A gravidez pode despertar vírus antigos no seu ADN

Durante a gravidez e nos momentos de perda de sangue, o nosso ADN desperta para algo ancestral que provoca um aumento da procura de glóbulos vermelhos no organismo, descobriram os investigadores.

Um novo estudo realizado por investigadores dos EUA e da Alemanha revelou fragmentos de vírus há muito adormecidos que desencadeiam uma resposta imunitária que aumenta a produção de glóbulos vermelhos quando é mais necessário.

A descoberta surpreendente, publicada na revista Science, foi feita através de uma análise de células estaminais hematopoiéticas (formadoras de sangue) de ratinhos, nas quais fragmentos de código genético, conhecidos como retrotransposões foram ativados durante a gravidez.

As células estaminais hematopoiéticas parecem desbloquear um processo viral que as células há muito esqueceram, mas não é isento de riscos, quando despertados, os fragmentos virais podem saltar de um lugar para outro no genoma, fazendo alterações.

Segundo o Science Alert, através de uma análise de amostras de sangue de mulheres grávidas e não grávidas, os investigadores descobriram que era provável que a mesma reativação de retrotransposões observada nos ratos ocorresse também nos seres humanos.

Outros testes mostraram que, quando este processo era bloqueado nos ratinhos, os animais desenvolviam anemia. Esta condição, em que há falta de glóbulos vermelhos, é algo a que as mulheres grávidas são particularmente suscetíveis, devido ao stress extra no corpo.

“É o oposto do que esperávamos”, afirma Sean Morrison, geneticista e imunologista do Centro Médico Southwestern da Universidade do Texas. “Se alguma vez houve uma altura para proteger a integridade do genoma e evitar mutações, foi durante a gravidez”.

“Existem centenas destas sequências de retrotransposões no nosso genoma. Porque não as inativar permanentemente, como algumas espécies fizeram? Devem ter algum valor adaptativo para nós”.

Vulgarmente designados por “ADN lixo“, os retrotransposões foram em tempos descartados como segmentos de código que pareciam ter pouco significado. Sabe-se agora que muitas destas relíquias genéticas ainda podem entrar em ação, por vezes até em nosso benefício.

Neste caso, a equipa verificou que os retrotransposões ativavam uma proteína de sinalização chamada interferão, que por sua vez aumentava a atividade das células estaminais hematopoiéticas.

“Este trabalho muda a forma como pensamos sobre os mecanismos que regulam a regeneração dos tecidos”, diz Morrison.

“Até agora, só o demonstrámos no sistema de formação do sangue, mas especulamos que outros tipos de células estaminais também cooptam retrotransposões e sensores imunitários para ativar as células estaminais durante a regeneração dos tecidos”.

O novo estudo não só mostra como o temo “ADN lixo” é um termo errado, como também contribui para a nossa compreensão das defesas naturais utilizadas para manter a mãe e o bebé seguros durante a gravidez.

No que diz respeito aos seres humanos, o ADN transmitido pelas infeções virais dos nossos antepassados representa cerca de 8% de todo o nosso genoma. Os cientistas ainda estão a aprender sobre a importância desta fonte de codificação.

“Estas descobertas ajudam-nos a compreender alguns dos mecanismos subjacentes que contribuem para a anemia durante a gravidez”, afirma Alpasian Tasdogan, geneticista da Universidade de Duisbur-Essen, na Alemanha.

“O nosso próximo passo é iniciar um ensaio clínico para aprofundar o nosso conhecimento sobre o funcionamento dos retrotransposões nos doentes”.

Teresa Oliveira Campos, ZAP //

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