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A curvatura do espaço-tempo vai ajudar o WFIRST a encontrar exoplanetas

Centro de Voo Espacial Goddard da NASA

Impressão de artista do WFIRST

O WFIRST (Wide Field Infrared Survey Telescope) da NASA irá procurar planetas para lá do nosso Sistema Solar na direção do centro da nossa Galáxia, a Via Láctea, onde estão a maioria das estrelas. O estudo das propriedades dos mundos exoplanetários ajudar-nos-á a entender o aspeto dos sistemas planetários por toda a Galáxia e como se formam e evoluem.

A combinação das descobertas do WFIRST com os resultados das missões Kepler e TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA vai dar por concluído o primeiro censo planetário sensível a uma ampla gama de massas e órbitas planetárias, aproximando-nos da descoberta de mundos habitáveis parecidos com a Terra, além do nosso próprio planeta.

Até à data, os astrónomos encontraram a maioria dos planetas quando passam em frente da sua estrela hospedeira em eventos chamados trânsitos, que diminuem temporariamente a luz da estrela. Os dados do WFIRST também podem detetar trânsitos, mas a missão irá observar principalmente o efeito oposto – pequenos picos de brilho produzido por um fenómeno de curvatura da luz chamado microlente. Estes eventos são muito menos comuns do que os trânsitos, porque dependem do alinhamento casual de duas estrelas amplamente separadas e sem relação à deriva no espaço.

“Os sinais de microlentes de pequenos planetas são raros e breves, mas são mais fortes do que os sinais de outros métodos,” disse David Bennett, que lidera o grupo de microlentes gravitacionais no Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, no estado norte-americano de Maryland. “Tendo em conta que é um evento em um milhão, a chave para o WFIRST encontrar planetas de baixa massa é pesquisar centenas de milhões de estrelas.”

Além disso, as microlentes são mais eficazes a encontrar planetas dentro e para lá da zona habitável – as distâncias em que os planetas podem ter água líquida à superfície.

Introdução às microlentes

Este efeito ocorre quando a luz passa perto de um objeto massivo. Qualquer coisa com massa distorce o tecido do espaço-tempo, como uma bola de bowling quando colocada num trampolim. A luz viaja numa linha reta, mas se o espaço-tempo for curvado – o que acontece próximo de algo massivo, como uma estrela – a luz segue a curva.

Sempre que duas estrelas se alinham a partir da nossa perspetiva, a luz da estrela mais distante é curvada à medida que se desloca pelo espaço-tempo curvo da estrela mais próxima. Este fenómeno, uma das previsões da teoria geral da relatividade de Einstein, foi confirmado pelo físico britânico Sir Arthur Eddington durante um eclipse solar total em 1919. Se o alinhamento for especialmente íntimo, a estrela mais próxima age como uma lente cósmica natural, focando e intensificando a luz da estrela de fundo.

Os planetas que orbitam a estrela no plano da frente também podem modificar a luz que passa pela lente, agindo como as suas próprias lentes gravitacionais minúsculas. A distorção que criam permite que os astrónomos meçam a massa e distância do planeta em relação à sua estrela hospedeira. É assim que o WFIRST irá usar microlentes para descobrir novos mundos.

Mundos familiares e exóticos

“Tentar interpretar populações planetárias hoje em dia é como tentar interpretar uma imagem com uma metade tapada,” disse Matthew Penny, professor assistente de física e astronomia da Universidade Estatal do Louisiana em Baton Rouge, EUA, que liderou um estudo para prever as capacidades de pesquisa de microlentes do WFIRST.

“Para entender completamente a formação dos sistemas planetários, precisamos encontrar planetas de todas as massas a todas as distâncias. Nenhuma técnica pode fazer isso, mas o levantamento de microlentes do WFIRST, em combinação com os resultados do Kepler e do TESS, revelará muito mais da imagem.”

Até à data foram confirmados mais de 4000 exoplanetas, mas apenas 86 foram descobertos através de microlentes. As técnicas usadas frequentemente para encontrar outros mundos são direcionadas a planetas que tendem a ser muito diferentes daqueles do nosso Sistema Solar. O método de trânsito, por exemplo, é melhor para encontrar planetas do tipo sub-Neptuno que têm órbitas muito mais pequenas do que Mercúrio. Para um sistema planetário como o nosso, os estudos de trânsito podem perder todos os planetas.

O levantamento de microlentes do WFIRST vai ajudar a encontrar análogos de todos os planetas do nosso Sistema Solar à exceção de Mercúrio, cuja baixa massa e órbita pequena se combinam para o colocar fora do alcance da missão. O WFIRST vai encontrar planetas que têm a massa da Terra e ainda mais pequenos – talvez até luas grandes, como a lua de Júpiter, Ganimedes.

O WFIRST também conseguirá encontrar planetas pertencentes a outras categorias pouco estudadas. As microlentes são mais adequadas para encontrar mundos a partir da zona habitável para fora. Isto inclui gigantes gelados, como Úrano e Neptuno do nosso Sistema Solar, e até planetas flutuantes – mundos que vagueiam livremente pela Galáxia, sem ligação a qualquer estrela.

