As sobreposições quânticas são normalmente frágeis e fugazes, mas um desses estados foi mantido durante 23 minutos — um recorde da física quântica.
Uma equipa de investigadores conseguiu manter o mítico Gato de Schrodinger vivo (e ao mesmo tempo morto) — ou seja, criar um estado de sobreposição quântica — durante um período de tempo inédito neste tipo de experiências: 23 minutos.
Manter os estados quânticos estáveis durante tanto tempo poderá ajudar a criar dispositivos quânticos mais robustos ou levar à descoberta de novos efeitos estranhos na física quântica, diz a New Scientist.
Este tipo de sobreposição quântica é conhecido como “estado de gato“, cujo nome tem origem na famosa “experiência mental” do Gato de Schrodinger, que o físico Erwin Schrödinger postulou em 1935.
Nesta experiência teórica, um gato, colocado numa caixa selada com veneno que tem 50% de probabilidade de o matar, estaria simultaneamente morto e vivo até a caixa ser aberta e o gato ser observado, provocando o “colapso” da sobreposição.
Os “estados de gato” são sobreposições em que um objeto quântico pode estar em vários estados mutuamente exclusivos, mas é impossível dizer qual deles ocupa realmente; na realidade, ocupa-os todos simultaneamente.
Este princípio é crucial para a computação quântica, onde os qubits — a unidade básica de informação em computação quântica— operam em múltiplos estados ao mesmo tempo, permitindo cálculos extremamente complexos e rápidos.
Há anos que os investigadores conseguem criar estados de gato com partículas de luz e até com cristais minúsculos em laboratório, mas estes estados perdem sempre rapidamente o seu carácter especial e colapsam num único estado, bem determinado.
Agora, Zheng-Tian Lu, investigador da Universidade de Ciência e Tecnologia da China, e os seus colegas utilizaram átomos presos pela luz para manter um estado de gato durante um tempo excecionalmente longo.
“A metrologia quântica com estados não clássicos constitui uma via promissora para melhorar a precisão das medições físicas“, explicam os investigadores no abstract do seu estudo, cujos resultados foram apresentados num artigo pre-publicado este mês no arXiv.
“Os efeitos quânticos das sobreposições ou emaranhados do gato permitem que as incertezas de medição sejam inferiores ao limite quântico padrão. Contudo, o desafio de manter um longo tempo de coerência para esses estados não clássicos impede frequentemente a plena exploração da vantagem quântica na metrologia”, detalham os investigadores.
No seu estudo, Lu e os colegas arrefeceram até alguns milésimos de grau acima do zero absoluto cerca de 10 mil átomos de 173Yb (I=5/2) — itérbio com spin nuclear 5/2 — e aprisionaram estes átomos com forças electromagnéticas de luz laser.
Nestas condições, os estados quânticos dos átomos podiam ser controlados com grande precisão. Os investigadores aproveitaram este facto para colocar cada átomo numa sobreposição de dois estados com dois spins, propriedade fundamental das partículas elementares na mecânica quântica, muito diferentes.
Normalmente, as perturbações do ambiente dos átomos fá-los-iam cair num único estado de rotação numa questão de segundos ou milissegundos, mas os investigadores afinaram os seus lasers de forma a que os estados de gato durassem uns inéditos 1400 segundos.
“É muito importante porque estão a criar este belo estado de gato num sistema atómico, e é estável”, diz à New Scientist o físico Barry Sanders, investigador da Universidade de Calgary, no Canadá, que não esteve envolvido no estudo.
Este estado é muito sensível a tudo o que acontece no seu ambiente, pelo que pode ser usado para detetar e estudar forças magnéticas subtis ou para sondar efeitos novos e exóticos na física fundamental, explica Sanders.
Os resultados do estudo mostram que a sensibilidade do “estado de gato” para medir campos magnéticos já está muito próxima dos limites fundamentais de sensibilidade estabelecidos pelas leis da mecânica quântica — podendo ser usado como memória muito estável e armazenar informação.
Está assim dado mais um passo significativo no campo da Computação Quântica — e descoberta mais uma forma de tentar salvar o infeliz Gato de Schrodinger.