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Alpinistas que exploravam vulcão resolvem mistério de avião desaparecido há 50 anos

Royal Air Force / Wikimedia

Uma aeronave Avro Lancaster Mk 1 ExCC, semelhate ao Stardust desaparecido em 1947

Uma aeronave Avro Lancaster Mk 1 ExCC, semelhate ao Stardust desaparecido em 1947

Às 17h41 de 2 de agosto de 1947, o voo CS59 da British South American Airways entrou em contacto com a torre de controlo do aeroporto de Los Cerrillos, na cidade de Santiago, no Chile.

O piloto informou por rádio que previa chegar à capital chilena em aproximadamente quatro minutos. De seguida, o avião desapareceu completamente.

Não houve mais contactos por rádio nem nenhum sinal de socorro que alertasse sobre um possível problema.

Foram organizadas operações de busca imediatamente a seguir ao desaparecimento do avião, um Avro Lancastrian que levava seis passageiros e cinco tripulantes desde Buenos Aires. Mas os destroços do voo CS59 não foram encontrados.

O mistério do desaparecimento da Stardust, como tinha sido baptizada a aeronave, levaria mais de meio século para ser resolvido.

E, durante este tempo, a falta de informações e provas alimentaria as mais extravagantes teorias.

Atentados e extraterrestres

Dois acidentes ocorridos poucos depois com aviões da mesma empresa aérea levaram a especulações de sabotagem.

A presença de um diplomata britânico entre os passageiros, num momento de tensão entre a Argentina e a Grã-Bretanha, fez com que alguns acreditassem na teoria de atentado, que teria sido realizado para evitar a chegada de documentos secretos a Santiago.

Enquanto isso, uma palavra estranha presente na última mensagem enviada por rádio convenceu muitos de que extraterrestres estavam envolvidos no desaparecimento.

Em código morse, a última transmissão dizia: “ETA (tempo de chegada estimado ) Santiago 17h45 STENDEC“.

Estas sete letras tornariam ainda mais misterioso o desaparecimento da aeronave.

E, anos depois, esta última palavra – nunca explicada satisfatoriamente – seria usada até mesmo para baptizar uma revista espanhola dedicada aos ETs e ao mundo paranormal, a Stendek.

Cinco décadas de espera

Outros detalhes dignos de um filme de Hollyood, como o passageiro palestiano que levava um enorme diamante costurado ao forro da roupa, também tornaram o Stardust um dos casos favoritos dos fãs de mistérios.

Já para os familiares dos passageiros e tripulantes, a falta de explicações foi uma tortura durante décadas.

“Uma pessoa não quer chorar pela morte de alguém que pode não ter morrido”, explicou à BBC em novembro de 2000 Ruth Hudson, sobrinha de um dos passageiros.

Em entrevista dada a um programa sobre o Stardust, a prima de Hudson, Stacey Marking, acrescentou: “A minha avó continuou a acreditar que o meu tio estava vivo até morrer, cerca de dez anos depois”.

Mas por volta dessa altura, o mistério começava a ser esclarecido.

Em janeiro de 2000, restos humanos e fragmentos de uma aeronave foram encontrados por alpinistas no vulcão Tupungato, na Argentina.

E uma expedição organizada posteriormente pelo Exército argentino confirmou que se tratavam dos destroços do Stardust, o que deu início a uma investigação.

Rafael Edwards / Flickr

A cordiheira do Tupungato e Aconcagua, na Argentina

A cordiheira do Tupungato e Aconcagua, na Argentina

Mistério desvendado

No princípio, o achado só aprofundou o mistério.

Como tinha o avião ido parar a mais de 80 quilómetros do aeroporto de Santiago, onde estava prestes a pousar?

Além disso, a área onde estava tinha sido intensamente vasculhada durante as buscas.

E, durante todo esse tempo, vários alpinistas tinham escalado o Tupungato, que tem mais de 6.500 metros de altura, sem encontrar nada, até o velho Avro Lancastrian reaparecer 53 anos depois.

As análises dos destroços mostrariam que os motores ainda funcionavam, o que fez a hipótese de bomba ser descartada, porque os motores normalmente ficariam destruídos após uma explosão, e a distribuição dos destroços indicavam que tinha havido um choque direto contra a montanha.

Os investigadores acreditam que o impacto provavelmente gerou uma avalanche que escondeu o avião das primeiras equipes de resgate. A neve que caiu depois cobriu-o ainda mais, mantendo-o oculto até ser arrastado pela movimentação natural do gelo que recobria a montanha até à parte mais baixa, onde reapareceu.

Erro de cálculo

A causa do acidente pode estar ligada a um fenómeno atmosférico invisível e pouco frequente até então: o jetstream.

Essa poderosa corrente de vento produzida a grandes altitudes pode alcançar velocidades de até 160 quilômetros por hora.

Mas, em 1947, poucos aviões podiam voar tão alto e, por isso, os pilotos não estavam familiarizados com esse fenómeno, que pode alterar significativamente a velocidade de navegação e, assim, afectar os cálculos.

Os investigadores acreditam que a tripulação do Stardust decidiu subir a mais de 24 mil pés para evitar o mau tempo que afectava a Cordilheira dos Andes, que separa a Argentina do Chile.

Assim, enquanto voavam às cegas entre as nuvens, o jetstream deve ter reduzido bastante a sua velocidade sem que eles se tivessem dado conta, mantendo-os do lado errado das montanhas, quando pensavam estar a poucos minutos de aterrar.

Ao começar a descida, esperando ver Santiago por entre as nuvens, aconteceu a inevitável colisão.

“Acredito que, no final do voo, o piloto devia estar bastante seguro do que fazia e relaxado. Os passageiros não devem ter-se dado conta do que estava a acontecer em momento algum”, disse Carlos Buzá, o especialista responsável pela investigação feita pelo Exército argentino.

“Não acho que seja uma forma má de morrer, porque num momento você está tranquilo e no momento seguinte não sente mais nada”, diz o homem que resolveu o mistério de uma vez por todas.

Ou, melhor dizendo, quase todo o mistério – porque até hoje, ainda ninguém descobriu o que a tripulação do Stardust queria dizer com a palavra STENDEC.

ZAP / BBC

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