Antes da fundação de Israel em 1948, os sionistas discutiram várias propostas para a criação de uma nação segura para os judeus, incluindo na África Ocidental.
No meio de um conflito sangrento motivado por uma disputa de território, é difícil de imaginar que o Estado judaico alguma vez pudesse não ter sido criado na região da Palestina. Mas a verdade é que o Médio Oriente não foi a única opção na lista de possíveis destinos para uma nação para os judeus.
Theodor Herzl, conhecido como o pai do sionismo — o movimento que defende a existência de um Estado-nação para os judeus — começou a sua missão pedindo apoio às grandes potências coloniais nos finais do século XIX, sendo a Inglaterra o seu principal alvo.
Em 1903, Herzl encontrou-se com Joseph Chamberlain, o Secretário das Colónias Britânicas, para discutir a criação de uma comunidade judaica na África Oriental. A discussão acabou por dar frutos, com os ingleses a oferecerem 13 mil quilómetros quadrados aos judeus na Escarpa de Mau, que hoje em dia fica no Quénia, num acordo conhecido como o Plano do Uganda.
Os britânicos viam a região como um bom destino para proteger os judeus da perseguição que estavam a sofrer na Europa de Leste, especialmente na ressaca do sangrento pogrom de Quixineve.
Mas as motivações do Império Britânico não eram puramente altruístas, já que desviar os judeus para África também ajudaria a controlar o grande fluxo de refugiados que estava a ameaçar os empregos dos britânicos. A grande linha férrea que os ingleses construíram na África Oriental estava a dar prejuízo, pelo que a chegada de sionistas ricos poderia ser útil para o desenvolvimento da colónia e para colmatar o enorme rombo nas contas públicas causado pela obra.
Desta feita, com o apoio dos britânicos no bolso, Herzl tinha agora que convencer os seus camaradas sionistas a concordar com o plano. E foi isso mesmo que ele tentou fazer a 26 de Agosto de 1903, durante o Sexto Congresso Sionista Mundial, em Basileia, na Suíça. Herzl apresentou o Plano do Uganda a outros rostos influentes do sionismo, que votaram a votar do envio de uma comissão de investigação para analisar o território em causa.
A comissão concluiu que o clima temperado da região era adequado para quem vinha da Europa, no entanto, a presença de leões e outros animais perigosos foi apontada como uma desvantagem.
Os colonos brancos também se opuseram à ideia e criaram o Comité Anti-Imigração Sionista, defendendo que os britânicos pobres mereciam mais o território do que os judeus e levantando questões sobre como os Maasai e outros povos nativos negros reagiriam à chegada dos sionistas.
No entanto, três dias depois do Congresso, o Governo britânico divulgou um documento oficial onde alocou um “território judaico” na África Oriental “em condições que permitirão aos membros observar os seus costumes nacionais”, cita o Jewish Virtual Library.
Mas a proposta estava longe de ser consensual e causou um grande frenesim na reunião do Congresso, com relatos de insultos, agressões, membros a chorar e até um desmaio de um jovem estudante.
E apesar de Herzl ter argumentado que este programa não comprometeria o objectivo da criação do Estado na Palestina — uma região com ligações bíblicas aos judeus — muitos sionistas não ficaram convencidos. A forte oposição chocou o pai do movimento, dada a violência a que os judeus estavam a ser sujeitos na Europa. “Estas pessoas têm uma corda em torno do pescoço, mas recusam na mesma”, terá comentado Herzl.
A proposta acabou por ser rejeitada definitivamente no Sétimo Congresso Sionista, em 1905.
Outros destinos estudados
O Plano do Uganda não foi a única opção estudada. Inicialmente, Herzl propôs um plano a Chamberlain para a criação de um colonato judaico no Chipre, na península do Sinai, ou em El Arish, ambos no Egipto. No entanto, Chamberlain considerou a proposta de Herzl impraticável, uma vez que estes territórios eram habitados ou não estavam sob controle britânico.
Marrocos também esteve em cima da mesa. De acordo com um documento secreto conhecido em 2020, Herzl queria criar uma comunidade judaica em Wadi al-Hisan, no sudoeste do Marrocos.
“Havia uma grande concentração de judeus ali, seja em Marrocos ou Norte da África, em geral. É preciso saber que Herzl era um homem muito pragmático. Ele viu um problema com os judeus perseguidos por violência, sobretudo na Europa Oriental, e viu que o Marrocos tinha uma comunidade judaica próspera”, explicou Yaakov Hagoel, presidente da Organização Sionista Mundial, ao jornal israelita Yedioth Ahronoth.
Em 1820, num precursor do sionismo moderno, Mordecai Manuel Noah tentou fundar uma pátria judaica em Grand Island, no rio Niágara, nos Estados Unidos. A cidade seria chamada Ararat, em homenagem ao Monte Ararat, o local de descanso bíblico da Arca de Noé. Noah apelou ao Governo norte-americano para o ajudar no seu esforço, mas a ideia acabou por não ganhar tracção.
O Oblast Autónomo Judaico, fundado em 1934, nasceu como resultado da política nacionalista de Estaline e permitiu que a população judaica fosse responsável pela gestão do território, de forma a poderem preservar as suas tradições culturais na sociedade soviética.
O artigo 65 da Constituição da Rússia explicita que o Oblast Autónomo Judaico é o único oblast autónomo do país, fazendo dele um dos dois territórios do mundo oficialmente judeus, sendo o outro Israel. Apesar do nome e do simbolismo, actualmente, apenas 0,2% dos seus 176 558 habitantes practica o Judaísmo.
Os nazis também tiveram uma proposta para deportar a população judaica da Europa para Madagáscar, que na altura era uma colónia francesa. Concebido nos anos finais da década de 1930, o plano foi discutido pelo Governo de Hitler e foi visto como uma solução “final” para o suposto “problema judaico”.
O plano envolvia a confiscação de propriedades judaicas na Europa, que seriam usadas para financiar a deportação. Uma vez em Madagáscar, os judeus seriam mantidos sob um regime de ocupação rigorosa e isolados do resto do mundo.
No entanto, o Plano de Madagáscar nunca foi implementado. Com o início da Segunda Guerra Mundial e a subsequente derrota da França em 1940, a execução do plano tornou-se logisticamente inviável. Com o avanço da guerra, os nazis optaram por alternativas mais violentas para resolver o chamado “problema judaico”, culminando no envio de milhões de pessoas para campos de concentração e no extermínio sistemático de mais de seis milhões no Holocausto.
Estas foram apenas algumas das opções abordadas para a criação de grandes comunidades ou de um Estado judaico, existingo ainda outras propostas em zonas do mundo tão diversas como a Crimeia, o Alasca ou a Guiana Britânica.
No final de contas, o Estado de Israel acabou mesmo por se concretizar, com a Organização das Nações Unidas a reconhecer a sua fundação em 1948.