Emails internos revelam o que a Fox News realmente pensava da “fraude eleitoral” contra Trump

Gage Skidmore / Wikimedia

O apresentador da Fox News Tucker Carlson.

Mensagens divulgadas no âmbito de um processo aberto por uma empresa de máquinas de voto contra a Fox News revelam que os executivos da estação televisiva sabiam que as alegações de fraude feitas por Trump eram infundadas.

Um processo de difamação aberto pela empresa de máquinas de voto Dominion em 2021 contra a Fox News revelou várias mensagens comprometedoras trocadas pelos apresentadores e responsáveis do canal televisivo norte-americano.

Em causa estão alegações de que os canais de notícias de direita Fox News, Newsmax e OAN mancharam a credibilidade da Dominion ao propagarem a ideia de que a eleição presidencial de 2020 foi fraudulenta em favor de Joe Biden. A Dominion exige compensações no valor de 1,6 mil milhões de dólares.

As mensagens e emails, assim como testemunhos de executivos da Fox, mostram como o canal de notícias conservador respondeu às alegações de fraude eleitoral feitas por Donald Trump.

As discussões deixam a nu que, apesar de terem noção de que as acusações de Trump não tinham fundamento, os executivos e rostos do canal temeram alienar os espectadores e perder audiências para a Newsmax — uma estação ainda mais à direita e leal a Trump — caso não alinhassem com a sua narrativa.

De acordo com os advogados da Dominion, o problema começou quando, na noite eleitoral, o panel de decisões da Fox News anunciou que Joe Biden tinha vencido no Arizona, um dos estados decisivos.

Mais nenhum canal televisivo tinha confirmado a vitória de Biden no estado nessa altura e o anúncio da Fox parecia prematuro dada a quantidade de votos que ainda não estavam contados, relata a Vox.

Mas a preocupação dos pivôs não estava na possibilidade de terem errado ao atribuir tão cedo a vitória a Biden, mas antes no impacto que o anúncio teria na opinião dos apoiantes de Trump, que o poderiam encarar como uma “traição” ao Presidente.

“Estamos a brincar com o fogo”

“Trabalhamos muito para construírmos o que temos. Aqueles filhos da p**** estão a destruir a nossa credibilidade“, escreveu o apresentador Tucker Carlson ao seu produtor, a 5 de Novembro de 2020, frisando que Trump pode “facilmente destruír-nos se errarmos”.

A 7 de Novembro, Carlson escreveu uma nova mensagem quando a Fox declarou que Biden era o vencedor das eleições. “Os executivos percebem quanta credibilidade e confiança perdemos com a nossa audiência? Estamos a brincar com o fogo, a sério. Uma alternativa como a Newsmax pode mesmo destruír-nos”, lê-se.

Rupert Murdoch, presidente da Fox Corporation, enviou ainda um email a Suzanne Scott, CEO da Fox News, a alertar sobre a competição da Newsmax: “Não queremos antagonizar mais o Trump, mas o [Rudy] Giuliani deve ser encarado com cautela. Tudo está em jogo aqui“.

Um padrão surgiu na Fox News: um repórter ou pivô tentaria verificar os factos ou ser cauteloso sobre as alegações de fraude da equipa de Trump e rapidamente seria criticado pelos executivos ou pelos apresentadores do primetime.

Um exemplo disso foi o tweet da repórter Jacqui Heinrich, que a 12 de Novembro respondeu a um tweet de Trump sobre os seus votos “roubados”, escrevendo que isso não é “o que os responsáveis de topo da infraestrutura da eleição disseram”.

Tucker Carlson reencaminhou o tweet para outros apresentadores de primetime, Sean Hannity e Laura Ingraham: “Por favor, despeçam-na. A sério… mas que car****? Estou mesmo chocado. Isto tem de parar imediatamente, tipo hoje. Está claramente a prejudicar a empresa. O preço das acções está em baixo. Não é uma piada”.

Carlson e Hannity apresentaram queixa aos executivos e a CEO juntou-se às críticas. “Ele teve muita lata ao fazer isto e se isto ganhar tracção, os espectadores vão ficar ainda mais enojados”, escreveu Suzanne Collins. Heinrich acabou por apagar o tweet.

“Esta m**** do software é absurda”

Apesar de tentarem manter a aparência de estarem ao lado de Trump, nos bastidores, vários rostos da estação ridicularizaram as alegações de fraude, chegando a descrever aliados de peso de Trump, como Sidney Powell e Rudy Giuliani, como “doidos” ou “idiotas”.

Depois de Powell ter aparecido no programa de Maria Bartiromo, onde alegou que o software das máquinas da Dominion trocou os votos dos eleitores, Carlson admitiu em privado não acreditar na acusação. “Esta m**** do software é absurda. Metade dos nossos espectadores já viu o clip da Maria”, escreveu.

“Temos de andar num limbo por causa dos filhos da p*** idiotas na Fox no dia da eleição. Não podemos deixar que as pessoas pensem que nos viramos contra Trump, mas também temos de denunciar as tretas“, escreveu ainda Justin Wells, um dos produtores de Carlson, a um colega.

A defes da Fox News alega que a estação teve o direito de dar cobertura às alegações de fraude feitas por Trump, descrevendo-as como “inegavelmente dignas de notícia”.

O canal acredita ainda que a sua cobertura está protegida no âmbito do caso New York Times v. Sullivan, que abriu um precedente de protecções aos meios de comunicação social que são processados por responsáveis públicos. O julgamento deve arrancar a 17 de Abril.

Adriana Peixoto, ZAP //

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