O medo pode reduzir o tamanho da população de pardais e outros pássaros para metade, em cerca de cinco anos.
De acordo com a Ars Technica, os predadores e as presas têm uma relação bastante direta quando se trata de totais populacionais.
Um leão mata uma zebra, por isso há menos uma zebra numa manada. Contudo, novas pesquisas sugerem que os predadores podem ter um efeito mais profundo e mais duradouro nas suas futuras refeições: o medo.
Este medo dos predadores pode ter impacto no sucesso reprodutivo dos animais de presa, argumentou uma equipa da Western University, no Canadá.
A equipa, liderada pelos investigadores Liana Zanette e Michael Clinchy, do departamento de Biologia da universidade canadiana, chegou a esta conclusão depois de ter realizado um estudo com pardais cantores selvagens.
Os autores do estudo dizem haver razões para acreditar que o fenómeno que encontraram entre os pardais também estaria presente noutras espécies — pelo menos nas aves e mamíferos que cuidam dos seus descendentes.
“A presença do predador está na realidade a mudar dramaticamente o comportamento da presa a um grau e durante um período que pode realmente afetar a população de presas”, explicou Clinchy.
Quando as aves pensavam que havia um predador por perto, deixavam de procurar comida, o que significava que não podiam alimentar tão bem as suas crias.
Durante a época de reprodução, as aves também produziram menos ovos. O número de descendentes diminuiu para metade, e muitas das crias dos pais que foram expostas ao medo eram menos saudáveis.
“É tão simples como ‘as presas assustadas comem menos‘”, referiu Zanette.
A equipa começou a investigar o fenómeno em 2010, nas Gulf Islands, ao longo da costa da província canadiana da Colômbia Britânica.
Em primeiro lugar, os investigadores encontraram 11 populações diferentes de pardais, espalhadas por algumas das ilhas.
Metade das populações foi utilizada para a experiência, na qual a equipa utilizou altifalantes para projetar sons de espécies não predadoras, como os gansos.
Os pássaros da outra metade não tiveram tanta sorte. A equipa usou os altifalantes para transmitir os sons dos seus predadores naturais, para induzir o medo.
“Escolhemos o som desses animais como o tratamento de predadores”, sublilhou Liana Zanette.
A equipa localizou então os ninhos de cada grupo e contou o número de fêmeas e de ovos que foram capazes de pôr.
Os investigadores também afixaram etiquetas de rádio e faixas coloridas às crias, depois da eclosão dos ovos, para que pudessem identificar as aves mais tarde. A equipa acompanhou as aves ao longo de toda a sua vida.
“Tem impacto ao longo de gerações. Estamos a seguir uma geração desde o ovo até ao adulto, e depois [medimos]… a qualidade desse adulto, quanto tempo é provável que viva, e, portanto, qual será o seu papel nas gerações seguintes”, disse Clinchy.
O investigador acrescentou que, para evitar quaisquer mortes por enviesamento de dados da descendência que sejam efetivamente mortos por predadores, a equipa montou câmaras e redes de proteção perto dos ninhos.
A partir disto, Clinchy e Zanette foram também capazes de dizer quantas das aves foram capazes de se reproduzirem e quantos descendentes existiram de cada ave, quer tenham sido expostos a ruídos de predadores ou não produzidos.
A equipa também analisou a saúde dos descendentes, com base no número de canções que cantavam.
A equipa realizou novamente este teste em 2013 e 2014. No total, os investigadores encontraram uma diminuição de 9% por ano, na taxa de crescimento da população entre o grupo exposto ao medo, em comparação com um aumento de 6% nas populações que não receberam os sons dos predadores.
No total, nasceram menos pássaros no grupo do medo, e menos sobreviveram até à idade adulta.
As aves que sobreviveram mostraram evidências de desenvolvimento cerebral prejudicado, o que provavelmente diminuiria as suas hipóteses de sobrevivência a longo prazo.
Pesquisas anteriores de Clinchy e Zanette sugerem que este fenómeno não se limita a um pardal específico, uma vez que o medo dos predadores pode ter impacto nos hábitos de caça e alimentação de outras espécies que cuidam das suas crias.
Num estudo anterior, publicado na Nature, os investigadores fizeram parte de uma equipa que realizou uma experiência semelhante com guaxinis, nas ilhas do Golfo.
Os investigadores descobriram que os sons dos predadores também tiveram impacto na procura de alimentos entre os guaxinis o que, por sua vez, resultou em mais caranguejos na área, porque os guaxinins comeram menos.
Os seres humanos também podem provocar esta resposta na vida selvagem. Numa experiência semelhante no Reino Unido, uma equipa de investigadores descobriu que os ruídos humanos faziam com que os texugos comessem menos.
Outro estudo mostrou que a exposição aos humanos fez com que os pumas na Califórnia matassem mais veados. Normalmente, os pumas voltam a matar ao longo de vários dias.
Mas, quando sentem que os humanos estão por perto, o medo faz com que apenas matem mais veados. Os investigadores acreditam que este trabalho pode ter grandes implicações na conservação de espécies.
“Faz sentido. Quem é mortífero? Quem tem a capacidade de matar?” disse Zanette. “Os humanos são a coisa mais assustadora lá fora“.