Dizem que o hábito faz o monge e a coroa, o rei. Mas na história da realeza britânica nem todos os monarcas tiveram a oportunidade de usar esta emblemática peça.
Desde o ano de 1066, cerca de 39 monarcas foram coroados como reis ou rainhas de Inglaterra, sempre na tradicional Abadia de Westminster.
Naquele ano, foi coroado Guilherme I, mais conhecido como Guilherme, o Conquistador, que deu início a uma tradição que teve o seu próximo capítulo hoje, data da cerimónia de coroação de Charles III.
No geral, é tradição que se aguarde algum tempo após a morte de um rei ou rainha antes da realização da cerimónia de coroação do sucessor. Com isso, nem todos os que serviram oficialmente como reis da Inglaterra tiveram o privilégio de serem formalmente coroados.
Os Príncipes da Torre
O século XV viu o Reino Unido mergulhar num dos mais sangrentos conflitos pelo poder real: a Guerra das Rosas.
Dentro dos inúmeros capítulos do confronto entre as casas de Lancaster e York pelo trono, um evento muito particular e cruel é sempre lembrado: o desaparecimento de um rei e do seu irmão pelas mãos do seu próprio tio.
O rei era Eduardo V. Segundo a BBC History, ele era o filho mais velho de Eduardo IV, que tinha conquistado uma das principais vitórias na Guerra das Rosas e, portanto, mantido a coroa britânica.
Eduardo IV morreu em junho de 1483 e o seu filho mais velho foi imediatamente proclamado rei com o nome de Eduardo V, com apenas 12 anos de idade.
A Inglaterra ainda não tinha alcançado a estabilidade política após o longo e custoso conflito interno. Por ser menor de idade, o tio do novo rei e irmão do recém-falecido, o duque de Gloucester, foi nomeado protetor do jovem soberano até à maioridade.
Porém, como aponta o historiador britânico Anthony James Pollard no seu livro Os Príncipes da Torre, o protetor começou a ter conflitos com os nobres da corte e três meses após a ascensão de Eduardo V decidiu organizar um golpe: ordenou a prisão dos nobres e levou Eduardo V e o seu irmão – e então herdeiro do trono – Ricardo e trancou-os na famosa Torre de Londres.
Traçou-se então um complô documentado no ato parlamentar de 26 de junho daquele ano: os deputadores aceitaram a denúncia do duque de Gloucester de que tanto Eduardo V quanto o seu irmão Ricardo eram filhos ilegítimos de Eduardo IV e, portanto, não tinham direito a herdar a coroa.
Tanto Eduardo V quanto o seu irmão Ricardo, então duque de York, nunca mais foram vistos com vida. Muitos historiadores acusam o duque de Gloucester de os ter assassinado, embora nunca tenham sido encontrados evidências ou documentos conclusivos para provar tal hipótese.
Dessa forma, Eduardo V nunca foi coroado. E até agora os seus restos mortais não foram identificados.
No mesmo ato parlamentar de 26 de junho de 1483, o duque de Gloucester foi proclamado o novo rei da Inglaterra. Ele adotou o nome de Ricardo III.
Eduardo VIII, o rei apaixonado
Quase 500 anos e dezenas de monarcas depois, outro rei também passou pela experiência de servir oficialmente sem nunca ter sido coroado.
A 20 de janeiro de 1936, aos 70 anos, George IV, rei da Inglaterra, que estava no trono há 26 anos, morreu em Sandringham House, uma das propriedades da famílias real em Norfolk, no sul da Inglaterra.
Ao mesmo tempo, o seu filho mais velho ascendeu ao mais alto cargo da monarquia britânica e adotou o nome de Eduardo VIII.
Mas houve um problema: nos anos que antecederam a morte do pai, o então príncipe Eduardo teve diversos romances, alguns com mulheres casadas.
Foi assim que ele se apaixonou pela americana Wallis Simpson, que na época em que oficializou seu namoro com o futuro rei ainda era legalmente casada com o seu ex-marido, Ernest Simpson.
No entanto, em outubro de 1936, nove meses após a ascensão de Eduardo VIII ao trono, Wallis concluiu o divórcio. A ideia era que ela pudesse casar-se com o monarca e tornar-se rainha da Inglaterra.
Foi então que os problemas começaram. No seu livro Primeiros-ministros britânicos de Balfour a Brown, o historiador Robert Pearce observa que tanto o então primeiro-ministro Stephen Baldwin quanto os líderes religiosos da época o aconselharam a não casar com uma mulher recém-divorciada.
Eles argumentaram que, como rei da Inglaterra, ele era o chefe da Igreja Anglicana, cujos seguidores teriam dificuldade em aceitar que o seu rei casasse com uma mulher divorciada.
Eduardo propôs várias alternativas, mas nenhuma convenceu os seus conselheiros e líderes religiosos. Depois de pouco mais de um mês de diálogo e tentativas de negociação, o próprio Eduardo VIII decidiu que iria abdicar se não pudesse casar com Simpson. Esse episódio concretizou-se a 11 de dezembro de 1936.
O seu irmão, o príncipe George – e pai da futura rainha Isabel II -, ascendeu ao trono. Eduardo VIII perdeu todos os seus privilégios como nobre, embora tenha sido nomeado duque de Windsor, e teve que se mudar para outro país.
Morreu em 1972 na sua residência no sul da França, onde morava com a esposa.
ZAP // BBC
E se se deixassem de contar “contos de fadas”?
Não abdicou, foi obrigado a fazê-lo. E não por amor. De ascendência alemã entendia passar as informações sensíveis do que se passava no Cabinet, à embaixada alemã.