Uma equipa de investigadores criou um “solo ciborgue” para poder estudar como é que é a vida dos micoorganismos no solo debaixo dos nossos pés.
Cave uma colher de chá do solo mais próximo e o que retirar conterá mais microorganismos do que pessoas na Terra. Sabemos disso através de estudos de laboratório que analisam amostras de terra retiradas da natureza microbiana para determinar quais formas de vida microscópica existem no mundo debaixo dos nossos pés.
O problema é que esses estudos não podem dizer-nos como é que este reino subterrâneo opera no solo. Por obrigarem à remoção do solo do seu ambiente, esses estudos destroem as delicadas estruturas de lama, água e ar nas quais residem os micróbios do solo.
Isto levou uma equipa de cientistas a desenvolver uma forma de espiar estes trabalhadores subterrâneos, indispensáveis no seu papel de recicladores de matéria orgânica, sem perturbar os seus micro-habitats.
O novo estudo revelou as cidades escuras e húmidas nas quais residem os micróbios do solo. Os investigadores encontraram labirintos de pequenas estradas, arranha-céus, pontes e rios que são navegados por microorganismos para encontrar comida ou para evitar tornar-se a próxima refeição de alguém.
Esta nova janela para o que está a acontecer no subsolo pode ajudar-nos a melhor apreciar e preservar os solos cada vez mais danificados da Terra.
Solo ciborgue
Neste novo estudo, os cientistas desenvolveram um novo tipo de “solo ciborgue”, que é meio natural e meio artificial. Consiste em chips que enterraram na natureza ou cercaram com solo no laboratório por tempo suficiente para que as cidades microbianas surjam na lama.
Os chips atuam literalmente como janelas para o subsolo. Um remendo transparente no solo opaco, o chip é cortado para imitar as estruturas porosas do solo real.
Diferentes leis físicas tornam-se dominantes na escala micro em comparação com o que conhecemos no nosso mundo macro. A água adere às superfícies e as bactérias em repouso são empurradas pelo movimento das moléculas de água. As bolhas de ar formam barreiras intransponíveis para muitos microrganismos, devido à tensão superficial da água ao seu redor.
Assim que implantaram os chips no solo, os cientistas puderam observar como é que os micróbios avançavam nas suas viagens de decomposição, revelando as suas interações, as suas teias alimentares e como diferentes micróbios projetam os seus micro-habitats circundantes e em constante mudança.
Autoestradas de fungos
Quando escavaram os primeiros chips, depararam-se com toda a variedade de organismos unicelulares, nematoides, artrópodes minúsculos e espécies de bactérias que existem nos nossos solos. As hifas fúngicas, que se enterram como raízes de plantas no subsolo, cresceram rapidamente nas profundezas dos poros do solo ciborgue.
Isto significava que os cientistas poderiam estudar um fenómeno conhecido como “autoestradas de fungos” ao longo das quais as bactérias “pedem boleia” para se dispersar pelo solo. As bactérias geralmente dispersam-se pela água, portanto, ao preencher alguns dos chips, os cientistas poderiam observar como é que as bactérias se infiltram em novos poros seguindo os braços de hifas fúngicas.
Inesperadamente, os cientistas também encontraram um grande número de protistas — organismos unicelulares enigmáticos que não são animais, plantas ou fungos — nos espaços ao redor das hifas. É evidente que eles também apanham boleia na autoestrada dos fungos — um fenómeno até agora completamente inexplorado.
Engenharia subterrânea
Neste novo estudo, os investigadores também queriam explorar como e por que meios as cidades microbianas são projetadas. Uma maneira de o fazer era observando como é que os minerais do solo encontraram o seu caminho nos chips, criando espaço de solo real dentro das estruturas artificiais colocadas no solo.
Quando os chips começaram a secar, testemunhou-se como é que a água é sugada pelos poros do solo: um tsunami de movimentos da água a que os microrganismos do solo são regularmente expostos como chuva e luz que interferem nos seus minúsculos mundos.
Os padrões resultantes nos minerais do solo pareciam um sistema de leito de rio no nosso macro-mundo.
Mais surpreendentemente, descobriu-se que outros organismos menos “fortes” também alteram a estrutura microscópica dos solos. Um ciliado, por exemplo, que possui pequenas extensões semelhantes a cabelos para locomoção, também pode demolir o solo com a sua busca vigorosa por alimento.
Os resultado do estudo foram publicados recentemente na revista científica Communications Biology.
ZAP // The Conversation