A nossa memória pode ser dividida em duas: uma para o passado, outra para o futuro

Pela primeira vez, um estudo realizado em ratos permitiu distinguir o papel do hipocampo em duas funções da memória.

A região do nosso cérebro que alberga a memória é composta não por uma, mas por duas secções.

A conclusão advém de uma recente investigação, levada a cabo por cientistas da Universidade de Cornell, que permitiu separar o papel do hipocampo em duas funções da memória: uma que recorda associações entre tempo, lugar e o que se fez, e outra que permite prever ou planear ações futuras com base em experiências passadas.

Segundo o New Atlas, a descoberta tem implicações importantes no tratamento de problemas de memória e de aprendizagem associados a doenças como a demência e o Alzheimer.

Os investigadores chegaram a esta conclusão utilizando técnicas optogenéticas avançadas para desativar um tipo de memória, mantendo o outro.

“Descobrimos que dois códigos neuronais diferentes suportam estes aspetos muito importantes da memória e da cognição e que estes podem ser dissociados, como fizemos experimentalmente”, explicou Antonio Fernandez-Ruiz, professor de Neurobiologia e Comportamento na Faculdade de Artes e Ciências (A&S) de Cornell.

Enquanto um tipo de código controla a capacidade de fazer associações – como lembrar-se de que se vendem maçãs no supermercado da rua – o outro tipo é preditivo e envolve a capacidade de utilizar a memória de forma flexível para planear um novo comportamento em tempo real.

Se percorre sempre o mesmo caminho para esse supermercado, mas um dia a estrada está fechada, o mais certo é que utilize um “mapa interno” memorizado da sua rua para prever um novo caminho – e é assim que funciona este segundo tipo de código neuronal.

Até agora, a comunidade científica não sabia como é que o hipocampo suportava estas funções e se havia alguma relação entre as duas.

No estudo, os investigadores utilizaram elétrodos no cérebro de um rato para seguir a atividade de muitos neurónios em simultâneo, enquanto o animal se envolvia num comportamento. Depois, usaram a optogenética para controlar com grande precisão a atividade dos neurónios.

Durante a experiência, os investigadores injetaram um vírus no cérebro do rato, que infeta os neurónios para que expressem uma proteína artificial que pode ativar ou silenciar esses neurónios quando uma luz é emitida no interior do cérebro. Depois, ajustaram este método para perturbar seletivamente, mas não silenciar completamente, um conjunto de neurónios.

Desta forma, podiam afetar determinados neurónios sem alterar as propriedades gerais do cérebro.

Utilizando este método numa região do hipocampo relacionada com a aprendizagem de tarefas, os cientistas observaram que o rato era capaz de aprender um caminho dos pontos A a D que tinha uma recompensa no final, mas que a memória não se “fixava” devido à indução de disparos errados.

Repetindo a experiência depois de dormir, o rato conseguia lembrar-se dos pontos A e D, mas não do caminho que deveria utilizar para alcançar a recompensa.

“Essa sequência de passos é codificada no cérebro como uma sequência de células a disparar”, referiu Fernandez-Ruiz. “O motivo pelo qual nos lembramos disto no futuro é que, quando estamos a dormir, a mesma sequência de atividade é repetida, pelo que os mesmos neurónios que codificam [o caminho] disparam pela mesma ordem.”

No fundo, quando se está a dormir, os neurónios não conseguem disparar em sequência para solidificar a memória, pelo que, apesar de se lembrarem de dois pontos, não foi retida qualquer associação.

O artigo científico com as descobertas foi publicado a 20 de outubro na Science.

ZAP //

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