populações de insetos.

À primeira vista, a adaptação até soa benéfica, mas na verdade apresenta ameaças significativas à biodiversidade e ao equilíbrio do ecossistema.

O estudo comparou dados genéticos de violetas-dos-campos atuais com os cultivados a partir de sementes coletadas nas últimas décadas e os resultados indicaram um aumento de 27% nas taxas de autopolinização, acompanhado de mudanças observáveis nas características físicas das flores.

As violetas-dos-campos modernas exibem corolas menores e menos vistosas e uma redução de 20% na produção de néctar — mudanças consistentes em quatro das populações estudadas que resultam em menor atratividade para abelhas e outros agentes polinizadores.

“Documentamos a evolução de características para corolas menores e menos vistosas, redução na produção de néctar e diminuição da atratividade para abelhas, com estas mudanças de características convergentes nas quatro populações estudadas”, escreveram os investigadores, citados pelo Science Alert.

Mas a que se deve esta mudança na estratégia de polinização das flores?

Faz tudo parte de uma resposta à diminuição do número de insetos; com menos insetos disponíveis para a polinização cruzada, as plantas têm menos incentivo para investir em características que os atraem.

Este ciclo de “feedback” agrava o problema: à medida que as plantas se tornam menos atraentes para os insetos, a frequência de visita às plantas diminui ainda mais, promovendo a autopolinização nas plantas.

Por sinal, outros aspetos à parte das características reprodutoras das violetas-dos-campos, como o tamanho das folhas e o tamanho geral da planta, permaneceram inalterados, o que sugere um foco evolutivo específico na autossuficiência reprodutiva.

Apesar de sublinhar a impressionante capacidade de evolução das plantas como resposta às mudanças ambientais, a adaptação tem consequências como o aumento da endogamia —redução da diversidade genética e maior risco de extinção para estas espécies de plantas.

Esta evolução natural acaba por afetar tanto as plantas como os insetos — um lembrete da importância da interconetividade nos nossos ecossistemas.

“A rápida evolução em direção a uma síndrome de autopolinização pode, por sua vez, acelerar ainda mais o declínio dos polinizadores, num ciclo de feedback eco-evolutivo com implicações mais amplas para os ecossistemas naturais”, lê-se no estudo publicado no New Phytologist.

Tomás Guimarães, ZAP //

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