“Nada acontecerá a Trump”. Memorando do procurador-geral dos EUA gera indignação

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Michael Reynolds / EPA

Merrick Garland segurou uma política de Bill Barr, procurador-geral nomeado por Trump, que lhe dá o poder de bloquear qualquer investigação a um candidato presidencial. A revelação está a ser interpretada como um sinal de que não vai acusar Trump pela invasão ao Capitólio.

Pelos vistos, apesar de todas as revelações bombásticas feitas à comissão parlamentar que está a investigar o ataque ao Capitólio, há dúvidas sobre se o Departamento de Justiça vai acusar formalmente Donald Trump, pelo menos antes das eleições intercalares de Novembro.

A revelação parte de um memorando do Departamento de Justiça que foi agora divulgado. O procurador-geral Merrick Garland alertou os responsáveis sobre os passos extra que têm de ser dados antes de se poder avançar com um caso com ramificações políticas nas vésperas de eleições.

No documento datado de 25 de Maio e conseguido pela MSNBC, Garland cita políticas que determinam o que fazer durante a abertura de casos criminais pelo Departamento de Justiça que impliquem pessoas ou entidades “politicamente sensíveis”.

O memorando não referiu Trump directamente ou qualquer outro político que possa estar sob investigação. A parte que mais polémica está a causar é quando Garland recorda que uma medida implementada por Bill Barr, o procurador-geral nomeado por Donald Trump, ainda está em vigor.

A medida em questão é datada de 2020 e foi uma extensão sem precedentes do poder do procurador-geral, já que passou a ser exigida uma assinatura deste em investigações que envolvam candidatos presidenciais e membros das suas campanhas.

“Nenhuma investigação, incluindo qualquer investigação preliminar, pode ser aberta ou iniciada pelo Departamento ou por qualquer uma das suas agências policias a um candidato declarado a Presidente ou vice-presidente sem a aprovação escrita prévia do procurador-geral”, lê-se no memorando de Barr.

A notícia de que Garland está agora a reservar para si o mesmo direito que o seu antecessor exigiu está a causar um frenesim, dado que pode ser um sinal de que o procurador-geral nomeado por Joe Biden não tem intenções de acusar formalmente Donald Trump pelo seu envolvimento no ataque de 6 de Janeiro.

Trump já deu a entender que vai anunciar oficialmente a sua recandidatura à Casa Branca em 2024 ainda antes das eleições intercalares de Novembro, podendo isso isentá-lo de ser investigado ou acusado de acordo com o memorando de Garland

Não é de agora que o Departamento de Justiça tem medidas estipuladas que exigem cuidados especiais em casos que envolvem figuras políticas, especialmente na proximidade de uma eleição, tendo estas políticas já sido criadas durante as administrações de George W. Bush ou Barack Obama.

No entanto, o memorando de Barr foi muito além das regras já existentes, tendo o procurador-geral ganhado uma reputação por ter uma intervenção política excessiva durante o mandato de Donald Trump — especialmente quando se tem em conta o timing da implementação da medida, que foi logo a seguir à divulgação do relatório do Inspector-Geral do Departamento de Justiça, Michael Horowitz, onde culpava o FBI pelas falhas na investigação às ligações da campanha de Trump à Rússia.

“Garland reforçou a política do procurador-geral mais corrupto da História”

Noutra altura estas políticas que têm em conta as implicações políticas de um caso seriam algo que muitos Democratas defenderiam, visto que ainda há membros do partido que culpam a derrota eleitoral de Hillary Clinton em 2016 na polémica em torno da investigação do FBI aos emails da candidata em cima das eleições.

Um dos Democratas que mantém esta posição é o ex-Senador Doug Jones, que defende a postura de Garland: “É isto que nós queremos. Não queremos, em qualquer administração, que o Departamento de Justiça abra uma investigação que afecte uma eleição”.

A jornalista de segurança nacional Marcy Wheeler concorda com Jones. “A realidade é que o procurador-geral SEMPRE assinaria uma investigação de alto nível”, escreveu no Twitter.

No entanto, o memorando de Garland está agora a suscitar críticas de opositores de Donald Trump, que receiam que o ex-Presidente possa sair impune mesmo com as revelações que têm sido feitas na comissão da Câmara dos Representantes que está a investigar a insurreição dos seus apoiantes.

“Garland não entende que antes de estabilizar o DOJ, tem que se livrar das políticas destinadas a proteger os criminosos da administração anterior“, acusou o apresentador de rádio Michelangelo Signorile.

O agente da polícia do Capitólio que estava presente no ataque, Daniel Hodges, também não poupou Garland: “Se Garland quisesse ser neutro, a actividade política não teria qualquer influência no seu trabalho. O facto de que esta tem prova que não o é. É-lo, na melhor das hipóteses, temporariamente, e na pior está a proteger alguém por causa de política quando há razões para acreditar que cometeu um crime“.

“Como era previsto, nada vai acontecer a Trump e aos seus associados, traidores que tentaram derrubar a nossa democracia”, acusou Wajahat Ali, colunista do The New York Times.

O escritor canadiano Charles Adler disse que Trump “vai anunciar com dois anos de antecedência que vai concorrer à Presidência, mas não porque quer servir o público”. “Como sempre, é tudo sobre ele. É para garantir que fica fora da prisão“.

Don Winslow, escritor, acusa o Departamento de Justiça de ter “adoptado, patrocinado e estendido” a política de Bill Barr. “Garland reforçou a política de má fé do procurador-geral mais corrupto da História”, atirou.

Ainda antes da revelação deste memorando, já se antecipava que o Merrick Garland, que é notoriamente moderado, fosse prudente sobre o avanço de uma acusação contra Donald Trump perante os receios de estar a fazê-la por motivações políticas. Independentemente da decisão que tomar, tudo indica que não vai escapar às críticas, ou dos apoiantes ou dos opositores de Trump.

Adriana Peixoto, ZAP //

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1 Comment

  1. Não gostava de estar no lugar deste Garland: vai sempre ser “preso por ter cão ou por não ter”. O que mais importaria era que o Partido Republicano tivesse vergonha e responsabilidade, largasse os seus tiques de extrema direita e deixasse Trump entregue à sua sorte (i.e., não o voltasse a apoiar).

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