Há muito que os cientistas debatem a possível existência de vida em Marte, e um novo estudo está a atirar achas para a fogueira.
Uma análise recente do meteorito Tissint, que caiu na Terra em 2011 e sobre o deserto marroquino, resultou num relatório que sugere que fluidos com carbono – possivelmente indícios de vida – já existiram à superfície do Planeta Vermelho.
“A presença de fluidos ricos em material orgânico que infiltrou rochas perto da superfície de Marte tem implicações significativas para o estudo do paleo-ambiente marciano e, talvez, para a busca de possíveis actividades biológicas antigas em Marte,” escreveram os investigadores no estudo, publicado na passada terça-feira na revista Meteoritics & Planetary Science.
Mas alguns especialistas pensam que os achados não descartam a teoria de que o material orgânico no meteorito pode ter origens em processos não-biológicos.
O famoso astrónomo Carl Sagan disse uma vez que “afirmações extraordinárias exigem provas extraordinárias,” observou Andrew Steele, microbiólogo do Instituto Carnegie em Washington D.C., EUA, que estudou o meteorito mas que não esteve envolvido no novo estudo.
“Acho que o ónus recai sobre os investigadores, que devem apresentar as famosas provas extraordinárias,” comenta Steele. “Não acho que o tenham feito, até agora.”
O meteorito Tissint foi expulso de Marte por um asteróide, e caiu para a Terra numa bola de fogo sobre a província Tata, no deserto marroquino, âs primeiras horas da manhã de 18 de Julho de 2011.
É um de apenas cinco meteoritos marcianos cuja entrada foi testemunhada por seres humanos.
Os estudos anteriores descobriram vestígios de material orgânico – compostos que contêm carbono e que, na Terra, são alguns dos blocos de construção da vida – em fissuras minúsculas do meteorito Tissint, que se formaram enquanto a rocha estava em Marte.
Mas os cientistas têm debatido ferozmente se estes compostos foram produzidos por vida ou por outros processos não-biológicos.
No novo estudo, Philippe Gillet, cientista da École Polytechnique Fédérale de Lausanne, na Suíça, e uma equipa de colegas, analisaram a química do composto orgânico encontrado nas fissuras do meteorito.
A equipa de Gillet acredita que o impacto de um asteróide em Marte pode ter criado estas fissuras no Tissint enquanto ainda se encontrava à superfície do Planeta Vermelho, produzindo “veias” que absorveram parte da matéria que continha carbono.
O carbono, assim como outros elementos, vêm em diferentes formas, os chamados isótopos. Ao medir as quantidades destes isótopos, os cientistas podem determinar a provável origem do carbono nas fissuras.
Depois de analisar a composição do carbono nas pequenas fendas do Tissint, a equipa descobriu que os isótopos de carbono eram leves demais para ter vindo da atmosfera marciana, como alguns cientistas tinham sugerido.
Os cientistas concluíram que os elementos químicos foram para na realidade trazidos por um fluido rico em matéria orgânica e que provavelmente veio de vida.
Possível origem vulcânica
Mas Steele e outros cientistas não concordam que as provas apresentadas comprovem a afirmação.
Num estudo de 2012, publicado na revista Science, Steele descobriu que a matéria orgânica descoberta no Tissint e em 10 outros meteoritos é originária de Marte, mas foi formada por processos vulcânicos.
No entanto, Steele não estudou o mesmo material orgânico que Gillet e sua equipa – estudavam compostos que entraram no meteorito após a lava ter arrefecido.
Ainda assim, segundo Steele, a matéria orgânica dos fluidos pode ser originária de uma série de outras fontes, como a contaminação na Terra, meteoritos que impactavam Marte e outra química não-biológica. Algumas destas fontes podem também produzir isótopos leves de carbono, acrescenta.
Allan Treiman, cientista do Instituto Lunar e Planetário em Houston e do MSL/Curiosity (Mars Science Laboratory) da NASA, recorda que “fluidos com material orgânico podem ser encontrados em algumas rochas vulcânicas cá na Terra, e são interpretados como nada tendo a ver com vida.”
Mas o Tissint não é o único meteorito que provocou controvérsia com reivindicações de vida marciana.
Também se pensa que o meteorito Alan Hills 84001, descoberto na Antártica no dia 27 de Dezembro de 1984, seja de Marte.
Em 1996, cientistas descreveram que a rocha espacial continha indícios de bactérias fossilizadas, mas outros cientistas, desde então, descobriram explicações que não passam pela existência de vida.
Os cientistas ainda não podem descartar a possibilidade de existência de vida passada no Planeta Vermelho – afinal de contas, os blocos de construção da vida estão lá, diz Steele.
Mas os investigadores “têm de ser mais robustos na sua análise para realmente provar as suas afirmações,” conclui.