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Estarão os manuais de linguagem corporal certos? Eis o que precisa de saber para ler nas entrelinhas

Os livros estão cheios de imagens estáticas da linguagem corporal de “comunicadores” eficazes. Essa é uma questão fundamental porque a linguagem corporal é dinâmica.

Frequentemente, o ato cruzar os braços sobre o peito está associado a alguém que em determinado momento se está a sentir na defensiva, ao passo que alguém que mexe no cabelo parece nervoso. Mas haverá alguma verdade nestes (e em outros) estereótipos da linguagem corporal?

Ler a linguagem corporal pode ser uma habilidade útil para entender como alguém se está a sentir ou a pensar. Mas é importante lembrar que não é uma ciência exata e pode haver variações culturais ou individuais na forma como as pessoas se expressam por meio da linguagem corporal. Por exemplo, o contato visual no Japão pode ser considerado um ato de agressão ou grosseria.

Na verdade, não se deve confiar em tudo que lê nos manuais de linguagem corporal. Por exemplo, num livro publicado em 1970, o autor Ray Birdwhistell afirmava que os humanos têm 20.000 expressões faciais diferentes. Mas no Definitive Book of Body Language publicado em 2004 e assinado por Allan e Barbara Pease, esse número aumentou repentinamente para 250.000.

Um quarto de milhão de expressões faciais diferentes – não é de admirar que seja preciso um manual sobre linguagem corporal para decodificá-las. Algumas pesquisas científicas mais recentes sugerem que o número real de expressões faciais está mais próximo de 21.

Existem livros de linguagem corporal que prometem sucesso em contextos diversos como sala de reuniões, no quarto, em bares e restaurantes. Esses livros populares têm dois objetivos principais (além de ganhar dinheiro) – eles explicam como “habilmente” ler a linguagem corporal, mas também como fingir para obter o máximo efeito.

Comportamentos dominantes

O Definitive Book of Body Language [Livro Definitivo da Linguagem Corporal, em tradução livre para português], por exemplo, anuncia que a exibição da virilha (pernas abertas, virilha ligeiramente projetada para a frente, mão na cintura) tende a ser usada por “homens machistas e durões”. É também um sinal sexual poderoso, dizem os autores e afirmam que funciona. “Esse gesto diz aos outros: ‘Eu sou viril – posso dominar’, e é por isso que é comum para os homens à espreita”.

Por todo o mundo, milhões de pessoas compram os livros e tentam recriar o comportamento. Os autores dizem que este é um gesto quase exclusivamente masculino “usado para intimidar os outros”.

Os livros estão cheios de imagens estáticas da linguagem corporal de “comunicadores” eficazes – e essa é uma questão fundamental porque a linguagem corporal é dinâmica: o corpo está em movimento. Você não pode ficar em uma exibição de virilha ou sentar na catapulta o dia todo.

Mas isso não quer dizer que a linguagem corporal não seja importante. O seu significado é imenso, embora não seja 12 vezes mais poderoso do que a comunicação verbal – como alguns afirmam.

No livro Rethinking Body Language, Geoff Beattie defende que, para ler a linguagem corporal com precisão, é preciso saber para onde olhar. Isto porque pode não haver 20.000 expressões faciais diferentes, mas o rosto ainda pode ser muito revelador de estados emocionais subjacentes. Mas só até que a pessoa comece a tentar controlá-los, por exemplo, mascarando as emoções com um sorriso.

Então, como se pode distinguir um sorriso falso de um sorriso genuíno? Um genuíno envolve os músculos ao redor dos olhos e desaparece lentamente do rosto.

Já um sorriso falso é capaz de abandonar o rosto abruptamente, como o psicólogo americano Paul Ekman mostrou nas suas experiencias pioneiras e que relacionavam as emoções e expressões faciais. Portanto, para descodificar as expressões faciais com mais precisão, é preciso concentrar-se no que está acontecendo quando o sorriso falso desaparece. Trata-se de um momento muito breve, mas pode ser revelador.

Outro problema com a natureza estática dos manuais de linguagem corporal é que a fala e a linguagem corporal estão intimamente conectadas, como argumentou o psicólogo americano e especialista em psicolinguística, David McNeill no seu livro de 2000, Language and Gesture.

Quando as pessoas falam, muitas vezes fazem movimentos de mão espontâneos e inconscientes que ilustram o conteúdo do que estão dizendo. Não há dicionário para esses movimentos, mas eles são gerados junto com a própria fala. A investigação de Geoff Beattie mostrou que os significados são expressos nesses movimentos – e quando as pessoas não conseguem ver esses gestos, perdem informações importantes.

Às vezes, o movimento gestual e a fala não coincidem. Um falante pode dizer “o meu e eu somos muito próximos”, mas suas mãos indicam uma lacuna significativa, em vez de proximidade. Outra pessoa diz “Eu tenho ambições muito altas”, mas caso a mão não suba muito ao exemplificar essa vontade, os interlocutores ficam desapontados.

O mesmo autor argumentou em Repensando a Linguagem Corporal que, em casos como esse, o gesto inconsciente costuma ser o indicador mais confiável do pensamento subjacente. Mas é preciso saber do que se está a falar para ler os movimentos gestuais.

É muito mais fácil mentir efetivamente na fala do que no gesto que a acompanha, porque esses movimentos têm tempos intrincados ligados à própria fala. O movimento da mão começa antes da fala e então a parte significativa do gesto coincide exatamente com a palavra relevante. É difícil coincidir esses tempos ao mentir. Mais uma vez, tudo está no movimento e no tempo – e na conexão íntima e inconsciente entre a fala e a linguagem corporal.

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