Três em cada quatro hospitais com “problema grave” de rutura de medicamentos

O Índex Nacional do Acesso ao Medicamento Hospitalar, promovido pela Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH), revelou que 27% das unidades dizem que a rutura de medicamentos afeta essencialmente os genéricos, avançou a agência Lusa.

De acordo com este estudo, que recolheu dados dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) em Portugal continental, em 73% das instituições ocorrem regularmente ruturas de ‘stock’: 32% são afetadas por ruturas mensais, outras 23% por ruturas semanais e 18% por ruturas diárias.

Os dados recolhidos indicam que 86% das instituições têm um departamento, núcleo ou pessoa responsável por solucionar os problemas relacionados com as ruturas, mas só em 27% é avaliado o seu impacto.

“De facto, tem havido alguma melhoria nas ruturas maiores, mas continuam a existir e continuam a ter impacto no trabalho dos hospitais”, reconheceu Xavier Barreto, presidente da APAH, que destacou igualmente o facto de os hospitais continuarem a não recolher informação sobre o custo e efetividade das terapêuticas e qual o valor que acrescentam aos doentes em termos de qualidade de vida.

Apenas um em cada quatro disseram fazer uma “gestão de dados relativamente à utilização dos medicamentos em contexto de vida real” e acrescentaram que, sistematicamente, são sobretudo recolhidos dados de eficácia e segurança clínica.

A maioria dos hospitais que responderam confesou que não faz comparações efetivas entre terapêuticas, em contexto de doentes em tratamento na instituição. Apenas 18% disse fazer uma recolha sistemática de dados sobre a qualidade de vida dos doentes que tomam determinado medicamento.

“Continuamos a não ter uma noção clara do valor que cada fármaco acrescenta em termos da terapêutica. Este é um problema grave e também tem um impacto financeiro”, indicou Xavier Barreto.

“Geralmente, um fabricante propõe-nos a utilização de um determinado medicamento com uma expectativa de resultados (…) e tudo isto tem de ser confirmado na vida real, com doentes reais, e, não se confirmando esta expetativa que nos foi criada, o que seria expetável era que retroagíssemos em termos de preço”, disse ainda.

São os chamados acordos de partilha de risco: “Fazemos um acordo com o fornecedor baseado numa expectativa de resultado e depois acertamos o preço a pagar em função do resultado real que obtivemos com os nossos doentes”, explicou.

Neste caso, acrescentou, “se não recolhemos informação sobre, de facto, qual é a consequência destas terapêuticas, é impossível implementarmos estes acordos de partilha de risco”. “Este é um problema grave que infelizmente não tem tido evoluções significativas nos últimos anos”, insistiu.

Para que esta recolha de dados possa acontecer, Xavier Barreto indicou que são necessárias ferramentas para o fazer e recursos humanos para poder trabalhar depois a informação recolhida.

“Estas áreas obrigam a ter, por exemplo, profissionais de tecnologias de informação, epidemiologistas que recolham esta informação e que a tratem (…). E esses profissionais não abundam nos hospitais”, notou.

Apontou ainda a “falta de incentivo” nesta área aos hospitais, que “são pagos pela sua produção, por indicadores de qualidade e eficiência”.

“Os contratos-programa dos hospitais (…) não têm uma verba específica ou não premeiam os hospitais que recolhem este tipo de informação junto dos doentes e que depois incorporam isto nos seus processos de cuidados”, exemplificou.

O administrador hospitalar apontou que esta situação pode gerar desperdício, sublinhando: “Se estamos a utilizar fármacos que porventura não têm o efeito que nós esperamos que tivessem (…) estamos a desperdiçar dinheiro”.

“O que faria sentido era optar por outras linhas terapêuticas, por outros fármacos, que fossem mais ao encontro do resultado que nós esperaríamos. E, nesse sentido, é um desperdício”, assinalou.

O relatório, que é esta sexta-feira apresentado no Fórum do Medicamento, teve a coordenação científica da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa e o apoio da Ordem dos Farmacêuticos e da Associação Portuguesa de Farmacêuticos Hospitalares.

Lusa //

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