Embora os gigantes de gelo sejam uma minoria no nosso Sistema Solar, um estudo de 2016 indicou que podem ser o tipo planetário mais comum da Galáxia. O WFIRST irá colocar essa teoria à prova e irá ajudar-nos a melhor entender quais as características planetárias mais prevalentes.

O WFIRST vai explorar regiões da Galáxia que ainda não foram sistematicamente examinadas em busca de exoplanetas devido aos diferentes objetivos das missões anteriores. O Kepler, por exemplo, investigou uma região de tamanho modesto com aproximadamente 100 graus quadrados com 100.000 estrelas a distâncias típicas de mais ou menos 1000 anos-luz. O TESS varre o céu inteiro e rastreia 200.000 estrelas, no entanto as suas distâncias típicas rondam os 100 anos-luz.

O WFIRST irá investigar aproximadamente 3 graus quadrados, mas seguirá 200 milhões de estrelas a distâncias de aproximadamente 10.000 anos-luz.

Dado que o WFIRST é um telescópio infravermelho, conseguirá ver através das nuvens de poeira que impedem outros telescópios de estudar planetas na região central e movimentada da nossa Galáxia. A maioria das observações terrestres de microlentes, até ao momento, têm sido no visível, tornando o centro da Via Láctea um território largamente inexplorado. Um levantamento de microlentes, realizado desde 2015 e usando o UKIRT (United Kingdom Infrared Telescope) no Hawaii, está a pavimentar o caminho para o censo exoplanetário do WFIRST, mapeando a região.

O levantamento UKIRT está a fornecer as primeiras medições da taxa de eventos de microlentes na direção do núcleo da Galáxia, onde as estrelas estão mais densamente concentradas. Os resultados vão ajudar os astrónomos a selecionar a estratégia de observação final para o esforço de microlentes do WFIRST.

O objetivo mais recente da equipa do UKIRT é detetar eventos de microlentes usando aprendizagem de máquina, que será vital para o WFIRST. A missão vai produzir uma quantidade tão grande de dados que não seria prático visualizá-los apenas a olho. O aperfeiçoamento da procura exigirá processos automatizados.

Os resultados adicionais do UKIRT apontam para uma estratégia de observação que revelará o maior número possível de eventos de microlentes, evitando as nuvens mais espessas de poeira que podem bloquear até a luz infravermelha.

“O nosso levantamento atual com o UKIRT está a criar as bases para que o WFIRST possa implementar o primeiro levantamento espacial dedicado às microlentes,” disse Savannah Jacklin, astrónoma da Universidade de Vanderbilt em Nashville, Tennessee, EUA, que liderou vários estudos do UKIRT. “As missões exoplanetárias anteriores expandiram o nosso conhecimento dos sistemas planetários e o WFIRST dará um passo gigante para entender melhor como os planetas – particularmente aqueles dentro da zona habitável das suas estrelas hospedeiras – se formam e evoluem.”

De anãs castanhas a buracos negros

A mesma pesquisa de microlentes que irá revelar milhares de planetas também irá detetar centenas de outros objetos cósmicos bizarros e interessantes. Os cientistas serão capazes de estudar corpos flutuantes com massas que variam entre a de Marte e 100 vezes a do Sol.

O limite inferior deste intervalo de massas inclui planetas expelidos das suas estrelas hospedeiras e que agora vagueiam a Galáxia como planetas flutuantes ou fugitivos. A seguir, estão as anãs castanhas, demasiado grandes para serem caracterizadas como planetas, mas não suficientemente massivas para se tornarem estrelas. As anãs castanhas não brilham visivelmente como estrelas, mas o WFIRST será capaz de as estudar no infravermelho através do calor que resta da sua formação.

Os objetos na extremidade superior incluem “cadáveres” estelares – estrelas de neutrões e buracos negros – deixados para trás quando as estrelas massivas esgotam o seu combustível. O estudo e a medição das suas massas vão ajudar os cientistas a compreender mais sobre a morte das estrelas, ao mesmo tempo que fornecem um censo dos buracos negros de massa estelar.

“O levantamento de microlentes do WFIRST avançará não apenas a nossa compreensão dos sistemas planetários,” disse Penny, “como também permitirá toda uma série de outros estudos sobre a variabilidade de 200 milhões de estrelas, a estrutura e a formação da Via Láctea interior e a população de buracos negros e outros objetos escuros e compactos que são difíceis ou impossíveis de estudar de qualquer outra maneira.”

Infelizmente, o orçamento deste ano da NASA apenas tem fundos para o desenvolvimento do WFIRST até setembro de 2020. O orçamento de 2021 propõe a interrupção do financiamento da missão WFIRST e um maior foco na conclusão do Telescópio Espacial James Webb, agora com lançamento planeado para março de 2021.

A administração da agência espacial não está pronta para prosseguir com outro telescópio extremamente caro até que o Webb seja lançado com sucesso.

// CCVAlg

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