Descoberto cenário geológico que pode ter desencadeado vida na Terra

Simone Marchi

Ilustração da Terra primitiva quando o fragmento mais antigo do nosso planeta se terá formado.

Uma equipa de investigadores identificou um conjunto de condições de reação geológica que podem ter desencadeado a vida no nosso planeta.

A nova investigação permitiu descobrir um cenário evolutivo plausível no qual os ácidos nucléicos – blocos de construção genéticos fundamentais da vida – poderiam permitir a sua própria replicação.

Segundo o Phys, este estudo mostra como uma simples configuração geofísica do fluxo de gás sobre um canal estreito de água pode criar um ambiente físico propício à replicação de ácidos nucléicos. 

O surgimento da vida no nosso planeta continua a ser um mistério para os cientistas, ainda que haja uma teoria consensual: a que defende que a replicação de material genético – os ácidos nucleicos ADN e ARN – foi um processo central para o fenómeno. 

As moléculas de ARN podem armazenar informações genéticas e desencadear a sua própria replicação através da formação de hélices de fita dupla. A combinação destas suas capacidades permite que sofram mutações, evoluam e se adaptem a diversos ambientes, codificando os blocos de construção de proteínas da vida.

Para que tal aconteça, as fitas de ARN precisam de se replicar na forma de fita dupla e de se separar novamente para completar o ciclo de replicação. No entanto, a separação das fitas é uma tarefa difícil nas altas concentrações de sal e ácidos nucleicos necessárias para a replicação.

“Vários mecanismos foram estudados, mas todos requerem mudanças de temperatura que levariam à degradação dos ácidos nucléicos”, explicou o investigador Philipp Schwintek.

“Investigamos um cenário geológico simples e omnipresente em que o movimento da água através de um poro de rocha foi seco por um gás que se infiltrou para chegar à superfície. Esta configuração seria muito comum em ilhas vulcânicas na Terra primitiva, que ofereciam as condições secas necessárias para a síntese de ARN”, acrescentou.

Em laboratório, a equipa construiu um modelo do poro da rocha com um fluxo de água ascendente a evaporar numa interseção com um fluxo de gás perpendicular, causando uma acumulação de moléculas de gás dissolvidas na superfície. Neste processo, o fluxo de gás induz correntes circulares na água, forçando as moléculas a regressar. 

Para entender como este modelo afetaria os ácidos nucléicos no ambiente, os cientistas usaram grânulos para monitorizar a dinâmica do fluxo de água e rastrearam o movimento de fragmentos de ADN curtos marcados com fluorescência.

“A nossa expectativa era que a evaporação contínua levasse a uma acumulação de fitas de ADN. Contudo, descobrimos que a água evaporava continuamente, mas os ácidos nucléicos na face aquosa se acumulavam perto da interface gás-água”, referiu Schwintek.

Cinco minutos após o início da experiência, verificou-se uma acumulação triplo de fitas de ADN. Uma hora depois, havia 30 vezes mais fitas.

Já para a separação das fitas duplas de ADN, normalmente é necessária uma mudança na temperatura, mas quando a temperatura é constante, são necessárias mudanças na concentração de sal.

Para testar se o fluxo circular de fluido na interface do fluxo de gás e a difusão passiva impulsionariam a separação das fitas, forçando os ácidos nucléicos através de áreas com diferentes concentrações de sal, a equipa usou um método chamado espectroscopia FRET.

Um sinal alto de FRET revela que as fitas de ADN ainda estão ligadas, enquanto um FRET baixo indica que as fitas estão separadas. Como previsto, o sinal FRET aumentou inicialmente perto da interface gás-água, indicando a formação de ADN de fita dupla. 

No entanto, ao longo da experiência, especialmente em momentos de fluxo ascendente de água, o sinal FRET foi baixo.

Quando os investigadoras sobrepuseram os dados com a sua simulação de fluxo de água e concentrações de sal, descobriram que o vórtice na interface gás-água causou mudanças significativas nas concentrações de sal, capazes de conduzir à separação dos fios.

Os cientistas consideram esta “geometria” muito simples, pelo que as novas descobertas, publicadas na eLife, aumentam o repertório de potenciais ambientes que poderiam permitir a replicação em planetas primitivos.

ZAP //

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