Num feito histórico, três pessoas com doenças autoimunes graves alcançaram a remissão após receberem um tratamento com células imunitárias modificadas por CRISPR e bioengenharia.
Esta é a primeira vez que pessoas com doenças autoimunes são tratadas com células imunitárias de dadores, em vez de utilizarem as suas próprias células. Isto pode abrir caminho a tratamentos mais acessíveis para as doenças autoimunes.
Um dos doentes, Gong, um homem de 57 anos de Xangai, sofria de esclerose sistémica, uma doença que pode levar ao endurecimento da pele e a lesões nos órgãos. Depois de receber a terapia, Gong relatou ter sentido uma melhoria em apenas três dias, dizendo que conseguia mexer os dedos e abrir a boca novamente. No espaço de duas semanas, regressou ao trabalho e continuou a sentir-se bem mais de um ano após o tratamento.
O tratamento utiliza células T recetoras de antigénios quiméricos (CAR), que já se revelaram promissoras no tratamento de cancros do sangue. Nas doenças autoimunes, como o lúpus e a esclerose múltipla, as células imunitárias rebeldes atacam os tecidos do próprio organismo.
A terapia CAR T reprograma o sistema imunitário para atacar estas células defeituosas. Tradicionalmente, esta terapia utiliza as células imunitárias do próprio doente, mas este processo pode ser dispendioso e demorado. A nova abordagem utiliza células de dadores, o que pode permitir a produção em massa e reduzir os custos.
Lin Xin, imunologista da Universidade de Tsinghua, em Pequim, explica que as células CAR T derivadas de dadores podem vir a ser produzidas em maior escala. Isto significaria que as células de um único dador poderiam ser utilizadas para tratar centenas de pessoas.
O estudo, publicado recentemente na revista Cell, envolveu dois homens e uma mulher com diferentes doenças autoimunes graves.
O tratamento envolveu a extração de células T de uma mulher de 21 anos e a sua modificação através da tecnologia CRISPR para evitar a rejeição pelo sistema imunitário do recetor. Estas células foram depois injetadas nos doentes, onde visavam e destruíam as células imunitárias com mau funcionamento.
Dois meses após o tratamento, a mulher entrou em remissão completa, continuando a sua condição a melhorar seis meses mais tarde. Os dois homens também registaram melhorias significativas, incluindo a inversão dos danos nos tecidos e uma diminuição dos níveis de autoanticorpos, lê-se no artigo publicado pela revista Nature.
Notavelmente, nenhum dos doentes sofreu efeitos secundários graves, como a síndrome de libertação de citocinas, que é comum em doentes com cancro que recebem a terapia CAR T. No entanto, os investigadores continuam a monitorizar se o sistema imunitário do organismo rejeitará as células dadoras a longo prazo.
Se for bem sucedida, esta abordagem poderá revolucionar o tratamento das doenças autoimunes, que afetam milhões de pessoas em todo o mundo.