Crianças de Portugal ainda estão sujeitas a prostituição e mendicidade, além de serem exploradas nas áreas do desporto, artes e na restauração. Falta de números oficiais complica a mudança de cenário no país.
Esta segunda-feira, 12 de junho, assinala o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil sob o lema da Organização das Nações Unidas (ONU) “Justiça social para todos. Acabe com o trabalho infantil!’.
A data tem como objetivo impulsionar o combate à prática que afeta crianças em todo o mundo, inclusive em Portugal, onde continua a haver trabalho infantil em múltiplos setores.
A denúncia foi feita à Antena 1 pela Confederação Nacional de Ação Sobre o Trabalho Infantil (CNASTI), que tem vindo a alertar para a ausência de controlo da situação há vários anos.
“As crianças são exploradas. Têm cargas horárias enormes de trabalho e não têm nenhuma supervisão”, avisa a presidente da CNASTI, Fátima Pinto.
Além disso, as crianças sujeitas a exploração podem, inclusive, não ficar com os rendimentos do trabalho.
“Não se sabe se o dinheiro é para a criança ou se os pais ficam com ele”, avisa a presidente, que recordou ainda que há crianças em Portugal sujeitas à prostituição e a mendicidade.
A restauração e o meio artístico serão as áreas de trabalho infantil mais comuns, mas o desporto, segundo a presidente, não fica atrás.
“Temos aqueles olheiros que vão buscar jovens lá fora e que trazem, às vezes, famílias completas, porque os pais não aceitam mandar filhos sozinhos para um país desconhecido”, avisa.
“Em determinada altura, ou porque têm uma lesão ou, por algum motivo, deixam de corresponder às expectativas, são mandados embora e as famílias são largadas à sua sorte.”
No Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil de 2019, Fátima Pinto alertou à TSF que a maioria das crianças em situação de trabalho infantil têm 14 anos ou mais e grande parte das ilegalidades prendem-se com o tempo de trabalho, que é muitas vezes superior ao previsto na lei que permite a participação de crianças no setor das artes e espetáculo.
Falta de números atrasa a mudança
Não há números oficiais que alertem para o trabalho infantil em Portugal, talvez porque o país tem esquecido esta grave questão.
A reportagem partilhada pela RTP avisa que o último grande levantamento sobre o trabalho infantil em Portugal foi elaborado há 22 anos atrás, pelos Sistemas de Informação Estatística sobre o Trabalho Infantil (SIETI), que já se encontra extinto.
Nos anos 90, constataram-se situações graves de exploração de mão-de-obra infantil no Vale do Ave, sobretudo nos setores do têxtil e do calçado conta a presidente da CNASTI. “Lembro-me de um relatório que dizia que eram 200 mil as crianças a trabalhar em Portugal. Muita gente tentou desmontar este número mas a verdade é que seriam até mais”, avisou Fátima Pinto, em 2019.
No índice da Walk Free, Portugal está classificado com uma prevalência de 3,8 — ou seja, quase 4 pessoas em mil encontram-se em situação de escravatura.
O índice aponta três recomendações de medidas que deveriam ser adotadas pelo Estado português para diminuir a prevalência de escravatura moderna no país: a criminalização do trabalho forçado e da exploração de comércio sexual de crianças.
A CNASTI aposta na mobilização para eliminar o trabalho infantil e tem como objetivo apoiar a Ratificação Universal da Convenção sobre a Idade Mínima de Admissão ao Emprego — os 16 anos de idade.
As situações de abuso de trabalho infantil devem ser denunciadas na página da CNASTI ou a entidades como Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) ou a Polícia Judiciária.
Compromisso com a justiça social
O Escritório de Direitos Humanos das Nações Unidas reforça que, a nível global, 50 milhões de pessoas ainda trabalham em formas análogas à escravidão.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) — que defende a criação de uma Coalizão Global por Justiça Social — realiza esta segunda-feira um evento paralelo de alto nível durante a 111ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho, para assinalar o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil.
O evento tem como objetivo explorar a conexão entre a justiça social e a erradicação do trabalho infantil.