Aumento de 4% do imposto sobre o álcool e bebidas originou uma quebra de 900 mil euros em receita fiscal, no primeiro trimestre.
A introdução ao consumo de bebidas espirituosas em Portugal continental diminuiu quase 10% no primeiro trimestre, influenciada pelo aumento de 4% do imposto sobre o álcool e bebidas (IABA), menos 900 mil euros em receita fiscal.
Esta é uma das conclusões sobre o impacto do imposto IABA no setor das bebidas espirituosas divulgado esta segunda-feira pela Associação Nacional de Empresas de Bebidas Espirituosas (ANEBE) e a EY Portugal, a que a Lusa teve acesso.
“A diminuição de quase 10% da introdução ao consumo de bebidas espirituosas em Portugal continental no primeiro trimestre”, adiantam em comunicado, “está relacionada, por um lado, com uma antecipação dos produtores à entrada em vigor no início do ano do aumento de 4% do IABA (que já havia aumentado 1% a meio do ano de 2022)”.
Por outro lado, “à quebra da procura e das vendas, tanto pelo lado do aumento dos preços devido à indexação natural do aumento da taxa no PVP dos produtos, como pelo impacto da inflação no poder de compra dos consumidores”.
No período em análise, os operadores portugueses de bebidas espirituosas “diminuíram em quase 8,6% o valor das introduções ao consumo em Portugal continental”, face ao primeiro trimestre de 2022, “o que levou a um decréscimo da receita fiscal na ordem dos 900 mil euros”.
Em 2022, “o setor das bebidas espirituosas, que representa 11% do consumo de bebidas alcoólicas em Portugal, contribuiu com 50% do total do imposto IABA arrecadado no nosso país, garantindo ao Estado 156,7 milhões de euros (mais cerca de 45,6 milhões de euros do que em 2021), o que revela uma grande dinâmica económica do setor”.
O relatório “demonstra ainda que o congelamento do IABA, que vigorou em Portugal entre 2019 e os primeiros seis meses de 2022, teve resultados muito positivos e permitiu ao Estado, sem o aumento da taxa do imposto, garantir receita fiscal”.
Para os produtores, “possibilitou estabilidade fiscal para investimento em recursos humanos, marketing, inovação e potenciação dos seus negócios para os mercados externos. Uma política fiscal com claras consequências positivas para a economia”.
O relatório conclui também que “é crucial efetuar o devido acompanhamento da arrecadação de receita deste imposto, bem como determinar a sua execução concreta face ao valor orçamentado, considerando que uma tax policy eficiente pode gerar uma maior receita e garantir a sustentabilidade do setor, sobretudo dos pequenos operadores da indústria das bebidas espirituosas”, lê-se no documento.
“Afigura-se, assim, fundamental voltar à política de congelamento da taxa observado desde 2019, por forma a que o Governo não contribua, de forma direta ou indireta, em primeiro lugar, para o incremento do fenómeno inflacionista”, afirma o secretário-geral da ANEBE, João Vargas, citado em comunicado.
Em segundo, “aproveitando a dinâmica da nossa economia ancorada no turismo, o Estado sem cair na tentação política do aumento de imposto, continuar a arrecadar acompanhando este movimento positivo da economia. E, por fim, permitir às nossas empresas investir mais, criar mais postos de trabalho, aumentar o seu investimento em marketing, em ‘marketplaces’, em acompanhar as novas tendências do mercado, em inovação, e sobretudo, com a estabilidade fiscal, promover as suas marcas nos mercados externos”, acrescenta.
Por sua vez, Amílcar Nunes, ‘Tax Partner’ EY, também citado no comunicado, adianta que “este [relatório] Shadow Forecast vem demonstrar a importância de uma política fiscal adequada à realidade do setor”.
Nomeadamente “a estimativa de podermos ter já ultrapassado o ótimo potencial atual ao nível da tributação para a categoria das bebidas espirituosas, atentas as condições de mercado e dimensão dos operadores no contexto da realidade portuguesa, uma pequena economia aberta ao exterior”, refere.
Ora, “a existência de um clima de estabilidade fiscal em matéria de tributação especial sobre o consumo, através da adoção de uma cláusula de ‘stand-still’ por um período específico de tempo, pode ser vista como uma abordagem efetiva de relançamento económico no setor, incentivando-se assim as decisões de investimento e criação de emprego pelos produtores de bebidas espirituosas”, conclui.
O relatório conjunto de prestação de contas relativa à execução orçamental do imposto especial sobre o consumo IABA (imposto sobre o álcool, as bebidas alcoólicas e as bebidas adicionadas de açúcar ou outros edulcorantes) é apresentado numa conferência subordinada ao tema “O paradigma do setor das bebidas espirituosas — A fiscalidade do setor no contexto de recuperação pós-pandemia, inflação e disrupção das cadeias de abastecimento”, que se realiza esta manhã no ISEG, em Lisboa.
“Este relatório da ANEBE e da EY Portugal insere-se numa abordagem de monitorização e prestação de contas que a indústria das bebidas espirituosas, em parceria com a EY, adotou como modelo de ‘accountability’ para avaliar e melhorar políticas públicas que afetam um setor económico e a sua cadeia de valor” e é “o primeiro documento enviado desde que o Governo decidiu aumentar o IABA na categoria de espirituosas em 4% em sede de Orçamento de Estado para 2023”, terminando um período de congelamento da taxa que vigorava desde 2019.
Comparação com Espanha
Os impostos fazem diferença em relação a Espanha: no país vizinho este imposto especial sobre o consumo é 30% mais baixo.
Há cerca de 7 anos que o IABA não sobe em Espanha. “A pergunta que se faz é: porque é que os espanhóis fazem isso? É para proteger duas coisas: os produtores nacionais e alavancar todo um setor importante da economia nacional, neste caso o da hospitalidade [turística], que é o canal Horeca (hotelaria, restauração, cafetaria e catering) onde são vendidas as nossas bebidas”, analisou João Vargas, no Jornal de Notícias.
Quem vive perto da fronteira, vai a Espanha comprar bebidas, João Guterres, empresário e produtor de bebidas espirituosas, deixou alertas: “Em Espanha, pagam quase metade. Algumas bebidas nem pagam. Por isso é que o consumidor final, aqui da zona, vai todo lá”.
Aliás, no Minho, esta diferença a nível fiscal originou quebras próximas dos 80% na venda de bebidas espirituosas, reforçou João Guterres.
Gin (que era o produto mais vendido antes da subida do imposto), vodka e uísque, sendo bebidas com mais graduação, são as bebidas com maiores quedas. Os licores “são os que vão aguentando o segmento”.
Perante esta tendência, outro cenário tem sido mais visível: o consumo de cerveja está a aumentar.
“Um gin tónico custa 8 a 10 euros, alguns 15, uma cuba-libre ou um uísque, igual. Agora, as pessoas bebem uma, duas, três cervejas e gastam os 10 euros”, explicou Guterres.
ZAP // Lusa