Um novo estudo sugere que os primeiros Homo sapiens perfuravam orifícios em peles de couro para costurar roupas.
Um fragmento de osso pré-histórico coberto de marcas e perfuração pode ter sido usado por antigos artesãos na confecção de roupas, dizem cientistas.
O artefacto, que foi descoberto num sítio arqueológico na Catalunha, Espanha, cerca de 20 km a sul de Barcelona, foi usado há 39.600 anos, durante o Pleistoceno.
Vinte e oito reentrâncias pontilham a superfície do misterioso osso, embora nem todas sejam facilmente visíveis.
Num artigo publicado este mês na Science Advances, os investigadores sugerem que os artesãos pré-históricos usariam um objeto pontiagudo, semelhante a um formão, para perfurar peças de couro colocado em cima do osso.
Segundo a Smithsonian, os orifícios assim abertos seriam depois usados para coser o couro, criando peças de vestuário.
O osso será assim o exemplo mais antigo conhecido de uma tábua de perfuração e antecederia as primeiras agulhas ósseas conhecidas na Europa em 15.000 anos, de acordo com o estudo.
“Esta é uma descoberta muito significativa”, diz à New Scientist o arqueólogo Ian Gilligan, que não fez parte do estudo.
“Não temos evidências diretas de uso de roupas no Pleistoceno, pelo que qualquer evidência indireta é um achado valioso. Os fragmentos de tecido mais antigos do mundo datam de cerca de 10.000 anos”, acrescenta o arquóologo, que estuda a origem do vestuário na Universidade de Sydney, na Austrália.
“O que a nova descoberta nos diz é que os primeiros seres humanos modernos que viveram na Europa tinham a tecnologia no seu conjunto de ferramentas para fazer roupas ajustadas”, diz à Science News Luc Doyon, coautor do estudo e arqueólogo na Universidade de Bordeaux, em França.
O osso data de pouco tempo após a chegada dos primeiros humanos modernos à Europa, há cerca de 40.000 anos.
Os humanos podem ter usado roupas pela primeira vez há mais de 120.000 anos, mas algumas estimativas situam as primeiras roupas ainda mais cedo. Um estudo publicado em 2010 sugere que já nos vestíamos há cerca de 170.000 anos.
O fragmento de osso parece ser da anca de um animal da família Bovidae, que inclui antílopes, ovelhas e búfalos, ou de um equídeo, como um cavalo.
As 28 perfurações incluem dois conjuntos distintos — um grupo de dez entalhes “notavelmente semelhantes” numa fila e um grupo de 15 desalinhados — bem como três marcas menores e isoladas, escrevem os autores.
A equipe conclui que estas reentrâncias resultaram de seis episódios separados de perfuração de orifícios nas peles.
Normalmente, uma série de marcas numa linha pode indicar que um objeto foi usado para registar informações — ou que era uma obra de arte.
Mas, no caso deste osso, ambas as explicações pareciam improváveis. Alguns dos buracos são difíceis de ver e o osso não foi manipulado de outras formas, explica Doyon.
Para determinar como as perfurações foram usadas, os investigadores tentarem reproduzi-las usando diversas ferramentas antigas, incluindo chifres e ossos.
A equipa descobrir que, ao colocar peles sobre o osso, e martelá-las com uma ferramenta de sílex pontiaguda semelhante a um formão, obtinham o mesmo tipo de marcas de perfuração vistas no artefacto.
“Conseguimos produzir exatamente o mesmo tipo de modificações”, diz Doyon.
Os resultados são evidências de que os caçadores-coletores da época tinham conhecimento e tecnologia para fazer roupas ajustadas e outros produtos de couro, como sapatos, de acordo com o artigo.