“As pessoas recusam-se a beber Coca-Cola e as marcas locais registaram um aumento de vendas”. Depois da McDonald’s, Médio Oriente vai atrás do mais famoso refrigerante do mundo.
Saiu pela culatra a tentativa da gigante Coca-Cola de contrariar a tendência de boicote devido aos seus laços com o estado de Israel.
Depois de uma queda a pique nas vendas deste verão em partes do Médio Oriente e da Ásia, graças a boicotes dirigidos a empresas ligadas a Israel, o franchising da Coca-Cola no Bangladesh lançou uma campanha publicitária para distanciar a marca das associações israelitas. E não correu bem.
Recorrendo a um popular ator de televisão do Sul da Ásia, o polémico anúncio retratava um lojista que assegurava aos clientes que a Coca-Cola não era um produto “daquele país” [referindo-se a Israel, sem nunca o pronunciar diretamente] e salientava as ligações do mais famoso refrigerante do mundo às comunidades muçulmanas, numa tentativa de dissipar os rumores sobre as ligações da Coca-Cola a Israel.
“Até a Palestina tem uma fábrica de Coca-Cola”, diz a personagem interpretada por Sharaf Ahmed Jibon — que assim convence um grupo de jovens a beber umas ‘colas’ fresquinhas. Mas a empresa iria arrepender-se de se gabar da fábrica palestiniana.
A fábrica em questão é, na verdade, uma fábrica de engarrafamento de propriedade israelita situada num colonato israelita em Jerusalém Oriental — e considerado ilegal ao abrigo do direito internacional.
Coca Cola Bangladesh put out an ad trying to distance themselves from Israel and this happened: TikTok: lfebraro pic.twitter.com/Yjf7goiiGH
— just pay people reasonable wages (@4privatereasons) July 31, 2024
A afirmação enganosa provocou indignação imediata entre os apoiantes da Palestina e a Coca-Cola retirou rapidamente o anúncio de todas as plataformas. Num pedido de desculpas público, descreveu a campanha como um “erro lamentável”.
A ‘argolada’ foi reconhecida pelo próprio vice-presidente da Coca-Cola: “Enquanto marca global, estabelecemos parcerias com franchisings locais para servir as comunidades locais. Reconhecemos que o vídeo recente falhou o alvo e pedimos desculpa”, afirmou Scott Leith.
Houve de imediato quem visse o aparato como uma tentativa paternalista de enganar os consumidores muçulmanos.
“A empresa deve pensar que o povo do Bangladesh e, possivelmente, todos os muçulmanos são tão ingénuos que caem na sua propaganda falhada, atrevo-me a dizer primitiva”, disse ao The Washington Post o co-fundador da Boycott, Divestment and Sanctions, movimento ativista contra a ocupação da Palestina.
Coca-Cola: só mais uma
A Coca-Cola, que já registava uma queda de 23% nas vendas no Bangladesh antes de lançar o anúncio, tem sofrido bastante às mãos do conflito Israel-Hamas.
“As pessoas recusam-se a beber Coca-Cola e as marcas locais, como a Matrix Cola da Jordânia e a Kinza da Arábia Saudita, registaram um aumento de vendas“, avançou ao Washington Post Will Todman, analista do Médio Oriente no Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais: “as únicas pessoas que vi a beber Coca-Cola eram turistas”.
Mas a criadora do Pai Natal não está sozinha: é a mais recente empresa norte-americana a colher o que planta com a ajuda do apoio militar e político do governo dos EUA a Israel à luz do conflito em Gaza, que já ceifou, desde o ataque do Hamas a Israel a 7 de outubro, mais de 40 mil vidas — quase 2% da população da região, da qual 75% tem menos de 30 anos.
Os boicotes atingiram outros gigantes como a McDonald’s, a Starbucks e a KFC, especialmente feridas no Médio Oriente e na Ásia.
A McDonald’s, por exemplo, viu as suas ações caírem 4% depois de ter registado receitas inferiores às esperadas devido ao enfraquecimento das vendas no Médio Oriente.
“Enquanto este conflito, esta guerra, continuar (…) não esperamos ver qualquer melhoria significativa neste domínio”, afirmou Kempczinski. “É uma tragédia humana, o que está a acontecer, e penso que isso pesa em marcas como a nossa”, explicou, em abril, o CEO da cadeia de fast-food.
A multinacional de cafetaria Starbucks também atribuiu os seus dececionantes resultados trimestrais ao impacto dos boicotes relacionados com Gaza. Tal como a gigante de pizzas Domino’s, foi posta na ‘lista negra’ devido à sua posição pró-israelita e aos seus alegados laços financeiros com Israel.
“Vi sucursais do Starbucks e do McDonald’s completamente vazias em Marrocos, na Tunísia e em Omã”, disse ainda Todman, que acredita que muitos nem boicotam estas empresas por conhecerem “laços exatos” das mesmas com Israel: acho é que as pessoas boicotam as empresas porque elas representam os Estados Unidos e se opõem ao apoio dos EUA a Israel”.