Há galáxias “demasiado grandes” — e podem ser ainda mais massivas do que se pensava

NASA, ESA, the Hubble Heritage Team (STScI/AURA), J. Blakeslee (NRC Herzberg Astrophysics Program, Dominion Astrophysical Observatory), and H. Ford (JHU)

Os primeiros resultados do Telescópio Espacial James Webb sugerem a existência de galáxias tão antigas e tão massivas que estão em tensão com a nossa compreensão da formação da estrutura do Universo.

Foram propostas várias explicações que podem aliviar esta tensão. Mas agora um novo estudo sugere um efeito que nunca antes tinha sido estudado em épocas tão primitivas, indicando que as galáxias podem ser ainda mais massivas.

Se tem acompanhado os primeiros resultados do Telescópio Espacial James Webb, provavelmente já ouviu falar do principal problema das observações das galáxias mais antigas: são demasiado grandes.

Desde alguns dias após a publicação das primeiras imagens, e repetidamente ao longo dos meses seguintes, surgiram novos relatos de galáxias cada vez mais distantes. De forma perturbadora, várias dessas galáxias pareciam ser “demasiado massivas“.

NASA, ESA, CSA, STSCI / Giménez-Arteaga et al. (2023), Peter Laursen (Cosmic Dawn Center)

Esta imagem do enxame galáctico SMACS 0723 e dos seus arredores foi a primeira divulgada pelo Telescópio Espacial James Webb em julho de 2022.  Uma análise cuidadosa destas galáxias revela que, se não conseguirmos resolver uma galáxia, podemos subestimar gravemente a massa total das suas estrelas.

Aplicando o modelo atualmente mais aceite da estrutura e evolução do Universo, o chamado modelo ΛCDM, simplesmente não deveriam ter tido tempo para formar tantas estrelas.

Embora o modelo ΛCDM não seja um dogma indestrutível, há muitas razões para “pôr os travões” numa mudança de paradigma: as épocas medidas em que vemos as galáxias podem estar subestimadas.

As suas massas estelares podem estar sobrestimadas. Ou podemos apenas ter tido sorte e, de alguma forma, ter descoberto as galáxias mais massivas nessa altura.

Um olhar mais de perto

Mas agora Clara Giménez Arteaga, estudante de doutoramento no Cosmic Dawn Center, em Copenhaga, propõe um efeito que pode aumentar ainda mais a tensão.

Essencialmente, a massa estelar de uma galáxia é estimada medindo a quantidade de luz emitida pela galáxia e calculando quantas estrelas são necessárias para emitir essa luz. A abordagem habitual é considerar a luz combinada de toda a galáxia.

No entanto, ao analisar mais de perto uma amostra de cinco galáxias, observadas com o James Webb, Giménez Arteaga descobriu que, se a galáxia for considerada não como uma grande mancha de estrelas, mas como uma entidade constituída por vários aglomerados, surge uma imagem diferente.

“Utilizámos o procedimento padrão para calcular as massas estelares nas imagens obtidas pelo James Webb, mas numa base pixel a pixel, em vez de olharmos para toda a galáxia”, descreve Giménez Arteaga.

“Em princípio, poder-se-ia esperar que os resultados fossem os mesmos: somando a luz de todos os pixéis e calculando a massa estelar total, em vez de calculando a massa de cada pixel e somando depois todas as massas estelares individuais. Mas não é o caso“.

Na realidade, as massas estelares inferidas revelaram-se até dez vezes maiores.

A figura em baixo mostra as cinco galáxias com as suas massas estelares determinadas de ambas as formas.  Se as duas abordagens diferentes concordassem, todas as galáxias se situariam ao longo da linha designada por “The same”. Mas todas elas estão acima desta linha.

Giménez-Arteaga et al. (2023), Peter Laursen (Cosmic Dawn Center)

As cinco galáxias colocadas num diagrama que mostra tanto a massa estelar inferida da forma “habitual” (eixo horizontal, azul) como a do método pixel a pixel de Clara Giménez-Arteaga (eixo vertical, vermelho). Em todos os casos, as massas encontradas usando o método pixel a pixel são maiores.

Ofuscadas

Então, qual é a razão para que as massas estelares sejam tão maiores?

Giménez Arteaga explica: “As populações estelares são uma mistura de estrelas pequenas e ténues, por um lado, e de estrelas brilhantes e massivas por outro. Se olharmos apenas para a luz combinada, as estrelas brilhantes tenderão a ofuscar completamente as estrelas ténues, passando despercebidas”.

“A nossa análise mostra que os aglomerados brilhantes de formação estelar podem dominar a luz total, mas a maior parte da massa encontra-se em estrelas mais pequenas”, acrescenta.

A massa estelar é uma das principais propriedades usadas para caracterizar uma galáxia e o resultado de Giménez-Arteaga realça a importância de se conseguir resolver as galáxias.

Mas para as mais distantes e ténues, isso nem sempre é possível. O efeito já foi estudado anteriormente, mas apenas em épocas muito posteriores da história do Universo.

O próximo passo é, portanto, procurar assinaturas que não exijam a alta resolução e que estejam correlacionadas com a “verdadeira” massa estelar.

“Outros estudos efetuados em épocas muito posteriores também encontraram esta discrepância. Se conseguirmos determinar quão comum e severo é o efeito em épocas anteriores, e quantificá-lo, estaremos mais perto de inferir massas estelares robustas de galáxias distantes, o que é um dos principais desafios atuais do estudo de galáxias no Universo primitivo”, conclui Clara Giménez Arteaga.

O estudo foi publicado na revista The Astrophysical Journal.

// CCVAlg

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