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A gripe espanhola de há um século ensina-nos o preço de desistir das medidas sanitárias

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A maneira como o mundo lidou com a gripe espanhola de 1918 permite-nos retirar várias lições para os tempos de hoje, com a pandemia de covid-19.

Imagine os Estados Unidos a lutar para lidar com uma pandemia mortal: autoridades estatais e locais promulgam uma lista de medidas de distanciamento social, proibições de ajuntamentos, ordens de encerramento e uso obrigatório de máscara num esforço para conter a maré de casos e mortes.

A população responde com conformidade generalizada misturada com alguma relutância, recuo e até mesmo com desafio à autoridade. À medida que os dias se transformam em semanas, e em meses, as restrições tornam-se mais difíceis de tolerar.

Proprietários de teatros reclamam as suas perdas financeiras. O clero lamenta o encerramento de igrejas, enquanto escritórios, fábricas e, em alguns casos, até salões podem permanecer abertos. As autoridades discutem se as crianças estão mais seguras nas salas de aula ou em casa.

Muitos cidadãos recusam-se a usar máscaras em público, alguns queixam-se que se sentem desconfortáveis e outros argumentam que o Governo não tem o direito de infringir as suas liberdades civis.

Por mais familiar que possa parecer em 2021, estas são descrições reais dos Estados Unidos durante a mortal pandemia de gripe espanhola de 1918. A atual pandemia tem espelhado repetidamente a vivida há um século atrás.

À medida que a pandemia de covid-19 entra no seu segundo ano, muitas pessoas querem saber quando é que a vida voltará a ser como era antes. A História, é claro, não é um modelo exato para o que o futuro reserva, mas a maneira como os norte-americanos emergiram da pandemia anterior pode sugerir como será a vida pós-pandemia desta vez.

Cansados e fartos, prontos para o fim da pandemia

Como a covid-19, a gripe espanhola de 1918 atingiu forte e rapidamente, passando de um punhado de casos relatados em algumas cidades a um surto nacional em poucas semanas. Muitas comunidades emitiram várias ordens de encerramento – correspondendo às vagas das suas epidemias – na tentativa de manter a doença sob controlo.

Estas ordens de distanciamento social funcionaram para reduzir casos e mortes. No entanto, assim como hoje, costumam ser difíceis de manter. No final do outono, poucas semanas depois de as ordens de distanciamento social entrarem em vigor, a pandemia parecia estar a chegar ao fim à medida que o número de novas infeções diminuía.

As pessoas clamavam para voltar às suas vidas normais e as empresas pressionavam as autoridades para ter permissão para reabrir. Acreditando que a pandemia tinha acabado, as autoridades estatais e locais começaram a rescindir os decretos de saúde pública. A nação virou os seus esforços para enfrentar a devastação que a gripe tinha causado.

Para os amigos, famílias e colegas de trabalho das centenas de milhares de americanos que morreram, a vida pós-pandemia foi repleta de tristeza e pesar.

Nesta época em que não havia rede de segurança federal ou estadual, organizações de caridade forneceram recursos para famílias que tinham perdido o seu ganha-pão ou para acolher as incontáveis crianças que ficaram órfãs pela doença.

Para a grande maioria dos americanos, porém, a vida após a pandemia parecia ser uma corrida precipitada para a normalidade. Famintos por saídas à noite, eventos desportivos, serviços religiosos, interações em sala de aula e ajuntamentos familiares, muitos estavam ansiosos para retornar as suas velhas vidas.

Os americanos apressaram-se demasiado para regressar às suas rotinas pré-pandémicas – lotaram cinemas, salões de dança e lojas, e encontraram-se com amigos e familiares.

As autoridades alertaram a nação que os casos e mortes provavelmente continuariam durante meses. Mas o fardo da saúde pública, entretanto, já não recaía sobre a política, mas sim sobre a responsabilidade individual.

Previsivelmente, a pandemia avançou, estendendo-se até uma terceira vaga mortal que durou até à primavera de 1919, com uma quarta vaga a atingir o inverno de 1920. Alguns atribuíram o ressurgimento aos americanos descuidados. Outros minimizaram os novos casos ou voltaram a sua atenção para questões mais rotineiras de saúde pública, incluindo outras doenças, inspeções em restaurantes e saneamento.

Apesar da persistência da pandemia, a gripe rapidamente se tornou notícia do passado. Anteriormente presença regular nas primeiras páginas, a cobertura rapidamente se reduziu a pequenas notícias esporádicas enterradas nas costas dos jornais do país.

A nação seguiu em frente, acostumada aos números que a pandemia tinha causado e as mortes que ainda estavam por vir. Em grande parte, as pessoas não estavam dispostas a voltar às medidas de saúde pública social e economicamente prejudiciais.

Dadas as informações limitadas de que dispunham e as ferramentas à sua disposição, os americanos talvez tenham suportado as restrições de saúde pública pelo tempo que razoavelmente puderam.

Um século depois, e um ano após o início da pandemia de covid-19, é compreensível que as pessoas agora estejam muito ansiosas para voltar às suas velhas vidas.

O fim desta pandemia virá inevitavelmente, tal como aconteceu com todas as experiências anteriores da humanidade.

Se temos algo a aprender com a história da gripe espanhola de 1918, bem como a nossa experiência até agora com a covid-19, é que um regresso prematuro à vida pré-pandémica arrisca um aumento do número de casos e de mortes.

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12 Comments

    • Estás uns meses atrasado. Esses já vieram a publico admitir os erros que cometeram. Para quê continuar a bater na mesma tecla, lol ? A Suécia não fez nada de extraordinário. Ia era esbardalhando-se toda se não tivesse mudado de rumo.

      • Não concordo. É certo que a Suécia não sabe o que fez, praticamente não fez nada e continua a não fazer. Nunca mudou de rumo, são demasiado liberais.
        Só disseram algo porque sofreram muita pressão da Europa por não estarem a alinhar com os restantes.
        Mas ficou tudo infectado logo no início, morreram os que tinham a morrer e passaram o Inverno dentro do período de imunidade das infecções de Março a Maio.
        Mas agora a Europa ignora os resultados da Suécia porque contraria as razões que apresentam para estas medidas desmedidas.

  1. A gripe espanhola não tem nada a ver com isto. A gripe espanhola matava toda a gente indiscriminadamente. E não havia os cuidados de saúde que há hoje.
    Se tivessem reforçado os cuidados de saúde para suportarem melhor os internamentos, tinha sido muito mais barato do que terem parado o mundo.
    Mas vá-se lá dizer a estes governantes que têm de pagar mais a médicos e enfermeiros depois de anos a cortar salários.

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