Por que as pessoas gostam tanto de sentir medo?

Warner Brothers

“The Conjuring 2”, James Wan, 2016

É paradoxal que, em algumas circunstâncias, gostemos de ter medo. Um filme de terror que nos deixa de cabelos em pé pode ser divertido quando termina bem ou percebemos que se trata de ficção. Ficamos aliviados e o medo dá lugar à alegria, ou seja, o prazer de desfrutar de algo que inicialmente nos assustou.

O paradoxo é que, por definição, o medo é um processo emocional que nos avisa de uma ameaça, de algo que coloca em risco a nossa integridade física ou mental. Portanto, a experiência deveria ser tudo menos divertida, notou a BBC News Brasil.

Para compreender esse fenómeno, devemos começar por entender as emoções como um sistema de alarme que nos diz que algo importante está a acontecer. Algo relevante por ser bom ou por ameaçar-nos de alguma forma.

Existem, portanto, dois tipos de emoções. Temos as positivas, que nos agradam, que queremos que se repitam e que nos levam a aproximar daquilo que gerou a emoção. Gostamos de estar com as pessoas que nos amam e fazemos o que podemos para ficar com elas o maior tempo possível.

Em segundo lugar, existem emoções negativas, que são desagradáveis. Não queremos que se repitam e levam-nos a afastar o mais possível do que causou essa emoção. Não gostamos de estar ao lado de uma pessoa violenta ou que nos causa repulsa.

Como um bom sistema de alarme, as emoções devem estar ativas pelo menor tempo possível: se durarem mais do que o estritamente necessário, tornam-se um problema. Elas têm que notificar-nos da situação e desligar o mais rápido possível.

Para conseguir isso, emoções positivas e negativas regulam-se umas às outras. Ou seja, depois da alegria de reencontrar um amigo que não víamos há muito, quando nos separamos ficamos com a tristeza de não saber quanto tempo levará para nos encontrarmos novamente.

A emoção positiva é substituída pela negativa, que desativa a anterior e nos permite retornar rapidamente a uma situação emocionalmente neutra.

Da mesma forma, o medo que pode causar a presença de um cão de grande porte dissipa-se quando o dono aparece e coloca-lhe a coleira. O medo torna-se em alívio, produz uma emoção positiva que desativa o medo quando ele não é mais necessário.

Esse paradoxo que converte as emoções é tecnicamente designado por processo oponente. É o principal responsável pela regulação das emoções que conhecemos como primárias, ou seja, as que são produzidas por algo externo.

No entanto, esse fenómeno não funciona com as emoções secundárias, ou seja, aquelas que são produzidas por uma representação mental. A persistência da situação na nossa mente faz com que as emoções secundárias durem muito mais do que as primárias e o seu processo de regulação seja muito diferente.

É devido ao processo oponente que não temos tanto medo de andar em montanhas-russas depois de termos andado uma primeira vez. Para ser divertida, uma montanha-russa tem que ser muito assustadora por um período muito curto de tempo. Mas nas próximas vezes que andarmos, o susto dificilmente será maior.

Aprendemos com a primeira experiência a ter a expectativa de que sairemos ilesos da situação – o que significa que praticamente não sentiremos medo. E, ao mesmo tempo, a diversão do processo também será menor.

A relação é direta: quanto mais medo, mais divertido. E é por isso que gostamos de histórias e filmes de terror, de desportos radicais ou do Halloween. A intensidade da diversão (gerada pelo processo oponente) vem da intensidade da emoção fornecida pelo processo primário (o medo).

Há uma transferência de intensidade ou estímulo emocional da emoção primária – medo – para a secundária – alívio, alegria ou diversão. É a chamada transferência de estímulo: se uma pessoa teve uma emoção ativada num contexto de processo primário, e rapidamente se encontra num contexto diferente, isso provocará uma segunda emoção, que terá a intensidade da primeira.

ZAP //

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