A junta militar em Myanmar intensificou a repressão contra os manifestantes que rejeitaram o golpe de 01 de fevereiro e as forças de segurança mataram pelo menos 94 civis nos últimos dois dias, segundo uma associação do país.
A Associação para a Assistência aos Presos Políticos (AAPP), citada pela agência Lusa, confirmou esta terça-feira que na segunda-feira as autoridades voltaram a disparar munições contra manifestantes em várias cidades do país, deixando pelo menos 20 mortos e mais de 50 feridos.
No dia anterior, pelo menos 74 pessoas, incluindo uma menina de 15 anos e três outros menores, foram mortos no dia mais sangrento de ação brutal das forças de segurança.
A associação coloca o número total de pessoas mortas desde o golpe em 183 como resultado da violência das autoridades e acusa a polícia e os militares de reprimir brutalmente manifestações pacíficas e de vandalizar e pilhar a propriedade privada.
A junta militar anunciou no dia anterior a imposição da lei marcial em quatro distritos de Rangum, a antiga capital e a cidade mais populosa, para além da medida de emergência anunciada no domingo em dois outros distritos da cidade.
O Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) António Guterres disse na segunda-feira que estava “chocado” com a violenta repressão dos protestos levados a cabo pelo exército e exortou a comunidade internacional a agir para o impedir.
“Os assassinatos de manifestantes, detenções arbitrárias e relatos de tortura de prisioneiros violam os direitos humanos fundamentais e desafiam claramente os apelos do Conselho de Segurança à contenção, ao diálogo e ao regresso a um caminho democrático na Birmânia”, disse Guterres através do seu porta-voz, Stephane Dujarric.
Os protestos em Myanmar rejeitam o poder da Junta Militar e exigem o “regresso da democracia” assim como o respeito pelos resultados das eleições de novembro assim como a libertação de todos os presos pelos militares, entre eles a líder “de facto” do governo, Aung San Suu Kyi.
O tribunal que julga a deposta líder adiou esta terça-feira a audiência, por problemas técnicos relacionados com as ligações de vídeo conferência, e depois dos cortes de internet decretados pela Junta Militar. De acordo com os advogados de Aung San Suu Kyi, a terceira sessão do julgamento foi adiada para o dia 24 de março.
Desde que foi detida no dia 01 de fevereiro durante o golpe de Estado militar, Aung San Suu Kyi, de 75 anos, está praticamente isolada. É acusada de quatro delitos, entre os quais o de suborno por aceitar aparelhos telefónicos e pode ser condenada a 15 anos de prisão.
Indignação após ativista ser torturado até a morte
Segundo noticiou na segunda-feira o Guardian, uma onde de indignação ganhou expressão após os militares alegadamente terem torturado até à morte Zaw Myat Lynn, de 46 anos, professor no Suu Vocational College, em Shwe Pyi Thar, e ativista da Liga Nacional para a Democracia (NLD), o partido de Aung San Suu Kyi.
Zaw Myat Lynn, que esteve na linha de frente dos protestos, partilhou vídeos nos quais os soldados espancavam e atiravam nos manifestantes pacíficos. No Facebook, apelou a que a população lutasse “contra o exército, mesmo que custasse” as suas “vidas”, classificando os militares armados como “terroristas” e “cães”.
Na sua última publicação, a 08 de março, transmitiu em direto uma manifestação pró-democracia perto da escola. “Devemos nos preparar para proteger o nosso povo”, disse, acrescentando que um número desconhecido de soldados havia assumido posição nas proximidades. O professor foi detido no complexo escolar, onde vivia com esposa.
Após vinte e quatro horas, a mulher foi instruída a visitar um hospital militar em Mingarlardon, no norte de Yangon, onde identificou o corpo do marido. No relatório médico, havia a indicação de que Zaw Myat Lynn caiu de uma altura de nove metros enquanto tentava fugir.
Contudo, os ferimentos apoiam as alegações de que o ativista foi torturado. Imagens do seu corpo mostram que água a ferver ou uma solução química foi depositada na sua boca, a língua estava derretida e faltavam os dentes. O corpo foi embrulhado para esconder outros ferimentos, como uma ferida no abdómen, que pode ter sido a causa da morte.
Zaw Myat Lynn foi o segundo assessor do NLD a morrer como resultado de uma suposta tortura. Dias antes, Khin Maung Latt, de 58 anos, um presidente local do NLD em Yangon, também morreu na prisão. Um líder do partido disse que as imagens do seu corpo revelavam um ferimento na nuca e hematomas nas costas.