Raymar, MAEF

As sociedades mediterrâneas antigas eram profundamente interconectadas, e partilhavam mais cultura do que ADN.
A cultura fenícia teve origem nas cidades-estado da Idade do Bronze no Levante e introduziu grandes inovações, incluindo o primeiro alfabeto.
No primeiro milénio a.C., este inconfundível povo tinha já criado uma rede marítima que se estendia até até à Península Ibérica. Mas a sua expansão pode não ser a que pensávamos.
Assim sugere um novo estudo publicado na Nature e realizado pelo Centro de Investigação Max Planck-Harvard para a Arqueociência do Mediterrâneo Antigo, co-dirigido por Johannes Krause.
O objetivo foi utilizar ADN antigo para caracterizar a ascendência do povo púnico e procurar ligações genéticas entre eles e os fenícios levantinos, com quem partilham uma cultura e uma língua comum.
A equipa realizou então análises em 14 sítios arqueológicos fenício e púnicos. Os resultados foram surpreendentes. “Encontramos surpreendentemente pouca contribuição genética direta dos fenícios do Levante para as populações púnicas do Mediterrâneo ocidental e central”, diz o autor principal Harald Ringbauer à SciTechDaily.
“Isso fornece uma nova perspetiva sobre como a cultura fenícia se espalhou — não por meio de migrações em massa em grande escala, mas por meio de um processo dinâmico de transmissão e assimilação cultural”.
“Observamos um perfil genético no mundo púnico que era extraordinariamente heterogéneo“, afirma David Reich, professor de Genética e Biologia Evolutiva Humana, que co-liderou o estudo. “Em cada sítio, as pessoas eram altamente variáveis na sua ascendência, com a maior fonte genética sendo pessoas semelhantes aos povos contemporâneos da Sicília e do Egeu, e muitas pessoas com ascendência significativa associada ao norte da África também”.
Além disso, as redes genéticas mediterrânicas sugerem que processos demográficos comuns — como comércio, casamentos mistos e mistura populacional — desempenharam um papel fundamental na formação dessas comunidades.
“Essas descobertas reforçam a ideia de que as sociedades mediterrâneas antigas eram profundamente interconectadas, com pessoas se deslocando e se misturando através de distâncias geográficas muitas vezes grandes”, afirma o investigador Ilan Gronau.
“Estudos como este destacam o poder do ADN antigo em sua capacidade de lançar luz sobre a ascendência e a mobilidade de populações históricas para as quais temos registros históricos diretos relativamente escassos”, conclui.