O caso curioso de Pondicherry, uma cidade que tinha ficado sem praia. E o momento ainda mais curioso de Aurofilio Schiavina.
Imagine que passeia todos os dias, ou pelo menos todas as semanas, num determinado local, perto de casa. E imagine que, um dia, depois de alguns anos fora do seu país, volta àquele local…e ele já não existe.
Agora pode deixar de imaginar: isso aconteceu mesmo, com Aurofilio Schiavina, na Índia.
Aurofilio, relata a revista National Geographic, costumava passear junto ao mar em Pondicherry. A cidade no sul da Índia conta com a bela paisagem da baía de Bengala. O (na altura) estudante aproveitava os ares oferecidos pelo oceano Índico e andava pela praia local.
Deixou a sua cidade, o seu país, para completar o seu percurso académico no Reino Unido. Isto em 1991.
Quando regressou à Índia, oito anos depois…a praia já não estava lá.
Entretanto tinha sido construído um porto, naquela zona. A construção não foi bem executada, ou bem pensada (ou ambas), e o nível de água foi subindo, até que a areia ficou “inundada”. A praia ficou dentro do mar.
Assim, Pondicherry ficou famosa: a cidade do litoral da Índia que não tem praia.
Sem areia, os indianos e os turistas limitavam-se a andar pelo paredão de cimento, pelas pedras irregulares.
E, como a praia desapareceu, até os guias turísticos começaram a levar os turistas para outros pontos da cidade, mais longe do mar – e há muito para apreciar em Pondicherry: arquitectura, cafés, boutiques…
Bishwajit Banik, guia turístico, confessou que nos últimos 20 anos muitos turistas perguntaram o que aconteceu à praia, “que arruinou o ecossistema costeiro” local.
O que aconteceu foi a tal construção de um porto, que arrancou ainda na década 1980. A areia começou a ser transferida, acumulou-se na zona sul da praia, em vez de manter o seu percurso natural. Nos anos 1990 a praia foi mesmo “engolida” pelo mar. E passou a ser a “praia de pedra”.
E há algo mais sério: esta alteração ao movimento natural da areia prejudicou claramente a biodiversidade local e os meios de subsistência de muitos moradores. Estima-se que mais de 7 mil famílias ficaram sem a sua única fonte de rendimento – a pesca.
Reverter a situação
Foram precisos anos para identificar o problema. Foi precisamente Aurofilio Schiavina quem identificou a raiz do problema (a transferência da areia) na construção do porto.
Depois de lutas em tribunal e de anos a tentar convencer as autoridades locais, em 2018 arrancou um projecto experimental, que começou a dragar areia da foz do porto; a areia tem sido conduzida de volta à zona da praia através de um oleoduto de quase três quilómetros.
A peça central do projecto é um recife artificial submerso – o primeiro na Índia – que pesa 900 toneladas. A água e sedimentos são desviadas para a zona norte da praia; os tubos, que foram instalados ao longo do paredão, colocam areia de novo na praia.
A iniciativa foi da organização PondyCAN | Pondy Citizen’s Action Network, que trabalha em colaboração com o Governo indiano desde 2009, para recuperar aquela praia.
Três anos depois, no Verão passado, já havia cerca de 60 metros de praia.
Agora os locais e os turistas regressam à zona litoral, até para acompanhar este processo. Os pescadores agradecem e também voltam.