Walking with Dinosaurs / BBC Studios

O paquirinossauro tinha cornos de estilo unicórnio, como mostra esta imagem gerada por computador
Enterrados no Canadá, nas florestas de Alberta, encontramos um dos mais densos depósitos de ossos de dinossauros alguma vez analisados. O local apresenta uma ossada com um total de 10 mil Paquirinossauros.
Quando pensamos em fósseis de dinossauros, vem-nos à cabeça a imagem de desertos áridos ou terras áridas queimadas pelo Sol.
Contudo, um dos cemitérios de dinossauros mais ricos do mundo está enterrado num cenário menos provável: uma zona tranquila de floresta no norte de Alberta, no Canadá.
Designado como o leito ósseo de Pipestone Creek, acomoda dezenas de milhares de ossos, todos eles pertencendo a uma única espécie de dinossauro com chifres de aspeto incomum, chamado Paquirinossauro (Pachyrhinosaurus).
Num novo episódio da histórica série “Walking With Dinosaurs“, que regressa aos ecrãs depois de mais de duas décadas de ausência, a BBC explora este local misterioso, e tenta entender por que motivo ali encontramos tantos ossos de dinossauro.
A BBC Science Focus falou com a Emily Bamforth, paleontóloga e curadora no Museu dos Dinossauros Philip J Currie, em Alberta, no Canadá.
A série explora a sua investigação sobre o Paquirinossauro, na qual a paleontóloga usa tecnologia de ponta para descobrir o que aconteceu a um rebanho que terá sido exterminado devido a um evento catastrófico.
O dinossauro com bossa frontal
O paquirinossauro ainda não é muito conhecido, mas foi o principal dinossauro e um dos membros mais distintos da família dos ceratopsídeos, que inclui o seu primo mais famoso, o Triceratops.
“São primos mais pequenos e mais velhos”, diz Bamforth. “Mas, em vez de terem um chifre no nariz, como os Triceratops, tinham uma enorme massa óssea a que chamamos ‘bossa frontal‘. São os únicos dinossauros com chifres que a têm.”
Até agora, foi possível identificar três espécies diferentes de Pachyrhinosaurus: canadensis, perotorum e lakustai — todas elas costumavam habitar em latitudes do norte, locais como o Alasca e o Canadá.
Estes dinossauros chegavam até aos 6 metros de comprimento e pesavam cerca de três toneladas. Migravam habitualmente em enormes “megarebanhos” com milhares de indivíduos. Bamforth compara este comportamento às migrações modernas de renas, só que a uma escala muito maior.
O local fóssil que deixaram é impressionante. “Há mais de 10.000 indivíduos preservados aqui. É um dos depósitos ósseos mais densos da América do Norte, com 100 a 300 ossos por m2, e estende-se colina dentro por pelo menos 1 km2. É um depósito ósseo muito, muito grande e isso torna-o indubitavelmente significativo”, diz a palentóloga.
O mistério enterrado na lama
“A história desta manada específica de Paquirinossauros é, em última análise, trágica” afirma Bamforth.
Afinal como é que um rebanho enorme desta espécie de dinossauros poderia ter sido extinta quase como que com um simples estalar de dedos?
“Sabemos que todos morreram ao mesmo tempo em algum tipo de evento catastrófico, e sabemos que o que quer que os tenha matado exterminou quase todos os membros do rebanho indiscriminadamente – grandes, pequenos, velhos e novos.” comenta a investigadora.
“Se por acaso estava a pensar na razão mais conhecida, como o impacto do asteroide que exterminou os dinossauros, isso está completamente errado, uma vez que a extinção em massa ocorreu há cerca de 72 milhões de anos, muito antes do impacto”, nota Bamforth.
A paleontóloga indica-nos a principal hipótese: “Pensamos que terá sido uma inundação catastrófica, possivelmente devido às chuvas das monções nas montanhas próximas, ou mesmo a uma tempestade semelhante a um furacão que atingiu o interior. Teria sido semelhante às inundações repentinas que ocorrem hoje, mas numa escala massiva“.
O súbito enterro preservou de forma notável o rebanho, incluindo indivíduos de todas as idades, um momento captado com extremo detalhe. O resultado final foi desastroso para os dinossauros, mas uma “dádiva” científica.
Bom, se calhar, não só para os paleontólogos, diz Bamforth: “Há evidências de que o Albertosaurus, uma espécie de T-Rex mais pequeno e mais rápido, e dinossauros mais pequenos, semelhantes a velociraptores, aproveitaram a carne das carcaças, foi como um banquete”.
Lições do leito ósseo de Pipestone Creek
É raro encontrar um esqueleto de dinossauro. Agora, encontrar imensos deles num só local? É algo quase nunca visto. Esta oportunidade está a dar aos cientistas a possibilidade de colocar questões que nunca antes foram postas em cima da mesa.
Bamforth diz que “quando estudamos os dinossauros, encontramos um ou dois, com sorte, talvez haja uma dúzia”, mas graças ao enorme volume de fósseis provenientes da manada de Pipestone Creek, é possível estudar o que é conhecido como uma variação intraespecífica: diferenças naturais entre indivíduos de uma só espécie.
Tal como não há duas pessoas iguais no mundo, todos os Paquirinossauros apresentam variações no seu tamanho, ornamentação e comportamento. Bamforth e a sua equipa estão especialmente interessados nos folhos que circulam os seus crânios, estruturas que apresentam uma diferença subtil de um para o outro.
“Estamos a começar a compreender que quase todos os Paquirinossauros tinham um folho ligeiramente diferente. Pensamos que talvez isso os tenha ajudado a reconhecerem-se no rebanho”, explicou a paleontóloga.
As saliências ósseas nos seus narizes também apresentam uma variação significativa, e os cientistas estão ainda a investigar qual seria o ser propósito: combater, atrair parceiros, reconhecer outros indivíduos ou uma mistura dos três.
Desde que a série “Walking With Dinosaurs” foi inicialmente transmitida, em 1999, a paleontologia passou por uma mudança drástica. Bamforth explica que “o foco costumava ser apenas encontrar dinossauros e descrevê-los. Agora há mais ênfase na compreensão da relação deles com o mundo em que viviam”.
Essa mudança não só foi impulsionada por avanços tecnológicos, mas também, pelo fascínio do público: “os dinossauros são mais populares agora do que nunca e, por isso, o campo da paleontologia está a evoluir a um ritmo tremendo”.
Se há algo que podemos aprender com Pipestone Creek, é que os dinossauros ainda escondem muitos segredos, mesmo após 72 milhões de anos.