Morreu o “Índio do Buraco”. Era o último da sua tribo na Amazónia

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Funai - Fundação Nacional do Índio

O “Índio do Buraco”, o último membro da sua tribo

O “Índio do Buraco”, como era conhecido um misterioso homem indígena que, para se proteger de invasões territoriais e outras ameaças, passou várias décadas a viver uma vida de isolamento na floresta da Amazónia, foi encontrado morto na última terça-feira pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

Acredita-se que era o último membro da sua tribo, acerca da qual não se conhecem muitos detalhes, que agora terá deixado de existir. Recebeu a alcunha porque todas as palhotas que construiu e onde viveu tinham no interior um buraco. Era um hábil criador de armadilhas, que preparava para impedir a aproximação de estranhos.

“Ele não confiava em ninguém porque teve muitas experiências traumatizantes com pessoas não indígenas”, explicou ao Guardian Marcelo dos Santos, da Funai, organismo do Governo federal brasileiro que é responsável sobretudo pela demarcação de terras para os povos originários.

Segundo Marcelo dos Santos, a Funai passou mais de 25 anos a monitorizar o bem-estar do “Índio do Buraco” à distância. Quando a fundação deixava, em locais estratégicos da floresta amazónica, comida e ferramentas que pudessem ser usadas pelo indígena, as “prendas” nunca eram recolhidas.

De acordo com o jornal britânico, na década de 1980, a tribo do “Índio do Buraco” terá sido enganada por um grupo de fazendeiros, que, depois de terem deixado oferendas de açúcar em vários pontos do território ocupado pela tribo, terão dado veneno para ratos, que terá levado à morte de todos os membros, exceto um.

O homem terá rejeitado interações com “pessoas de fora” devido aos “massacres atrozes” e invasões que terá testemunhado, disse ao Guardian Sarah Shenker, da Survival International, organização que visa defender os direitos dos povos indígenas.

A Funai explicou, num comunicado, que o corpo do “Índio do Buraco” foi encontrado na sua rede de dormir. “Não havia vestígios da presença de pessoas no local. Também não havia sinais de violência ou luta. Os pertences, utensílios e objetos utilizados habitualmente pelo indígena permaneciam nos seus devidos lugares”.

“A Funai lamenta profundamente a perda do indígena e informa que, ao que tudo indica, a morte deveu-se a causas naturais”, lê-se na nota do organismo do Governo federal brasileiro enviada à imprensa. O corpo foi encontrado em estado de decomposição, enquanto a Funai fazia uma das suas ações de monitorização remota.

O indígena terá sido encontrado com penas coloridas espalhadas pelo seu corpo, o que terá levado funcionários da Funai a acreditar que ele sabia que a morte estava próxima. A entidade estima que o indígena tinha à volta de 60 anos.

“Por resistir a quaisquer tentativas de contacto, o homem indígena morreu sem revelar nem a que etnia pertencia, nem as motivações por detrás dos buracos que escavava. O “Índio do Buraco” expressava claramente a sua opção pelo afastamento, sem nunca dizer uma única palavra que permitisse a sua identificação com alguma língua indígena conhecida”, escreveu, após a morte, o Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contacto.

“A morte do “Índio do Buraco” significa, por um lado, mais um capítulo trágico do persistente processo de genocídio que historicamente aflige os povos indígenas e, por outro, o seu derradeiro e mais extremo ato de resistência”, acrescentou o OPI.

De acordo com o Folha de São Paulo, o indígena “sobrevivia de modo rudimentar”, comendo milho, batata, cará (um tubérculo), banana e mamão e animais que caçava. Em 2018, a Funai divulgou imagens inéditas, recolhidas à distância, que mostram o homem indígena a tentar cortar uma árvore.

Também era conhecido como “Índio Tanaru”, pois vivia na Terra Indígena Tanaru, no estado brasileiro de Rondónia. A Terra Indígena Tanaru foi estabelecida formalmente em 1997, dois anos após terem sido descobertos vestígios do massacre que vitimou a tribo do “Índio do Buraco”.

A palhota onde foi encontrado morto foi a 53.ª que construiu desde que a Funai monitorizava o seu bem-estar. “O “Índio do Buraco” foi o último da sua tribo, pelo que esta é mais uma tribo extinta. Não desapareceu, como alguns dizem. Estamos a falar de algo muito mais genocida do que desaparecer”, referiu Sarah Shenker.

ZAP //

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1 Comment

  1. Se se analisa o ADN de fósseis com milhares de anos, qual a dificuldade de analisar o ADN deste indivíduo para tentar identificar a sua etnia e outros dados antropomórficos?

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